Preço do petróleo

Décio Luiz Gazzoni

 

Petróleo tem muito a ver com o agronegócio, porque é parte do custo de produção (fretes e óleo diesel e derivados de petróleo como agrotóxicos e adubos nitrogenados). Além disso, o preço do biodiesel e do etanol andam de mãos dadas com o petróleo, e é interessante verificar para onde vai a cotação de uma das commodities mais importantes da economia contemporânea. Durante um século (1870-1970) o petróleo andou cotado abaixo de US$20,00 por barril, ao valor do dólar de hoje. Aí vieram os choques do petróleo, o preço disparou para US$90,00, depois sossegou durante uns 15 anos aí pela casa dos US$20,00/barril. Até que de repente, não mais que de repente, a sua cotação começou a subir uma escada. Foi para 40, depois 60 (até maio de 2007) e agora bateu em US$135,00. Pior ainda: já tem investidor (especulador?) comprando petróleo a futuro a US$200,00 para daqui a um ano.

 

Porque o preço sobe?

As causas todos sabemos: o custo de produção subiu (o petróleo não mais jorra do solo); fretes dispararam; poços secaram; as reservas estão caindo em relação à produção; a demanda subiu (em especial China e Índia); a produção não aumenta; o dólar desvalorizou; e há excesso de liquidez no mercado financeiro, que levou investidores a colocar seu dinheiro em commodities, ajudando a disparar a cotação de commodities agrícolas e não agrícolas – entre elas o petróleo. O problema do preço alto do petróleo é que ele leva junto as outras commodities, por ser o preço referencial da energia, que é transversal a todas as demais commodities. O problema central é o seguinte: qual (ou quais) destas causas são as mais importantes e que vão permanecer no médio prazo.

 

Consequências

Se as principais forem causas estruturais (redução de reservas, aumento de demanda, etc...), há chance de os especuladores do petróleo a US$200,00 ganharem algum dinheiro. Porém, se o mais importante for a especulação, o mico ainda vai sobrar na mão de alguém, como sobrou no calote dos compradores de casas nos EUA. O preço alto leva à inflação, que conduz ao aumento de juros, que significa menor crescimento econômico. Ganham os exportadores da OPEP (aumento estimado de 3% do PIB pela alta do petróleo), perdem os importadores (EUA, China, Europa, Índia). No Brasil, o impacto direto será menor, pois nós temos o colchão do etanol que amortece a queda. Mas, se o crescimento econômico mundial diminuir, não há como o Brasil não ser afetado. E, se o preço continuar alto, o custo de produção agrícola continuará nas alturas.

 

Etanol e emissões evitadas

Décio Luiz Gazzoni

  Segunda feira, 2 de junho, 11 horas da manhã. De Roma a assessoria do Presidente da República solicita informações sobre emissões de gás carbônico evitadas pelo uso do etanol combustível. O Presidente Lula queria usar a informação em seu discurso na FAO: cada carro movido à álcool significa quantos carros à gasolina parados na garagem?. Só que 11h do Brasil significam 16h em Roma, logo a informação era para ontem! De alguma maneira estava acostumado, pois fato semelhante havia ocorrido anteriormente, às vésperas de outra reunião de uma organização internacional. Mas valeu o exercício, porque às vezes não nos damos conta do potencial de nossas tecnologias limpas.  

 

Emissão / absorção

Baseei os cálculos e a análise em estudo da UNICAMP, o qual demonstrou que, ao longo de todo o seu ciclo de vida (da formação da muda de cana até a queima do etanol no motor do veículo), ocorre uma emissão líquida de 309 kg/1.000 L de etanol. Durante o ciclo, existe uma absorção/fixação de 7.464 kg CO2 / 1.000L contra uma emissão de 7.773 kg CO2 / 1.000 L de etanol. A emissão líquida de CO2 da gasolina, desde a extração do petróleo até a queima no motor dos veículos é de 3.368 kg / 1.000 L. Utilizando o banco de dados da ANP, verificamos que, nos últimos cinco anos, o Brasil evitou emissões de 195 milhões de toneladas de CO2, devido ao uso de etanol em veículos a álcool ou flex fuel, e à mistura de 25% de etanol na gasolina C. Caso o Brasil tivesse substituído toda a sua frota de veículos leves por veículos que operassem exclusivamente com etanol hidratado, as emissões evitadas teriam alcançado 501 milhões de toneladas de CO2, no mesmo período.

 

Veículos parados

Pela relação de emissões entre álcool e gasolina, cada veículo que roda movido a etanol combustível, significa, em termos de emissão de CO2, o equivalente a que 5,6 carros movidos a gasolina não rodem nas ruas ou estradas. Observa-se, também, que apenas as emissões evitadas com o uso de etanol no Brasil, em 2008, equivalem a 142% das emissões veiculares de CO2 na Espanha (2003) ou 73% das emissões observadas na Itália. Caso toda a frota brasileira fosse movida a etanol, as emissões evitadas equivaleriam a 300% das emissões da Espanha, 54% das emissões da Itália ou 121% das emissões do Reino Unido, observadas em 2003, pelo uso de gasolina em veículos leves. A dureza de Lula, enfiando estes e outros números goela abaixo de protecionistas e poluidores do Primeiro Mundo, compensou ficar sem almoço na segunda!

 

Sorgo transgênico

Décio Luiz Gazzoni

 

Há dias comentei, durante uma conferencia, que o descompasso entre oferta e procura de alimentos, iniciado em 2007 terá diversas conseqüências, sendo uma delas a maior aceitação social de ferramentas científicas avançadas, como a biotecnologia. Pesquisadores estão desenvolvendo sorgo transgênico mais nutritivo, destinado aos 300 milhões de africanos que o utilizam em sua dieta. A modificação genética de culturas era controversa na África, onde as ONGs asseveram ser a tecnologia inadequada para os países em desenvolvimento. Já os cientistas ressaltam que a nova variedade redundará em população mais nutrida, logo mais saudável.

 

 

O projeto

O Projeto África Biofortified Sorghum é conduzido por um consórcio de nove membros, agraciado com um financiamento de cinco anos no valor de US$ 18,6 milhões, proveniente de doadores de fundos de pesquisas como a Fundação Gates. O projeto se encaixa na chamada segunda geração de transgênicos, caracterizado por conter mais aminoácidos essenciais, especialmente lisina, e teor mais elevado das vitaminas A, E, e maior biodisponibilidade de minerais como ferro e zinco. Não havia como atingir todos estes objetivos, ao mesmo tempo, utilizando processos tradicionais de melhoramento, portanto houve o recurso às técnicas de biotecnologia para introduzir no sorgo os genes que melhoraram a qualidade e a digestibilidade das proteína, além da melhoria na concentração de vitaminas e sais minerais. Também faz parte do projeto o treinamento de cientistas Conselho de Investigação Científica e Industrial da África do Sul e do Instituto Agrícola do Quênia.

