Alimentos Funcionais

Décio Luiz Gazzoni

            Até recentemente, a expressão “alimentos funcionais” estava restrita ao círculo de iniciados no assunto, em especial profissionais das áreas de saúde e nutrição. No início da década passada, o tema migrou dos laboratórios e congressos científicos para a mídia e, em pouco tempo, a discussão sobre alimentos funcionais e nutracêuticos ganhou espaço junto à sociedade.

Caixa de texto:              O fenômeno não é isolado e nem aconteceu por casualidade. Ele está inserido numa profunda mudança de hábitos e costumes, uma revolução social que mudou os eixos de poder ao longo dos últimos 20 anos. A História ainda não cunhou uma expressão definitiva para designar o fenômeno que, nos Estados Unidos, é tratado genericamente como “consumer empowerment” ou “power to the people”. Entre nós, significa que o cidadão tornou-se mais consciente de seus direitos e exigiu para si parcela do poder de decisão sobre os hábitos de consumo, tendo como foco uma vida mais saudável. Inserem-se nesse contexto as exigências de qualidade e de inocuidade dos alimentos, um comportamento nascido na Europa, que rapidamente se espalhou nos demais países do mundo. 

 

O que são Alimentos Funcionais?

            O conceito de alimentos funcionais ainda não obteve consenso, mas podemos considerá-los como “Alimento semelhante em aparência aos alimentos convencionais, consumidos como parte da dieta, que produz benefício específico à saúde, além de satisfazer os requerimentos nutricionais” ou “alimentos, em forma natural ou processada, que contêm níveis significantes de componentes ativos biologicamente que, além da nutrição básica, trazem benefícios à saúde, à capacidade física e ao estado mental”.

            Para ilustrar, consideremos o exemplo do arroz. O arroz integral possui um processamento mínimo, que mantém incólumes as substâncias que compõem o grão. Assim, o arroz integral possui alto teor de fibras - importantes para a regulação intestinal e da taxa do colesterol sanguíneo, de fitatos – que protegem o organismo da ação tóxica de metais pesados, de ácidos graxos insaturados, além das proteínas e vitaminas. Já o arroz processado perde a maioria destas substâncias durante a industrialização. Portanto, o arroz integral pode enquadrar-se na categoria de alimento funcional, o mesmo não ocorrendo com o arroz processado.

            O uso de alimentos funcionais ganhou impulso no início dos anos 80, como parte de um programa de redução dos custos de seguro saúde no Japão, tendo em vista o aumento sustentado da esperança de vida da população. Em conseqüência, o perfil dos segurados passou a apresentar idade média crescente, sendo mais vulneráveis a determinadas doenças e distúrbios de saúde. Para reduzir as despesas com medicamentos, foi implantado um programa denominado FOSHU (foods for specified health use), em que os alimentos deveriam ser  Caixa de texto:  baseados em ingredientes naturais; deveriam ser consumidos como parte da dieta alimentar; e deveriam cumprir funções específicas no organismo, como:

a. melhoria dos mecanismos de defesa biológica (imunológicos);

b. prevenção ou terapia de alguma enfermidade ou disfunção;

c. melhoria das condições físicas e mentais e do estado geral de saúde; e

d. retardo no processo de envelhecimento orgânico.

            O programa FOSHU é administrado pelo Ministério da Saúde e Bem Estar do Japão, em cujo registro constam mais de 100 produtos com característica de alimento funcional.

 

Porque consumir alimentos funcionais?

            Associar nutrição e saúde é uma ilação óbvia, tanto que não se trata de algo efetivamente original. Muitos alimentos, tradicionalmente consumidos pela população, possuem características interessantes sob o ponto de vista da saúde, respaldadas por conhecimentos empíricos a respeito de suas propriedades. Entrementes, para a maioria desses alimentos não existiam informações científicas definitivas relacionando causa e efeito, assim como não havia um acervo teórico e um traço de união entre eles, o que se tornou realidade a partir do FOSHU.

             Dispondo de maiores informações, tanto sobre o efeito benéfico de determinados alimentos, quanto sobre os malefícios causados pela exposição a inúmeras substâncias inerentes à vida moderna – presentes ou não nos alimentos – o cidadão passou a conferir maior importância a alimentos contendo substâncias benéficas à saúde. Em especial, contribuiu para a maior aceitação dos alimentos funcionais, a associação entre esses e a redução dos riscos das principais causas de mortalidade nos países ricos, que são: acidentes cardiovasculares, câncer, acidente vascular cerebral, arteriosclerose e enfermidades hepáticas. 