 

Reação

Há alguns anos, um consórcio similar desenvolveu o arroz dourado, com elevada concentração de vitamina A, cujo objetivo era reduzir dramaticamente os índices de cegueira e outras doenças causadas por hipovitaminose A, aproveitando o fato de que as populações dos países pobres, afetadas pelos distúrbios, tinham no arroz a sua base alimentar. O projeto foi violentamente bombardeado por ONGs do Primeiro Mundo e nunca avançou. Agora, quer me parecer que os tempos mudaram, porque, nos últimos 5 anos, centenas de milhões de pessoas que viviam na miséria passaram a disputar o mercado alimentício, exigindo produtos de maior qualidade e mais nutritivos. Uma das soluções para este dilema está no uso de ferramentas científicas avançadas, para melhorar a produtividade e a qualidade dos cultivos, permitindo melhorar a oferta de produtos mais nutritivos, diminuindo a fome e a carência nutricional do mundo.

 

IMIN 100

Décio Luiz Gazzoni

Justíssima a homenagem aos japoneses que escolheram o Brasil e aos "japoneses" brasileiros. Hoje coloco minha gota nesta homenagem, apresentando uma palestra no recinto da Exposição da IMIN 100. Sempre tive muita admiração por algumas características marcantes da cultura japonesa, que se acentuou após visitar o Nippon. Em especial admiro a coragem, a perseverança, a capacidade de superar obstáculos que pareciam intransponíveis, a solidariedade com os semelhantes. No setor do agronegócio muitas das conquistas recentes do Brasil tem o DNA dos nisseis e sanseis.

  Minha passagem pelo Japão foi marcante, lembro de (quase) tudo em cores vívidas. Minha missão era negociar um financiamento japonês de US$20 milhões para aplicação em pesquisa agropecuária no Cerrado brasileiro. Porém, as melhores lembranças não estão na negociação bem sucedida. São "causos" que marcaram minha lembrança. Como eu não entendia nada dos símbolos japoneses, arrumei um guia dos trens e metrôs de Tóquio, escrito em inglês, que trazia os horários de cada trem. A partir daí não olhava mais para os hieróglifos na frente do trem, decidia pelo horário. Surpresa: o trem das 8h01´30" passava exatamente às 8h01´30"! Os restaurantes expõem modelos dos pratos na vitrine, com o nome (em hieróglifos) numa plaquinha. Eu copiava o nome em um papel e entregava ao garçom. Nada mais falava ou ouvia, mas almoçava bem!  

Demorei meia hora para entender que trem bala não se chamava bullet train porém Shinkansen. O tal que passa ao sopé do monte Fuji e nos leva a Kobe, Kyoto e outras maravilhas seculares, com templos que impõem respeito e admiração. E que leva próximo ao circuito de Suzuka, onde perdi a oportunidade de ver o Senna ao vivo e em cores por conta do dueto chuva x amigdalite. No trem suburbano encontro uma dúzia de jovens tagarelas, em um sábado à tarde. Não agüento a curiosidade e puxo uma conversa: que faziam de uniforme escolar em pleno sábado à tarde? Descubro que escola no Japão é em tempo integral, 6 dias por semana, 10 meses por ano. Morro de inveja até hoje: por que no Brasil não é assim? Que falta nos faz educação de qualidade! Também conheci a maior propriedade de Hokkaido, norte do Japão, um latifúndio de 24 ha. E sai excitadíssimo de um laboratório onde cientistas conseguiam cultivar plantas tropicais em ambiente gelado, introduzindo genes de plantas adaptadas ao frio através de engenharia genética. Garanto a vocês que não morro sem pisar novamente no Japão. Bem, ao menos no que depender de mim.

 

O agronegócio do perfume

Décio Luiz Gazzoni

  O leitor conhece o termo feromônios? Trata-se de hormônios externos a um organismo, muito comuns no reino animal. Eles são muito estudados nos insetos, onde foram identificados hormônios sexuais, de atração, de alarme, de trilha, etc. São substâncias químicas voláteis que, quando liberadas por um indivíduo, afetam o comportamento de outros indivíduos da mesma espécie. No caso dos insetos, o feromônio de alarme provoca a dispersão da comunidade (perigo à vista). O feromônio de agregação exerce efeito oposto.  

 

Comunicação

Para nós, seres superiores, acostumados à fala e aos sinais, pode parecer esquisito. Porém, os feromônios representam uma forma de comunicação não verbal, e seu estudo vem demonstrando tratar-se de elementos-chave no relacionamento entre indivíduos. Apesar de não serem percebidos conscientemente, os feromônios podem determinar – por exemplo - a escolha do parceiro. Você já passou por uma paixão aguda (ou conhece alguém acometido por ela) em que não há explicação racional para o fenômeno? Suspeite dos feromônios, pois eles podem ser a explicação para um comportamento diferenciado!

 

Fisiologia

Sabemos que o hipotálamo é um centro olfativo e libera diversos hormônios que passam para a pituitária, induzindo-a a segregar os hormônios que governam e controlam os ciclos sexuais dos mamíferos. Isto permite entender o efeito dos feromônios masculinos sobre o sexo oposto. O efeito dos feromônios sobre as pessoas é tão forte que, em experiências feitas com meninas internas em colégios de freiras, e que manifestavam desarranjos menstruais, estas tiveram uma redução perceptível do distúrbio ao passarem a estudar em colégios onde mantinham contato com meninos. A suspeita dos médicos é que a alteração ocorreu por interferência de um feromônio masculino.

 

Óleos essenciais

Existem relatos de uso comercial dos feromônios, em que substâncias exaladas por homens são aspergidas sobre artigos femininos, aumentando, perceptivelmente, suas vendas. Certos óleos essenciais possuem compostos que imitam os feromônios, causando efeito semelhante sobre as pessoas. Alguns exemplos são o aipo, cominho, ylang ylang, jasmins e o benjoim do sião. Como o leitor percebe, existe uma enorme oportunidade de negócio na base desta pirâmide, que permite ocupar o nicho de produção de plantas com alto teor de óleos essenciais, destinadas a perfumaria, que se trata de um mercado caro e altamente remunerador. É um dos agronegócios do futuro.

 

Cuba

Decio Luiz Gazzoni

A União Européia, ao reduzir as pressões comerciais sobre Cuba, está seguindo uma tendência mundial de considerar que um ciclo se encerra na paradisíaca ilha do Caribe e que um novo tempo deve começar. Fidel Castro foi para os bastidores e sua insignificância pode ser medida pela polêmica que estabeleceu com Caetano Veloso - com todo o respeito pelo baiano, época houve em que Fidel tronitroava contra os poderosos do mundo. O Brasil está ajudando na recuperação da ilha, enviando agrônomos especialistas em diversas áreas da agricultura, para tentar tirar o atraso em que se enfiou a agricultura cubana. Basta lembrar que, quando Fidel inaugurou a ditadura na ilha, a produtividade de cana lá era 20% mais alta que no Brasil. Passados 50 anos, o Brasil é o paradigma mundial da tecnologia de produção de cana, açúcar e álcool e Cuba um importador de alimentos.  

Os sistemas de produção agrícola em Cuba ficaram tecnologicamente estacionados na metade do século passado, quando comparados ao estado da arte mundial. Nos primeiros 30 anos não havia necessidade de eficiência econômica ou competitividade por parte da agricultura cubana, pois o açúcar exportado para a União Soviética era remunerado muito acima dos preços internacionais, dentro do objetivo de tornar a ilha vistosa propaganda do regime comunista. Com o tempo, a falta de estímulos como a remuneração insuficiente e igual para todos, fez com que os índices produtivos da ilha fossem despencando. A produção estatal, que no início era de 260 mil toneladas anuais, despencou para 50 mil. Mesmo a produção privada não consegue abastecer o mercado, embora a extrema pobreza não permita grandes veleidades de consumo alimentar, exigindo a importação de mais de 500 mil toneladas anuais de arroz.

 

 

Pragas

Junto com o atraso tecnológico, o descaso com a sanidade das lavouras cobra o seu preço. As áreas de arroz e de outros grãos ou outros alimentos estão infestadas por invasoras ou por aves (marabus), que se encarregam de reduzir ainda mais a produtividade já baixa. Com o aumento do preço dos alimentos no mercado internacional e com os baixos salários da ilha, o tema alimentação ficou ainda mais sensível. A solução de médio e longo prazo é a transferência de tecnologia e a assistência técnica que o Brasil e outros países estão prestando. No curto prazo, Cuba fica cada vez mais dependente dos petrodólares do companheiro Chávez, que substituiu a União Soviética na tarefa de bancar o arroz e feijão de cada dia dos cubanos.

 

 

Cumbre de las Americas

Decio Luiz Gazzoni

Cumbre de las Americas é um evento realizado a cada 3 anos, reunindo os 34 Chefes de Estado das Américas, eleitos democraticamente, com o objetivo de trocar idéias e opiniões acerca de temas de interesse comum, nos aspectos políticos, sociais, econômicos, energéticos, educacionais ou de segurança. Este processo iniciou em 1994 e resultou em inúmeras iniciativas conjuntas ou políticas públicas nacionais, as quais conduziram a avanços nos aspectos de saúde pública, educação, infra-estrutura, agricultura, segurança, prevenção, preparo e mitigação de desastres, conservação ambiental e governança democrática no hemisfério, buscando beneficiar a população das Américas. O evento é promovido pela Organização dos Estados Americanos e o próximo encontro será realizado em Trinidad y Tobago, em abril de 2009.   Preparo

Uma vez definido o local e o temário central do Cumbre, seguem-se três anos de intensas negociações e reuniões preparatórias, objetivando levar propostas concretas e tecnicamente consensuadas para a análise política final e aprovação dos Chefes de Estado. Estas reuniões abrangem todos os temas de interesse comum da região, porém a grande vedete sempre é o tema central. Para o V Cumbre, a ser realizado em 2009, o tema é "Assegurando o futuro dos nossos cidadãos promovendo o desenvolvimento humano, a segurança energética e a sustentabilidade ambiental."

 

  Agroenergia

Esta semana estou em San José, Costa Rica, sede do Instituto Interamericano de Cooperação Agrícola, onde se realiza a reunião preparatória para o V Cumbre e onde a OEA vai definir a proposta a ser apresentada aos chefes de Estado, sobre "Agroenergia, alimentos e sustentabilidade ambiental". Tive a honra de ser convidado para apresentar a conferencia principal do evento, contendo um esboço de uma proposta de integração da produção de agroenergia com garantia de produção de alimentos, com o mínimo de impactos ambientais. Antecipo aos leitores minha conclusão: Até 2030 poderemos garantir alimentos suficientes para uma população estimada de 750 milhões de pessoas, ao mesmo tempo em que garantiremos toda a lenha necessária para os fogões, substituiremos 20% da gasolina (100% no Brasil) e do diesel por biocombustíveis, utilizando cerca de 17% da área potencial para expansão da agricultura no continente. É uma visão otimista, para um continente privilegiado no âmbito mundial que, porém, prevê investimentos muito altos em pesquisa para sua consecução. Entre outras, esta é uma das políticas públicas que proponho.

 

 

A aposta americana

Decio Luiz Gazzoni

 

Americano pode ter muitos defeitos, mas burro jamais será um deles. E também tem algumas virtudes, sendo a mais visível o aguçado senso de perceber oportunidades de negócios. Apesar de o etanol de milho ser um erro por sua insustentabilidade energética, econômica e social, longe de ser uma burrice é uma "esperteza" dos lobbies organizados do setor agro-industrial, que viram uma enorme oportunidade de ganhar dinheiro – já no curto prazo – em cima do discurso do biocombustível ambientalmente correto. Daqui a 15 anos, etanol de milho ou será história ou terá perdido importância econômica. Não importa, até lá os que vislumbraram a oportunidade de ganhar dinheiro já tiveram o seu capital retornado com polpudos lucros.

 

 

Transição

Mas os empresários americanos entraram no negócio do etanol de milho porque, no momento, não há qualquer coisa nos EUA que tenha a rentabilidade energética da cana-de-açúcar. Logo, valeu o ditado: quem não tem cão, caça com gato. Mas, isto não é para sempre. Os gringos estão investindo dezenas de bilhões (eu disse bilhões) de dólares em pesquisa de novas fontes de energia renovável, mormente de biomassa, eólica e solar. Na área de biomassa as apostas são de duas ordens. No curto prazo (já para a próxima década) o grande breakthrough virá do etanol celulósico. Não apenas os institutos e universidades governamentais, mas gigantes da iniciativa privada estão investindo alguns bilhões de dólares para chegar, rapidamente, a uma tecnologia industrialmente viável para produzir etanol de celulose. Isto será a transição para novos biocombustíveis, ainda mais eficientes, que ingressarão no mercado na década de 20.