Ação dos alimentos funcionais

            As propriedades benéficas decorrem de substâncias presentes nos alimentos, que possuem ação específica sobre determinados processos fisiológicos ou bioquímicos do organismo humano. À guiza de ilustração, examinemos o caso dos hormônios estrogênio e progesterona, associados com o sistema reprodutor feminino.Caixa de texto:

             Os hormônios atuam no organismo através de ligações semelhantes a conexões elétricas. A “tomada” no organismo é chamada de receptor, sendo proteínas existentes nos órgãos onde os hormônios devem atuar. Existem diversos padrões de conexões entre plugs e tomadas, o que também ocorre entre os hormônios e seus receptores. Apenas quando a conexão é perfeita o hormônio manifesta sua ação. Por exemplo, no caso dos estrógenos, as células do útero, do ovário, da mama e de outros órgãos possuem proteínas receptoras, onde o hormônio se liga, a fim de poder cumprir sua função bioquímica ou fisiológica.

            Sob determinadas condições, o hormônio causa danos às células, podendo atingir o DNA. Alterações na estrutura do DNA, à semelhança de mutações, tem alto potencial carcinogênico. Dessa maneira, proteínas estruturalmente e funcionalmente diferentes podem ser expressas, afetando as respostas celulares, como a do receptor hormonal. Existem substâncias, como as isoflavonas, que se assemelham, estruturalmente, aos hormônios e podem se ligar aos receptores. Assim, existem estrogênios “fracos” que se ligam aos receptores hormonais e, como possuem baixa atividade, seu efeito sobre o código genético é nulo. Por exemplo, alimentos que contenham em sua composição linhaça ou soja possuem esse efeito, o que lhes confere a propriedade de prevenir determinados tipos de tumores malignos.

 Climatério e menopausa

            Quando seus ovários reduzem a produção de estrógeno e progesterona, as mulheres ingressam no climatério, período em que os ciclos menstruais ficam irregulares até cessarem completamente. Ao cessar a menstruação, as mulheres ingressam na menopausa. Esse processo é permeado por sensações desconfortáveis, como os “fogachos”, que são ondas de calor, acompanhadas de sudorese, que podem durar até 30 minutos. Também surgem suores noturnos, ressecamento vaginal, diminuição da libido, incontinência urinária, dores de cabeça, alterações da pele e cabelos, insônia, cansaço, obesidade, redução da massa óssea, perda de massa muscular, entre outros. Os sintomas físicos podem ser acompanhados de lapsos de memória, nervosismo, irritação, depressão, ansiedade, tensão e mau humor. Embora o climatério seja um processo normal, pelo qual todas as mulheres passam, os sintomas a ele associados demandaram muitos estudos para a melhoria da qualidade de vida das mulheres durante o climatério e a menopausa. Existem diversos alimentos que reduzem o desconforto causado por esses processos, sendo a soja o mais importante deles.

 Substâncias presentes nos alimentos funcionais

            Sem a pretensão de esgotar o assunto, alinhavamos a seguir alguns exemplos de substâncias contidas em alimentos funcionais e suas propriedades medicinais.

 Terpenos

            São substâncias encontradas em uma grande variedade de alimentos, em especial vegetais e frutas, produtos de soja e outros grãos. Funcionam como antioxidantes, protegendo os lipídios e os fluídos corporais da ação deletéria de radicais livres (oxigênio reativo, hidroxilas, peróxidos e radicais superóxidos). Estudos médicos demonstraram a eficiência de terpenos na redução dos riscos de câncer de mama, pulmão, cólon, estômago, próstata, pâncreas, fígado e pele, entre outros.

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Exemplos de terpenos

            Quando ocorre uma mutação em um gene oncógeno (causador de câncer), as células são instruídas para sintetizar uma proteína anormal, que pode se constituir em um fator de crescimento, ou interferir na atividade de uma enzima promotora do crescimento celular. As células passam a se dividir agressiva e anormalmente, formando o tumor. As reações químicas envolvidas com o crescimento celular são reguladas por enzimas e a ação anticancerígena dos terpenos ocorre pela redução da atividade dessas enzimas, evitando a proliferação desordenada das células.

            Os terpenos mais conhecidos pertencem ao grupo dos carotenóides e dos limonóides. Os carotenóides estão presentes em alimentos com pigmentação amarela, laranja ou vermelha (tomate, abóbora, pimentão, laranja). Seus principais representantes são os carotenos, precursores da vitamina A, e o licopeno.. Os limonóides (δ-limoneno, pineno, eucaliptol) se encontram nas cascas de frutas cítricas e atuam protegendo o tecido pulmonar, previnem determinados tipos de câncer e fortalecem o sistema imunológico. O álcool perílico (encontrado em cerejas) tem estrutura química parecida com o limoneno, possuindo atividade anticancerígena cinco vezes mais potente que esse composto.

            Em 2.000 foi lançada uma variedade transgênica de arroz denominada “Golden rice”, desenvolvida por pesquisadores suíços e alemães, sob o patrocínio da Fundação Rockefeller, da Comunidade Européia e do Instituto Tecnológico da Suíça. Sua principal característica é o elevado teor de β-caroteno, tendo sido desenvolvida para ajudar a combater a cegueira decorrente da deficiência de vitamina A, problema especialmente crítico em países em desenvolvimento. Crianças que ingerem uma quantidade diária adequada de vitamina A previnem uma série de doenças que ocorrem pela deficiência dessa vitamina, como a xeroftalmia (dessecamento dos dutos lacrimais) e querotomálacia (ulceração da córnea).


 Fenóis             

Também possuem propriedades anti-oxidativas, sendo encontrados em vegetais de cores roxa, azul ou violeta (uva, cereja, berinjela). Possuem atividade antiinflamatória, evitam a aglomeração das plaquetas sanguíneas e a ação de radicais livres no organismo, protegendo desde o código genético (DNA) aos lipídios, desta forma abortando os processos carcinogênicos. Os chás verdes, ricos em polifenóis, ajudam a prevenir alguns tipos de tumores e as doenças cardíacas.

 Entre os fenóis, encontramos os flavonóides como flavonas e isoflavonas, presentes na soja e em produtos dela derivados, bem como em frutos cítricos e outros alimentos. A camomila é rica em apigenina, uma flavona com efeito analgésico. A ação de compostos como a diosmina e a hesperitina, presentes nos frutos cítricos, favorece a atuação da vitamina C no organismo.

                         

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Flavonóides

             Os flavonóides possuem propriedades antialérgicas, antiinflamatórias, melhoram a ação do sistema imunológico, regulam a pressão arterial, protegem o sistema vascular, em especial os vasos de menor calibre. Alguns tumores acumulam substâncias denominadas poliaminas, que atuam no crescimento desordenado das células. Uma das ações anticancerígenas dos flavonóides é a inibição da síntese de poliaminas, reduzindo o crescimento celular desordenado.

             Destaque especial deve ser dado às isoflavonas, que são particularmente abundantes na soja, e que possuem a propriedade de bloquear enzimas que promovem os crescimentos tumorais. As mais conhecidas são a genisteína e a daidzeína, que atuam como hormônios (fito-estrógenos) e vêm sendo utilizados em larga escala no tratamento de reposição hormonal de mulheres em pré e pós-menopausa. As isoflavonas se ligam aos β-receptores hormonais, que são diferentes dos principais receptores dos estrógenos, que são os α-receptores.

             Inicialmente, o interesse pelas isoflavonas decorreu de sua ação sobre o colesterol sanguíneo, posto que promovem a redução dos teores do LDL-colesterol, responsável pela obstrução dos vasos sanguíneos, sem afetar o HDL-colesterol, que possui ação benéfica no organismo. Os cientistas também observaram que as isoflavonas bloquearam a ação do estradiol, inibindo a carcinogênese mamária, assim como bloquearam a testosterona, evitando o câncer de próstata. Outro efeito interessante dos flavonóides é o fortalecimento dos tecidos conectivos do organismo.

 

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Tocoferóis

          Tocoferóis e tocotrienóis

            São encontrados em sementes de oleaginosas, folhas e outras partes verdes das plantas. O α-tocoferol, é encontrado nos cloroplastos enquanto os homólogos β, γ e δ são encontrados no citoplasma celular. Essas substâncias também conhecidas como vitamina E, possuem efeito inibitório dos processos oxidativos de lipídios e são consideradas nutrientes muito importantes, porque sua única fonte são os vegetais que os sintetizam. Os tocotrienóis demonstraram capacidade de inibição do crescimento de células cancerígenas.

 

Fibras (oligossacarídeos)

             As fibras são sustâncias com alto peso molecular, encontradas na maioria dos grãos (arroz, soja, trigo, aveia). Algumas fibras são de difícil digestão, embora alguns vegetais sejam fontes das fibras solúveis Possuem função importante na regulação do processo digestivo e atuam no seqüestro e na excreção de ácidos biliares, na redução do LDL-colesterol e na redução da incidência de câncer colo-retal, impedindo a metástase. A β-glucana, encontrada na aveia, tem ação comprovada na redução do colesterol, diminuindo sua absorção pelo organismo, enquanto a quitosana captura e excreta gorduras, também reduzindo o LDL-colesterol. A linhaça contém lignana, que possui as propriedades de estimular a imunidade e reduzir o LDL-colesterol.