 

Etanol celulósico

A idéia central é livrar-se de qualquer produto de baixa densidade energética ou que seja alimentar, como os cereais (milho, trigo ou cevada) e partir para biomassas de alta produtividade, como gramíneas, restos de cultura ou resíduos. Este material possui alta concentração de celulose (que é um polímero formado por inúmeras moléculas de glicose) ou hemi-celulose (um polímero de pentoses). O segredo da tecnologia é criar, em laboratório, um fermento transgênico que tenha a capacidade de, num primeiro instante, quebrar as moléculas de celulose ou hemi-celulose, nos seus açúcares primários. No segundo instante, transformar os açúcares em álcool. E, no terceiro instante, forrar a conta bancária dos empresários. Não tenham dúvida que o script será cumprido à risca, como nas obras primas de Hollywood.

 

Água com racionalidade

Décio Luiz Gazzoni

 

O Brasil é um país diferenciado em muitos aspectos. Por exemplo, o uso de agricultura irrigada cresce em todo o mundo, menos por aqui. Em alguns países do sudeste asiático, a área irrigada supera a não irrigada. O uso da água é tão alto, que alguns estudos colocam a agricultura como o principal fator individual de consumo de água no mundo. Porém, como água é um dos principais fatores de expansão e garantia de produtividade, temos sempre que pensar em um futuro em que vamos precisar irrigar, ao menos parcialmente, nossas lavouras. Aí entra o tema do uso racional da água, porque, num futuro bem próximo, a água será um insumo de disponibilidade cada vez mais restrita, logo caro. Além do que, a sociedade mundial vai cobrar esta racionalidade.

 

 

 

Modificações

Pesquisadores da ESDALQ/USP desenvolveram um sistema para monitoramento e controle automático de irrigação de precisão em sistemas de pivô central para grandes áreas. O hardware desenvolvido consiste em conjuntos de sensores de umidade colocados estrategicamente em vários pontos da área irrigada pelo pivô central. Estes sensores são ligados a sistemas de radiofreqüência que enviam as informações para uma central de processamento, que analisa as informações e estabelece a lâmina de água necessária em cada parcela, acionando o pivô central de modo a aplicar lâminas diferenciadas de acordo com a necessidade da parcela. O objetivo da pesquisa foi reduzir o consumo de água associado a incrementos na produtividade. Os resultados mostraram que tanto os circuitos como os aplicativos desenvolvidos apresentaram funcionamento satisfatório, com grande potencial para utilização em sistemas de irrigação de precisão.

 

Ganhos

Na irrigação tradicional, todas as plantas recebem o mesmo tratamento, ou seja, supõe-se que todas as plantas e os solos onde estejam plantadas, sejam iguais. Como existe variabilidade do solo, da planta e na incidência de luz solar, o ideal seria que cada planta fosse tratada individualmente, isto é, de acordo com seu porte e características, recebendo quantidades diferenciadas de insumos visando à otimização do uso do insumo e também a produtividade da planta. Como isto não é possível na prática, o conceito de agricultura de precisão permite o tratamento em nível de subáreas, agrupando as plantas em parcelas em que cada parte apresenta características e necessidades semelhantes quanto a um dado insumo, como água, fertilizantes e agrotóxicos, maximizando a margem do agricultor e poupando insumos cada vez mais caros.

 

Biocombustível aéreo

Décio Luiz Gazzoni

Enquanto algumas lideranças mal informadas – ou mal intencionadas e bem pagas – procuram deslustrar a importância que os biocombustíveis terão para o futuro energético e para diminuir os impactos ambientais das atividades humanas, outros possuem senso prático e buscam resolver adequadamente esta questão. Recentemente, a Airbus anunciou uma parceria com a Honeywell, a International Aero Engines e a JetBlue Airways para desenvolver uma segunda geração de biocombustíveis, que atenda as especificações da aviação comercial. O principal objetivo desta união será transformar os óleos obtidos a partir de vegetais e algas em combustíveis para aviões e conseguir a autorização das organizações encarregadas das normas, para seu uso seguro. Obviamente, questões como conflito com abastecimento alimentar e impactos ambientais no processo produtivo são premissas obrigatórias antes que o plano saia da prancheta.  

Impactos positivos

A cada dia os aviões usam milhões de barris de querosene de petróleo. Para substituir parte do querosene, é necessária uma opção mais eficiente que as fontes de biomassa e os biocombustíveis disponíveis hoje. Neste contexto, a Airbus acredita que uma segunda geração de biocombustíveis de aviões pode abastecer até 30% de toda a aviação comercial até 2030. Além de trabalhar com um cenário de preços de petróleo perto dos US$500 por barril, a Airbus também aposta na pressão mundial para que os aviões diminuam o impacto ambiental, usando biocombustíveis que emitam menos gases de efeito estufa. Os biocombustíveis de segunda geração emitem menos poluentes no seu ciclo de vida em relação ao querosene, que é usado atualmente.

 

 

Atualidade

De alguma maneira, o programa já apresenta efeitos práticos. Em fevereiro de 2008, um avião da Virgin Atlantic fez o primeiro vôo comercial com biocombustível entre Londres e Amsterdã, resultado de um programa realizado junto com a Boeing e a General Electric. Ainda em fevereiro, a Airbus lançou um programa de pesquisa de carburantes sintéticos e fez um vôo teste com o A380, usando querosene misturado com um combustível sintético, obtido a partir de biomassa gaseificada. Do programa participam a Airbus, a Shell, a Rolls Royce e a Qatar Airways, e os primeiros vôos comerciais com uma mistura deste combustível sintético em 50% serão realizados até 2009. De qualquer maneira, quem vai produzir a matéria prima será o agricultor. E quem sabe, com aviões movidos a óleo de soja, o meu amigo Romeu Kiihil volta a viajar de avião!

 

Energia da glicerina

Décio Luiz Gazzoni

Pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) identificaram bactérias que degradam a glicerina para sua transformação em biogás. O trabalho utiliza o resíduo bruto da glicerina gerado pela produção de biodiesel e que, por não poder ser vendida como matéria-prima para indústrias como a de cosméticos, acaba sendo descartado em aterros industriais. O passivo ambiental pode transformar-se em negócio. O biogás é produzido quando bactérias encontradas no esterco bovino é colocado em contato com a glicerina bruta em equipamentos biodigestores.  

Processo

Os microrganismos se alimentam dos nutrientes do esterco, que é colocado em contato com a glicerina líquida, para transformá-la em metano por meio de reações bioquímicas. A reação química ocorre na ausência do oxigênio, uma vez que as bactérias empregadas são anaeróbias. Calcula-se que, para cada litro de biodiesel produzido, sejam descartados, aproximadamente, 300 mililitros de glicerina. A preocupação dos pesquisadores é com o aumento dessa quantidade de rejeito depois que o país adotar a adição de 5% de biodiesel ao diesel, prevista para ocorrer em 2013. Com isso, poderá haver mais glicerina do que as indústrias são capazes de utilizar. Já a partir de julho as indústrias começaram a adicionar 3% de biodiesel ao diesel, o chamado B3. O excedente de glicerina bruta no mercado, por conta da maior produção nacional do biocombustível, leva a investir em tecnologias dessa natureza, levando em conta as concentrações ótimas de todas as substâncias envolvidas no processo.