 

Omega -3 (DHA e EPA)Caixa de texto:

São ácidos graxos polinsaturados, de onde  são derivadas substâncias com ação anticoagulante (prostraglandinas e leucotrienos). São comumente encontrados em peixes de águas frias (atum, salmão, arenque, sardinha, bacalhau). Também estão presentes no óleo de canola e, em menores concentrações, no óleo de soja e em castanhas. Existem produtos enriquecidos com os ácidos graxos ômega 3, como leite longa vida, leite em pó e ovos.

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Ômega 3

         Como benefícios de sua ingestão podem ser referidos a redução da agregação plaquetária, da pressão sangüínea, da viscosidade do sangue, da hiperplasia vascular e das arritmias cardíacas. Em doses adequadas, aumenta a sobrevida plaquetária e o funcionamento dos beta-receptores cardíacos. Também reduz os níveis de colesterol e de triglicerídios no sangue e possui efeito antiinflamatório. O ômega 3 possui atividade oxidante, sendo recomendado consumí-lo associado a antioxidantes, como a vitamina E.

 

Outros fitoquímicos

            Existem outros produtos do metabolismo secundário dos vegetais, presentes nos alimentos, com propriedades úteis. Entre eles, podemos citar os compostos sulfurados como a aliina e a alicina e o sulfeto e bissulfeto de alila. Podem ser encontrados em produtos como alho e cebola. Possuem atividade bactericida e fungicida e, entre os benefícios de sua ingestão, estão a redução do teor de triglicerídios e de colesterol, a redução da pressão arterial, a atividade antiinflamatória e a proteção às enzimas hepáticas. Também são encontrados compostos nitrogenados como o indol 3-carbinol e o sulforafano, presentes nas crucíferas (couves, repolho, brócolis), que possuem ação anticancerígena e estimulam a produção de determinadas enzimas vitais.

 

Aspectos negociais

Caixa de texto:              A partir da década de 90, as atenções têm se voltado para os alimentos funcionais, um mercado em franca expansão. Estima-se que o mercado global represente valores superiores a US$50 bilhões. Só nos Estados Unidos, em 1998, foram transacionados US$ 16,7 bilhões, um incremento anual médio de 11% durante a década. Esse crescimento é devido à imagem positiva que os alimentos trazem, com relação ao seu impacto na saúde e bem estar, tornando-os “best sellers”. Além da população em geral, o mercado inclui especificamente bebês (fórmulas infantis), a população da terceira idade, pacientes e doentes em recuperação, entre outros. Na Europa, apenas os derivados fermentados do leite, considerados alimentos funcionais, devem gerar vendas que se aproximam de €1 bilhão, porém com vendas per cápita inferiores ao mercado japonês, o de maior tradição.

            Os probióticos compõem-se de um ou uma mistura de microrganismos úteis, via de regra comercializados na forma de produtos fermentados como coalhada, iogurte e leite acidófilo ou como suplementos alimentares. O mercado de probióticos concentra-se no leite acidófilo, que contém a bactéria Lactobacillus acidophilus, sendo menos consistente e com pH menor que o iogurte que, normalmente, contém dois microrganismos (lactobacilo e estreptococo). Ambos os produtos previnem a ocorrência de distúrbios gastro-intestinais. Esse mercado já possui dimensão apreciável, encontra-se consolidado e em expansão, especialmente no Primeiro Mundo. Por sua vez, o mercado de prebióticos inicia sua expansão nessa década, com o lançamento de uma série de novos produtos, com propriedades funcionais muito interessantes.

Caixa de texto:              A tendência para os próximos anos é haver um crescimento do mercado em altas taxas, pela conquista natural de novos adeptos, pelo surgimento quase diário de novas e boas notícias provenientes das pesquisas científicas relacionando os alimentos funcionais à saúde e qualidade de vida, além da introdução de novos produtos no mercado, o que amplia o leque de alternativas mercadológicas.

            O consumidor típico de alimentos funcionais é um cidadão consciente, bem informado, que busca um produto de qualidade, tendo o preço como condição subsidiária de sua decisão de consumo. Sob essa perspectiva, ganha espaço a integração de atividades, que vai além do processamento industrial, passando a ter muita importância o sistema produtivo em que a matéria prima foi obtida. Passa a ser importante produzir alimentos utilizando as melhores práticas agrícolas, garantindo produtos de qualidades, isentos de contaminantes químicos ou biológicos, mantendo padrões estritos de qualidade. A atenção ao meio ambiente, à higiene e às condições sociais de produção é fundamental, pois o mercado de alimentos funcionais está intrinsecamente vinculado a uma imagem impoluta. Denúncias sobre descaso com o meio ambiente ou com a mão de obra empregada na produção podem significar o alijamento do mercado de um produtor ou de um fabricante relapso.

 

Boxes

 

Flavonóides em alimentos

Nome

Descrição

Flavonas

Presente em frutos, especialmente os cítricos e em cereais, conferindo cor amarela. Pertencem ao grupo a tangeretina, a luteolina, a diosmetina, a nobiletina e a apigenina.

Flavanas

Presente em frutos e folhas (para o preparo de chás) não confere cor aos alimentos. As biflavanas estão presentes também no lúpulo, em nozes e na água de coco. Compõem esse grupo a procianidina, o luteoforol, a theaflavina e a catequina.

Flavanonas

São características de frutas cítricas, possuindo cor amarelo palha. A hesperitina e a naringenina pertencem a esse grupo.

Flavonóis

São abundantes no reino vegetal e possuem cor amarela pálida. Os principais representantes do grupo são a quercetina, a rutina, a mircetina e o kaemferol.

Isoflavonóides

As leguminosas são a principal fonte de substâncias deste grupo, como a daidzeína e a genisteína.

Antocianinas

Conferem a coloração azul, roxa ou violeta para frutas e flores, como a uva e a berinjela. Cianidina, delfinidina e peonidina pertencem a esse grupo.

 


Descascando os alimentos funcionais

Linhaça

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Planta de linho

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Flor do linho

            A linhaça nada mais é que a semente do linho (Linum usitatissimum), de cor marrom escura, cujas propriedades nutritivas e terapêuticas são secularmente conhecidas. Na cozinha, entra na composição de receitas de pães, bolos e assemelhadas. As propriedades mais conhecidas do óleo de linhaça são a regularização do funcionamento do intestino, em especial no tratamento da prisão de ventre e na revitalização da pele.

             Possui alta concentração do ácido graxo α-linolênico (cerca de 60%), que pertence ao grupo ômega-3, e de lignana, uma fibra útil no processo digestivo. Na linhaça, estão presentes diversas substâncias com efeito benéfico, como β-caroteno, vitamina E, glicosídios, linamarina, taninos e mucilagem. De sua fração lipídica, constam os ácidos graxos cis-linoléico, oléico, palmítico, γ-linoléico e esteárico. Também é encontrado o ácido α-linoléico que, além de ser reserva e fonte de energia, é vital para a formação do tecido nervoso, atuando também na regulação da pressão arterial e da freqüência cardíaca. Auxilia na coagulação sanguínea, no metabolismo dos ácidos graxos, além de ativar o sistema imunológico do organismo e reduzir a taxa de LDL-colesterol do sangue.Caixa de texto:  

Linhaça

               A linhaça fortalece unhas, dentes e ossos e torna a pele mais saudável. Possui ação antioxidante e efeito terapêutico em distúrbios do cólon, do sistema urinário, da próstata e em desordens menstruais. Também é utilizada para o tratamento de infecções (urinária, psoríase), distúrbios imunológicos (lupus), alergias e eczema, artrite reumatóide, aterosclerose, auxilia no tratamento da asma e do diabetes, e atenua a formação de radicais livres pelo stress.

            No intestino dos mamíferos são sintetizados o enterodiol e a enterolactona, através de bactérias que utilizam a lignana presente nos alimentos. Ambas as substâncias são similares aos estrógenos e possuem atividade hormonal fraca e ação anti-estrogênica, manifestando ação anti-oncogênica (mama, próstata, endométrio). A associação da linhaça com uma dieta de baixa concentração de lipídios demonstrou ser efetiva na diminuição  da divisão celular e no aumento da taxa de mortalidade de células malignas de pacientes com câncer da próstata, de acordo com pesquisa do Centro Médico da Universidade Duke (Durham-NC, EUA).


Soja

  Caixa de texto:              A soja não é apenas o maior agronegócio brasileiro: é um dos vegetais com maior potencial de capitanear o segmento de alimentos funcionais. Reconhecida milenarmente pela sua capacidade energética e pela alta qualidade protéica, estudos recentes demonstraram sua utilidade prevenindo e ajudando na redução do risco de câncer, osteoporose, atenuação dos sintomas da menopausa e doenças cardiovasculares. Sua ação terapêutica deriva dos inibidores de protease, dos fitoesteróis, das saponinas e dos ácidos e fitatos fenólicos. A soja é a mais importante fonte de isoflavonóides, em especial as isoflavonas genisteína e daidzeína, largamente empregadas como alternativa na terapia de reposição hormonal. Vitamina B, ácido fólico, iodo, magnésio, potássio e fósforo são outros componentes importantes da soja.

            A primeira demonstração do uso medicinal da soja ocorreu com a redução do teor de LDL-colesterol observado em pessoas que consumiam soja ou seu extrato aquoso (leite de soja), juntamente com o incremento do HDL-colesterol e a diminuição da taxa de triglicerídios do sangue. A ingestão de soja contribui para a prevenção da osteoporose, devido à ligação dos isoflavonóides aos receptores de hormônio, o que influencia a reabsorção urinária e óssea do cálcio.