 

 

Benefícios

Além do biodiesel produzido a partir de oleaginosas, outras pesquisas indicam a possibilidade de produzi-lo a partir de óleos que sobram em cozinhas industriais, por exemplo. Nesse caso, a glicerina resultante não é nobre, como a utilizada pela indústria de cosméticos e fármacos. E o foco atual do trabalho é justamente esse subproduto mais bruto, que polui o meio ambiente quando descartado incorretamente. Após a identificação do consórcio de bactérias que degrada a glicerina, o próximo passo do estudo é analisar a relação entre os teores de glicerina e esterco empregado no processo de biodigestão com a quantidade e a qualidade do gás metano gerado. No momento a equipe de pesquisadores está estudando as concentrações ideais para estabelecer parâmetros de produção do biogás em larga escala. Os primeiros resultados dessa linha de pesquisa devem ser divulgados em meados de 2009, permitindo gerar novos negócios derivados da agroenergia.

 

 

Segurança alimentar

Décio Luiz Gazzoni

 

O mundo vive uma turbulência financeira, com três pilastras mais evidentes. A primeira é a crise de crédito nos EUA, que derrubou o crescimento da sua economia; a segunda é o dueto especulação financeira e desvalorização do dólar; e o terceiro a alta espetacular das commodities agrícolas, gerando um aumento no preço dos alimentos. O fenômeno foi detectado pelos principais indicadores de preços de alimentos (FAO, USDA, BIRD) e pode significar uma reversão na inserção social de estimados 500 milhões de seres humanos que, ao longo dos últimos 10 anos, saíram da faixa de fome para o mercado de alimentos. Ironicamente, esta inserção social é uma das principais causas do aumento do preço dos alimentos no mundo pois, pela lógica capitalista, primeiro aumenta a demanda, que aciona a correia de transmissão de preços, para, no final, haver redução de demanda, aumento de oferta ou combinação dos dois. Estima-se que os preços permanecerão altos por, no mínimo, mais 5 anos. O que fazer?

 

 

Aumentar a oferta

Esta é a solução clássica do capitalismo, para que produtores e consumidores saiam satisfeitos. O aumento da produção pode ocorrer por expansão de área e/ou elevação da produtividade. Expandir a área esbarra em barreiras sérias como a obstrução das ONGs ambientais e o elevado custo de produção para abertura de novas áreas e para transportar a colheita. Outra forma ainda não ventilada pelos líderes mundiais é um esforço continuado para acabar com o desperdício de alimentos em escala mundial que, de acordo com a fonte, varia entre 20 e 30%.

 

Tecnologia

Mais racional é o aumento da produtividade, por melhor uso de tecnologia agrícola. Elaborei um modelo matemático para responder a seguinte questão: seria possível, num período de 20 ano, atender ao aumento da demanda de alimentos devido ao crescimento da população e, ao mesmo tempo, acabar com a população faminta do mundo, sem expandir área? Cheguei à conclusão que isto é possível, desde que tenhamos ganhos de produtividade agrícola anual que iniciem em 1,5% a.a. (2009) e terminem em 2% a.a. (2020). A redução do número de famintos não poderia ser linear porque, no início, a oferta é inferior à demanda. Porém, na década de 20, haveria uma redução constante da população faminta, até sua extinção. Por falta de comida, ninguém passaria fome. Quem não dispusesse de renda, seria sustentado pelos programas sociais. E tudo isto sem aumentar um único hectare na área cultivada. É o retorno social dos investimentos em tecnologia agrícola.

 

Fitoterápicos

Décio Luiz Gazzoni

A goma-guar é extraída de uma leguminosa (Cyamopsis tetragonolobus), originária da Índia, onde é usada para espantar a fome. Por ser rica em fibras, acredita-se que ajude a conter o colesterol, o diabetes e a obesidade. Uma equipe da Universidade Federal do Ceará verificou que a galactose da goma-guar, pode reduzir a dor e conter a perda da cartilagem nas articulações e reconstituir ao menos parte dos movimentos perdidos com a artrose.

 

Pesquisa

Os pesquisadores investigavam o uso da goma-guar como anestésico, quando descobriram que, se usada in natura, provocava inflamação nas juntas corroídas pela artrose. Retiraram a proteína e verificaram que os açúcares restantes aplacavam a dor na artrose. Em seguida, isolaram o açúcar responsável por essa ação, a galactose, encontrada em frutas e no café. A inovação está no fato de que não existe um medicamento que impeça a progressão da artrose. A descoberta foi patenteada e os estudos deveriam migrar da parte química para a biologia, com os testes de toxicidade em animais de laboratórios e, posteriormente em seres humanos. Antecipa-se que, por ser constituída por açúcares que circulam continuamente pelo organismo, a substância não é tóxica nem alérgica.

 

 

Similares

Cientistas da USP encontraram galactomananos em abundância na semente de uma árvore típica do cerrado, o barbatimão (Dimorphandra mollis). Como esses açúcares eram quimicamente idênticos aos da goma-guar, imaginou que as sementes de barbatimão poderiam ser uma fonte alternativa ao goma-guar. A mesma equipe identificou no capim-favorito (Rynchelytrum repens) outro açúcar, o betaglucano, que nos experimentos preliminares em camundongos reduziu pela metade a taxa de glicose no sangue – portanto, poderia ser uma alternativa para o tratamento de diabetes. Até hoje não conseguiu avançar nessa pesquisa, mas logo depois ele descobriu outro açúcar, desta vez um xiloglucano, na goma da semente do jatobá (Hymenaea coubaril), que poderia ser usado em cremes para pele. O leitor sabe por que estas descobertas vão demorar a beneficiá-lo? Porque nenhuma das duas universidades possui equipamentos e pessoal para realizar os testes toxicológicos. Dói na alma saber que, com 20% do que foi roubado no mensalão, poderíamos aliviar a dor e curar milhões de brasileiros, além de criar mais uma alternativa rentável para os agricultores. Na dúvida, o cientista da USP responsável pela pesquisa cedeu a patente a uma empresa de cosméticos, em troca de equipamentos para seu laboratório!