O consumo de soja possibilita reduzir o desconforto feminino durante o período do climatério e a subseqüente menopausa, especialmente reduzindo a intensidade e a freqüência de fogachos ou “ondas de calor”. Os fito-estrógenos presentes na linhaça e na soja são muito semelhantes estruturalmente ao estradiol , permitindo “enganar” os receptores hormonais. Os fito-estrógenos possuem uma atividade hormonal débil, se comparados aos hormônios produzidos pelo organismo (ou os sintéticos). Experimentos científicos e estudos epidemiológicos mostraram que indivíduos ou populações, que tenham por hábito ingerir soja, possuem menor incidência de tumores malignos, reduzindo o surgimento de câncer da próstata em 50%, mesma taxa de redução do câncer de mama, enquanto o índice de câncer de cólon é 40% inferior com o consumo regular de soja. 

Tomate

     Caixa de texto:          Consumir tomate (Lycopersicon esculentum) é o mais novo “must” entre a população de meia idade. Não pelo tomate em si, mas pelo licopeno (a substância que confere cor vermelha) e que demonstrou potencial de redução da incidência de câncer da próstata e da mama, devido à sua ação antioxidante, que atinge entre 400% e 1000% da atividade média de outros carotenóides. O efeito antioxidante reduz a presença de radicais livres, protegendo as células da oxidação. Estudos demonstraram que alimentos contendo licopeno reduzem também o risco de câncer intestinal, estomacal, da bexiga, do colo uterino, da pele e dos pulmões. Se não bastasse, o licopeno previne o surgimento de doenças cardiovasculares em especial aterosclerose e, conseqüentemente,  reduzindo o risco de infarto, devido à redução da taxa de oxidação do LDL-colesterol.

 

Alho

            O alho (Allium sativum) possui sabor e odor penetrantes e inconfundíveis. As substâncias que conferem o sabor e o cheiro do alho possuem enxofre em sua molécula, como é o caso da alicina, que é um dos seus princípios medicamentosos. No dente intacto existe um precursor, sem cheiro e sem atividade que, quando exposto ao ar (descascamento, esmagamento ou trituramento) é atacado por uma enzima (alinase), que produz a alicina, a qual, por um processo oxidativo, retira átomos de hidrogênio da vitamina B1, favorecendo tanto a absorção quanto a fixação das vitaminas de todo o complexo B. O nome da substância oxidada é alitiamina.

  Caixa de texto:              Estudos demonstraram que o consumo regular de alho reduz a incidência de tumores no estômago e no cólon. Alguns desses estudos mostraram que o alho inibe as nitrosaminas, derivadas de nitritos e nitratos que são utilizados como aditivos na indústria de embutidos (salames, copas, apresuntados, mortadelas), sendo uma das razões de seu efeito anti-oncogênico. O alho também atua na prevenção de doenças cardiovasculares, reduzindo a taxa de LDL-colesterol do sangue e possui ação reguladora da pressão arterial.

            Uma descoberta recente da medicina associou a bactéria Helicobacter pylori à gastrite, ao desenvolvimento de úlcera e de câncer gástrico, mudando radicalmente a terapêutica para essas doenças. Recentemente descobriram-se propriedades antibióticas no alho, o que auxilia no combate à H. pylori. O elevado teor de cisteína (um aminoácido essencial para o organismo humano), precursor da alicina, confere ao alho a propriedade de fixar metais, reduzindo as exigências detoxificadoras do fígado. O alho também é rico em arginina, um aminoácido que reduz o teor de amônia do organismo. Esse aminoácido também é ligado à secreção do hormônio de crescimento (HGH) e estimula o sistema imunológico.

 

Micróbios úteis

              À semelhança dos alimentos funcionais, probióticos são microrganismos que, quando ingeridos, apresentam efeitos fisiológicos benéficos no organismo e melhoram o balanço microbiano do intestino, já existindo estudos de seus efeitos positivos sobre os sistemas respiratório e urogenital. Os probióticos são bactérias produtoras de ácido lático (Lactobacillus, Bifidobacterium, Streptococcus, Enterococcus e Escherichia), ou fungos dos gêneros Saccharomyces e Aspergillus. Os probióticos fazem parte da flora intestinal e interagem com os enterócitos e com as células do tecido linfóide presentes no intestino. Estudos têm demonstrado efeitos positivos dos probióticos na prevenção ou na terapêutica de distúrbios intestinais, após o uso de antibióticos, e no tratamento de gastro-enterites e de diarréias. Podem atuar positivamente contra bactérias patogênicas como a Helicobacter pylori e a Clostridium difficile. Outras disfunções e doenças do intestino, incluindo o câncer do cólon, podem ter terapias apoiadas em probióticos.