 

 

Biocombustíveis nos aviões

Décio Luiz Gazzoni

 

A Airbus anunciou a formação de uma parceria com a Honeywell, a IAE (International Aero Engines) e com a companhia aérea JetBlue Airways para o desenvolvimento de uma segunda geração de biocombustíveis para a aviação comercial. Em comunicado, a Airbus afirma que o principal objetivo desta união será transformar os óleos obtidos a partir de vegetais e algas em combustíveis para aviões e obter a autorização das organizações encarregadas das normas. A empresa está analisando se o combustível obtido a partir da biomassa afetaria a produção atual de alimentos ou colocariam em risco os recursos naturais. A Airbus acredita que os biocombustíveis de segunda geração, que fazem parte de sua meta, emitem menos poluentes em todo seu ciclo de vida em relação ao querosene, que é usado atualmente.

 

 

Tecnologia

Para chegar a este biocombustível, a empresa vai usar a tecnologia da Honeywell, que desenvolveu um novo processo de conversão a partir de matéria orgânica. A cada dia os aviões usam milhões de barris de querosene para voar e, para substituir uma parte significativa, é necessário encontrar uma opção melhor que as fontes de biomassa e os processos de conversão disponíveis hoje. Deste modo, será possível abastecer até 30% de toda a aviação comercial até 2030 com biocombustíveis. O que a Airbus busca é matéria prima de alta densidade energética, proveniente de plantas com alta capacidade de produção de biomassa por hectare, e processos de conversão altamente eficientes. Com o uso de biologia molecular, será possível desenvolver microrganismos transgênicos, altamente eficientes na conversão de biomassa em produtos energéticos. No limite da tecnologia, a produção de bio-hidrogênio, prevista para a década de 2030.

 

Testes

Em fevereiro de 2008, um avião da companhia britânica Virgin Atlantic foi o primeiro a voar em rota comercial com combustível biológico, entre Londres e Amsterdã, resultado de um programa realizado junto com a Boeing e a General Electric. Entretanto, em fevereiro, a Airbus já tinha lançado um programa de pesquisa de carburantes sintéticos e fez um primeiro vôo teste com seu modelo A380 – o maior avião do mundo - usando um querosene misturado com um combustível sintético obtido a partir do gás. O programa, do qual participam, além da Airbus, a petrolífera Shell, a fabricante de motores Rolls Royce e a companhia aérea Qatar Airways, tem como objetivo realizar os primeiros vôos comerciais com uma mistura deste combustível sintético em 50% até 2009.

 

Etanol de milho transgênico

Decio Luiz Gazzoni

Considero o etanol produzido de milho insustentável tanto econômica quanto energeticamente. Porém tudo pode mudar, dependendo de uma enzima presente no estômago da vaca e que pode ser a chave para a otimização da produção de bioetanol a partir do milho, Os cientistas entendem que conseguir biocombustível mais barato passa pelo aproveitamento de todas as partes da planta e não apenas do grão do cereal. Para tanto, criaram em laboratório uma variedade de milho que possui uma enzima presente no estômago da vaca. Isto foi possível pela inserção na planta de um gene da bactéria que produz a enzima e participa na digestão de fibras vegetais. Segundo a investigação, esta alteração genética do milho faz com que os polissacarídios armazenados nas folhas e na espiga possam ser convertidos em açúcar reutilizável, sem o recurso aos habituais e caros processos químicos.  

Aproveitamento total

Não apenas o amido ou a sacarose passam a ser transformados em etanol, mas a porção de fibra, composta por hemicelulose e celulose. As vacas, com a ajuda de determinadas bactérias, conseguem converter estas fibras em energia. A produção da enzima pela planta de milho permite que o mesmo processo possa ser completado nos fermentadores, com a planta de milho completa, incluindo os colmos. Na indústria tradicional apenas os grãos são utilizados para produzir etanol. Produzir mais combustível, com menos custos, significa romper com o passado e criar um ambiente favorável para a produção sustentável de etanol, como já é possível com a cana-de-açúcar.

 

 

Evolução

Para transformar celulose em açúcar eram necessárias três enzimas. A variedade de milho transgênica, alterada especificamente para a produção de biocombustível, chama-se Spartan Corn III, e difere das tentativas anteriores por conter as três enzimas necessárias. Na primeira tentativa, em 2007, a enzima de um micróbio que vive em nascentes termais desfazia a celulose em vários pedaços, para posterior fermentação. A segunda tentativa, com o uso de um gene presente em fungos, convertia os pedaços de celulose produzidos pela enzima anterior em pares de moléculas de açúcar. Mas o Spartan Corn III produz uma enzima que separa os pares de moléculas do açúcar em açúcares simples. Estes açúcares estão prontos para fermentar e produzir etanol, o que significa que quando a celulose é reduzida a esta unidade pode ser utilizada para produzir etanol. Falta, agora, comprovar que esta tecnologia torna o etanol de milho tão rentável e sustentável quanto o de cana-de-açúcar.

 

 

Tendências da biotecnologia

Decio Luiz Gazzoni

As novas tendências em pesquisas, regulamentação e acompanhamento da movimentação internacional de produtos transgênicos mobilizaram os debates do último dia do V Seminário Latino-Americano de Produtos Transgênicos. O representante do comitê internacional de alimentos transgênicos, do International Life Sciences Institute, falou sobre os métodos de detecção de OGMs, na movimentação comercial entre os países. Os testes de detecção existem para confirmar os níveis de contenção de OGMs de acordo com a rotulagem exigida pelas agências regulatórias. A obrigatoriedade de rotulagem para os produtos OGM varia para cada país. No Canadá e dos Estados Unidos não há necessidade de rotulagem, enquanto nos demais países ela pode variar entre 0,5% e 5%. No Brasil há exigência de rotulagem para nível de OGM superior a 1%; na União Européia, acima de 0,9%, na Coréia do Sul, a partir de 3% e no Japão, com 5%.

 

Tendências

Durante o encontro houve uma palestra sobre a evolução das técnicas de cruzamentos genéticos, iniciados há milhares de anos, com o uso de organismos vivos para resolver problemas e criar produtos como o melhoramento de animais e plantas e a produção de pão e vinho, até os dias de hoje, quando a ciência está descobrindo a importância de se modular as rotas na modificação de genes, dentro do novo conceito de interferência do DNA recombinante (RNAi, em inglês). Em uma evolução de milhares de anos, ocorrem mudanças dramáticas nas plantas, tanto na quantidade de DNA quanto na plasticidade do seu genoma natural. O milho, devido à evolução, apresenta variedades com variações de até 42% na quantidade de genes, enquanto o trigo acabou adquirindo tolerância ao frio. As aplicações do novo conceito do RNAi na agricultura resultarão novas plantas resistentes a vírus e doenças, com amadurecimento controlável, com novos componentes nutricionais e óleos especiais. Com respeito à regulamentação de alimentos OGMs para consumo humano e animal na UE, a base legal está contida em apenas duas leis, a 18/2001 e a 1829/2003. Essa legislação está baseada em consensos internacionais (Codex/OECD) e está sendo seguida. Na Europa, as aprovações de alimentos para consumo humano e animal andam juntas, não havendo como se obter autorização para um fim e não para o outro. Além disso, os testes científicos devem ser providenciados pelas próprias empresas requerentes, seguindo depois para validação em laboratórios estatais de referência. Esta deve ser a nova tendência mundial.