            Já o prebiótico é um ingrediente que estimula a atividade e a colonização de probióticos no cólon ou das bactérias benéficas já existentes na microbiota intestinal. Os prebióticos são oligossacarídeos, carboidratos de alto peso molecular, como lactulose e a rafinose, que se encontram presentes em alguns alimentos (alcachofra, cebola, banana, aspargo e chicória) ou obtidos através de reações enzimáticas, como o galactooligossacarídeo, o fruto-oligossacarídeo e o isomalto-oligossacarídeo. Esses produtos passam incólumes pelo estômago, podendo ser aproveitados pelos probióticos, que os utilizam para produzir ácidos graxos de baixo peso molecular, tornando o ambiente intestinal mais ácido, o que desfavorece o desenvolvimento de bactérias patogênicas. Com o pH mais baixo, o cálcio e o magnésio são mais facilmente absorvíveis.

            Finalmente, simbióticos são alimentos funcionais que contém tanto o probiótico quanto o prebiótico, compostos de um substrato que possa ser aproveitado pelos microrganismos probióticos, quando atingirem o intestino. Existem diversos produtos comerciais à venda nos supermercados, combinando bactérias e oligossacarídios.

            Bactérias do gênero Bifidobacterium são encontradas naturalmente, em populações altas e consistentes no trato digestivo humano, enquanto os Lactobacilos apresentam maior variabilidade. As bactérias lácticas que têm sido mais freqüentemente utilizadas em formulações comerciais e que se enquadram como probióticos, são Bifidobacterium bifidum, B. longum, Lactobacillus acidophilus, L. reuteri, L. fermentum, L. casei e L. plantarum. Apenas as espécies de Lactobacillus podem colonizar o intestino por longo tempo, após a ingestão, posto que as demais são antagonizadas pela microbiota intestinal, embora permaneçam ativas e funcionais durante sua passagem pelo trato intestinal, expressando suas propriedades terapêuticas. Estima-se que apenas populações superiores a 10 milhões de indivíduos por grama de conteúdo possam manifestar o efeito desejado. Portanto, é necessário manter a ingestão do probiótico durante o tempo em que se pretende obter o efeito desejado.

Caixa de texto:  



Lechia

            A litchia ou lechia (Litchi chinensis Sonn) é uma fruta nativa da Ásia, recentemente introduzida no Brasil, onde vem encontrando receptividade entusiasmada por parte dos consumidores. Clostridium difficile é a causa principal de infecções intestinais nosocomiais nos adultos. A sintomatologia inclui desde diarréia até colite e perfuração intestinal, podendo levar o paciente a óbito. A infecção é facilitada por uso abusivo de antibióticos, que reduzem a população de organismos benéficos da flora intestinal. O tratamento padrão é efetuado com os raros antibióticos aos quais a bactéria é sensível. Entretanto, a recidiva é muito alta e o desenvolvimento de resistência genética tem limitado o espectro dos antibióticos que podem ser utilizados.

            Informe da OMS dá conta que, se a terapia antimicrobial padrão tem sua taxa de sucesso incrementada se for complementada por ingestão de probióticos. A levedura Saccharomyces boulardii é encontrada sobre os frutos de litchia e tem fornecido excelentes resultados terapêuticos. O microrganismo sobrevive à exposição aos ácidos gástricos, colonizando o cólon durante o tratamento, sendo rapidamente eliminada do intestino ao final da administração. A levedura reduz a patogenicidade de C. difficile, interferindo com a produção ou eliminando suas toxinas, ou ainda liberando uma protease que bloqueia os receptores das toxinas. O maior benefício foi observado na redução do índice de retorno do quadro infeccioso após a cura inicial, o que ocorre em 64% dos casos, quatro semanas após o término do tratamento com antibióticos. Quando houve associação com S. boulardii essa taxa reduziu-se para 34%.

            O modo de ação dos probióticos equivale aos da microflora intestinal, competindo por nutrientes ou por receptores; produzindo substâncias como o ácido láctico ou a bacteriocina, que inibem a ação de microrganismos patogênicos; bloqueando a produção ou a atuação de substâncias tóxicas; ou estimulando os mecanismos imunológicos do organismo. Pesquisas recentes realizadas pela UFMG mostraram que, camundongos que receberam probióticos à base de L. acidophilus ou S. boulardii, apresentaram nível de resistência natural superior aos que receberam dietas sem os probióticos. Assim, os que receberam probióticos apresentaram maior resistência aos patógenos Salmonella typhimurium, Vibrio cholerae e Shigella flexneri. Os professores Jacques Nicoli e Leda Vieira, responsáveis pelos estudos, afirmam que S. boulardii, L. acidophilus, L. casei, B. longum, B. bifidum, Streptococcus thermophilus e E. faecium preveniram a diarréia causada por antibióticos, a diarréia infantil, a diarréia do viajante, a diarréia relacionadas à infecção pelo vírus HIV, a diarréia aguda causadas por V. cholerae e E. coli, sendo úteis no tratamento de infecção por Clostridium difficile.


Substâncias naturais que podem prevenir, evitar ou curar enfermidades e distúrbios

Componente

Propriedades benéficas

Exemplos de alimentos funcionais que contém o componente

Bífido-bacterias

Favorecem as funções gastro-intestinais, produzem vitaminas B12 e K

Iogurtes e produtos lácteos fermentados

Arílicos

Inibição da síntese do colesterol

Extrato macerado de alho

Acido α-linolênico

Estimula o sistema imunológico e reduz as inflamações

Óleos de linhaça, colza, soja; nozes e amêndoas

Carotenóides

Antioxidantes, anti-oncogênicos, reduzem o acúmulo de plaquetas

Tomate, cenoura, abóbora, espinafre, acelga, frutas cítricas, melão, pêssego

Catequinas

Reduzem a incidência de câncer do intestino, estimula o sistema imunológico.

Chás, cerejas, uva, vinho tinto, chocolate

Cumarinas

Atividade anti-oncogênica, antibiótica, previnem a coagulação não desejada do sangue, atuam no tratamento da salmonelose. São protetores vasculares, possuem propriedades espasmolíticas e vasodilatadoras, fotosensibilizantes (tratamento da psoríase).

Cenoura, frutas cítricas, canela

Flavonóides

Atividade anti-oncogênica. espasmolíticos, vasodilatadores, antiinflamatórios, antiulcerosos e antioxidantes.

Soja, cenoura, frutas cítricas, pepino, tomate, pimentão, berinjela, cereja, salsa, cerejas

γ-glutamil cisteína alílica

Redução da pressão sanguínea e favorecimento do sistema imunológico

Macerado de alho

Indóis

Desativam os estrógenos

Couve, repolho, brócolis

Isotiocianatos

Indutores de enzimas protetoras

Mostrada, rabanete

Limonóides

Indutores de enzimas protetoras

Frutas cítricas

Licopeno

Antioxidante, anti-oncogênico, tolerância à radiação UV

Tomate, pimentão, melancia, cenoura, mamão

Monoterpenos

Inibem a produção de colesterol, antioxidante, anti-oncogênico

Cenoura, tomate, berinjela, pimentão, grãos integrais, frutas cítricas, cereja

β-glucanos

Protegem contra enfermidades cardiovasculares

 Aveia, cevada, milho, sorgo

Oligossacarídeos

Ativam a microflora intestinal

Frutas e cereais

Isoflavonas

Ação anti-oncogênica

Soja e derivados

Fibras insolúveis

Ação anti-oncogênica

Arroz integral, aveia, soja, lentilha banana, nozes,

Ácidos Fenólicos

Ação anti-oncogênica, anti-sépticos

Cenoura, tomate, berinjela, pimentão frutas cítricas, couve, brócolis, cereja

Ftálidos

Simulam a produção de enzimas benéficas, que possuem atividade anticarcinogênica

Cenoura, salsa,

Poliacetilenos

Protegem contra cânceres causados por substâncias presentes no tabaco

 

Cenoura, aipo, salsa

Triterpenóides

Previnem as cáries, possuem ação anti-ulcerativa e antiinflamatória

Soja, frutas cítricas, alcaçuz

Terpenos

Anti-oncogênicos, antiinflamatórios

Frutas cítricas, teixo (Taxus baccata)

Triterpenos

Expectorantes, antiinflamatórios, adaptógenos, vaso-constritores, atenuam os sintomas do climatério

Cicuta aquática, erva de lagarto

Lignanas

Citostáticos , antiinflamatórios, hepatoprotetores

Noz moscada, óleo de linhaça

Tanino

Antioxidantes, anti-sépticos, vaso-constritores

Maçã, sorgo, manjericão, manjerona, sálvia, uva, caju, manga

 

Agradecimentos: O autor agradece a revisão dos originais pelo Médico Cardiologista, Dr. Waldmir Belinati; pela Nutricionista, Dra. Maria Cristina D. Paes; pela Engenheira de Alimentos, Vera T. Benassi; pelo Bioquímico, Dr. José Marcos G. Mandarino; e pelo Engo. Agro. Dr. Léo P. Ferreira.