 

Antioxidantes em brócolis

Décio Luiz Gazzoni

 

Uma revista científica dos EUA informa que cientistas da John Hopkins School of Medicine descobriram que o sulforafano, produzido pelo brócolis, aumenta a atividade da proteína NRF2, que é um potente antioxidante e componente de defesa dos pulmões contra inflamações. Os estudos mostraram que a substância protegeria as células dos danos causados pela doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), ocasionada pelo fumo. Esta doença engloba um conjunto de problemas pulmonares, entre eles a bronquite crônica e o enfisema. A proteína aciona vários mecanismos, os quais removem toxinas e poluentes que podem danificar as células pulmonares. A doença pulmonar obstrutiva crônica foi considerada a quinta mais letal do Brasil, segundo o Projeto Platino, que investigou a incidência da doença no Brasil em 2003. De acordo com este levantamento, a DPOC provoca cerca de 270 mil hospitalizações anualmente, e é causa crescente de morte no Brasil. O medo de ser acometido pela DPOC é uma das razões da queda abrupta na porcentagem de fumantes na população brasileira.

 

 

Pesquisa

O estudo envolveu amostras de tecido dos pulmões de fumantes infectados e não-infectados pela DPOC, determinando os níveis da proteína NRF2 nos dois grupos. Quando comparados com fumantes que não sofriam da doença crônica, os pacientes de DPOC em estágio avançado demonstraram níveis muito menores da proteína. Por isso, os pesquisadores acreditam que tratamentos direcionados a aumentar os níveis de NRF2 podem atenuar os efeitos do estresse oxidativo provocado pela DPOC nos pulmões. Aí entra o sulforafano, que é capaz de restaurar os níveis reduzidos do NRF2 nas células expostas à fumaça do cigarro, reduzindo as seqüelas e mesmo o óbito devido às complicações decorrentes do tabagismo.

 

Tratamento

Existiam antecedentes, pois pesquisas anteriores haviam demonstrado que o sulforafano encontrado no brócolis revertia os danos causados pela diabetes aos vasos sangüíneos do coração, por sua propriedade de potencializar antioxidantes. Com as conclusões deste estudo, a equipe já pensa em investigações futuras, buscando utilizar a interação entre o sulforafano e a NRF2 como uma nova estratégia para aumentar a proteção antioxidante nos pulmões e testar sua habilidade em melhorar a função pulmonar de pacientes com DPOC. Aí surge a oportunidade para os produtores, não apenas de brócolis, mas de qualquer alimento que contenha sulforafano ou outra substância sinérgica, que melhore a defesa do organismo contra radicais livres e oxidantes.

Energia de algas

Décio Luiz Gazzoni

 

As algas poderão se tornar a maior fonte para produção de biocombustíveis, no médio prazo. Por serem organismos extremamente simples, sua taxa de crescimento é muito alta, e o peso das algas no ambiente de cultivo pode duplicar várias vezes ao dia. Pelos estudos disponíveis, algumas espécies de algas podem gerar até 15 vezes mais óleo por hectare que as oleaginosas hoje utilizadas para produção de biodiesel, como soja, girassol, mamona ou dendê. Existem dezenas de milhares de espécies de algas, cada qual com suas características. Há espécies que são grandes produtoras de proteínas, outras de carboidratos e, finalmente, existem as que produzem óleos vegetais. A partir de carboidratos e óleos, é possível produzir biocombustíveis. Assim, um tipo de alga pode fornecer o óleo apropriado para o motor de um veículo, enquanto outra seria útil para aquecimento doméstico; e uma terceira pode ainda gerar o lipídio exato para impulsionar um avião. Há também a possibilidade de se utilizar as algas para outros fins, como a produção de os ácidos de Omega 3, importante substância componente de alimentos funcionais.

 

 

Ganho ambiental

Além de seu crescimento rápido, as algas podem ser cultivadas em água salgada, doce ou até mesmo contaminada, em pleno oceano ou em tanques, sem ocupar terras agricultáveis. Além disso, as algas podem ser aproveitadas para geração de biocombustíveis ao mesmo tempo em que seqüestram carbono. Um dos grandes benefícios ambientais é o maior crescimento das algas em ambientes com alta concentração de CO2 e matéria orgânica, como o esgoto. Ou então, pode-se produzir algas em tanques associados a usinas de álcool, retendo o gás carbônico da fermentação.

 

Negócios

Diversas universidades americanas, junto com institutos tecnológicos do USDA, estão desenvolvendo tecnologias para produzir biocombustíveis a partir de algas. As perspectivas são de tal maneira animadoras, que a empresa de investimentos Allied Minds, que trabalha com universidades para comercializar tecnologias em estágio inicial, juntou-se à Cattolico para formar a AXI, empresa que irá desenvolver a matéria-prima para os combustíveis de algas. A previsão é de que a tecnologia ganhe escala comercial dentro de 10 a 20 anos. Nesse período será necessário criar toda a infra-estrutura, que vai dos serviços especializados às usinas de processamento, além da busca por investimentos do mercado. E, obviamente, a estrutura de produção da matéria prima, mais uma oportunidade para o agronegócio.

 

Poupança de energia

Décio Luiz Gazzoni

Os atuais motores de carros, tratores e caminhões são energeticamente ineficientes, e ainda necessitam de desenvolvimento. Motores de ciclo Otto (gasolina e álcool) receberão tecnologias antes restritas ao ciclo Diesel. A mais promissora é o uso conjunto de injeção direta de combustível e turbocompressor, permitindo a diminuição de cilindrada, mantendo o desempenho e reduzindo o muito o consumo. As novidades incluem caixas de câmbio robotizadas de dupla embreagem, lubrificantes mais eficientes, materiais de menor atrito, recuperação de energia em freadas e sistema de liga-desliga o motor na intermitência do trânsito.  

Transição

Os carros híbridos – a combustão e elétrico – serão a ponte para a futura era do hidrogênio, o combustível mais limpo. No entanto, o preço de venda é maior e a economia no custo por quilômetro rodado não se torna tão interessante fora do trânsito urbano. Por exemplo, o pioneiro Toyota Prius acaba de completar um milhão de unidades vendidas, nos últimos 10 anos nos EUA, Japão e Europa. Híbridos também poderão, em breve, ter suas baterias de íons de lítio recarregadas na rede de energia elétrica.

 

Fronteira da ciência

Nanotecnologia, a ciência que estuda alterações em nível de átomos, promete pequenas revoluções em termos de peso, desempenho e durabilidade dos materiais. Outra aposta na área de motores é a convergência dos ciclos Otto e Diesel, como a eliminação da borboleta de aceleração e das velas de ignição - inexistentes em diesel - nos motores a gasolina ou flex. Os motores flex (álcool e gasolina) serão os mais beneficiados com a conjugação de injeção direta e turbocompressor.

 

Além do futuro

Porém o futuro pertence ao dueto hidrogênio e células de combustível. As células de combustível já conseguem, em laboratório, eficiência energética superior aos motores atuais, que já têm mais de 100 anos. As células podem utilizar qualquer substância altamente energética – etanol, por exemplo – para seu funcionamento. Já as pilhas a hidrogênio geram eletricidade a bordo, produzindo apenas vapor de água. Propulsão elétrica é vantajosa, porém a infra-estrutura de produção, armazenamento e distribuição do hidrogênio ainda exige tempo pelos altos custos envolvidos. Estima-se entre cinco e dez anos para que as pilhas estejam a bordo de veículos em escala comercial e em cidades com postos de abastecimento, ainda que em uma região limitada. O que não deve mudar é a tendência de, cada vez mais, os combustíveis fósseis serem substituídos por biocombustíveis.

 

Álcool de bagaço

Decio Luiz Gazzoni

  Seria inimaginável há uns 5 anos, mas o Brasil está exportando bagaço de cana. Está certo, são apenas algumas dezenas de toneladas, destinadas à pesquisa científica. O importador é a gigante do agronegócio, Du Pont, com sede nos EUA. E porque a Du Pont estaria importando bagaço de cana? Voltemos 500 dias no tempo. Em 1º. de fevereiro de 2007, o Presidente Bush, no discurso do Estado da Nação, perante o Congresso Americano, lançou Lei da Segurança e Independência Energética dos Estados Unidos. A lei prevê substituir até 20% da gasolina consumida nos EUA por biocombustíveis. Obviamente, tanto etanol não poderia sair do milho. Bush ressaltou a tecnologia para produzir etanol celulósico, uma parceria entre o governo e empresas privadas. Para mostrar que estava falando sério, no dia seguinte ele foi visitar os laboratórios da Du Pont, com fantástica cobertura da imprensa mundial. Portanto, o bagaço de cana exportado do Brasil, serve para os testes dos microrganismos transgênicos que a Du Pont está desenvolvendo em seus laboratórios, para extrair álcool do bagaço.  

 

Tecnologia

Existem diversos grupos de pesquisa apostando verdadeira corrida ao ouro, para ver quem chega primeiro ao mercado com uma tecnologia competitiva. A Du Pont acredita que seu diferencial é o esforço que está fazendo para desdobrar as pentoses –açúcares com 5 átomos de carbono – enquanto os demais concentram as ações nas hexoses, com 6 átomos de carbono. As pentoses são os tijolos que formam a hemi-celulose, enquanto a celulose é composta de hexoses. A vantagem das hexoses é que o caminho para sua transformação em etanol já é conhecido, posto que os atuais fermentos atuam sobre a glicose e a frutose resultantes da inversão da sacarose, transformando-as em álcool. Com as pentoses o caminho é mais difícil, porém a recompensa será de vários bilhões de dólares a mais, pois a conversão exclusiva da celulose para etanol redundaria em perda de parte da matéria prima.

 

Nova onda

Na segunda metade da próxima década, a tecnologia de etanol celulósico estará disponível comercialmente. Portanto, já é hora de pesquisar outros avanços. E a Du Pont aposta no biobutanol, que possui cerca de 50% mais energia que o etanol, por litro de combustível. Ou, dito de outra forma, um litro de biobutanol substituirá um litro e meio de etanol. Aí entraremos na segunda geração de biocombustíveis, abrindo enormes perspectivas para produção de matéria prima, seja cana ou qualquer vegetal que produza muita celulose e hemi-celulose por hectare.

 

Diesel vegetal

Décio Luiz Gazzoni

  A Votorantim Novos Negócios, a Usina Santa Elisa e a empresa norte-americana Amyris fecharam um acordo para produzir 400 milhões de litros de diesel vegetal no primeiro ano e chegar a 1 bilhão de litros, em 2012. Em termos de meta do programa de produção e uso de biodiesel no Brasil, significa, no primeiro ano, 35% da meta e, em 2012, em torno de 80% da meta. O petrodiesel é uma mistura complexa de moléculas orgânicas, obtidas pela destilação fracionada do petróleo e, como regra geral, se compõe em 75% de hidrocarbonetos saturados e 25% de hidrocarbonetos aromáticos, sendo o mais comum substâncias com fórmula C12H23. O diesel vegetal é muito similar a um dos componentes do petrodiesel, o farneceno, que é uma molécula com 12 átomos de carbono, apresentando as mesmas propriedades essenciais do diesel de petróleo, mas sem o "defeito" da presença do enxofre.  

 

Obtenção

O processo de obtenção do diesel vegetal é muito parecido com a produção de etanol, utilizando leveduras para fermentar os açúcares presentes na cana. A diferença está no fermento (Saccharomyces cerevisiae), que recebeu 15 genes de diferentes espécies, para modificar o produto resultante da fermentação. A tecnologia foi gerada nos laboratórios da Amyris na Califórnia, entretanto o desenvolvimento final será feito no Brasil, com a participação de cientistas brasileiros contratados pela empresa. A Amyris já tem um laboratório em Campinas - acoplado a uma usina-piloto - e planeja construir uma planta industrial junto à usina Santa Elisa, onde será feita a produção de diesel vegetal em larga escala.

 

Competitividade

A escolha do Brasil é fruto da alta competitividade da cana-de-açúcar brasileira, devido ao baixo custo de produção, o que permite antecipar que o diesel vegetal custaria, hoje, em torno de US$60,00 ao barril. As adaptações necessárias nas usinas para produzir diesel vegetal em vez de etanol são mínimas. De certo modo, basta trocar a levedura no fermentador. No futuro próximo, os usineiros poderão optar por produzir o que for mais vantajoso - álcool, diesel ou açúcar - com grande flexibilidade. Sem esquecer a bioeletricidade, que será gerada a partir do bagaço. O novo produto é anunciado como muito menos poluente que o petrodiesel, por ser livre de enxofre, além da característica de renovabilidade, como tal reduzindo as emissões de gases de efeito estufa. O plano de negócios prevê que o diesel vegetal entre no mercado como substituto do petrodiesel, apesar da produção inicial ser muito pequena.

 

Frango mapeado

Decio Luiz Gazzoni

Uma tese de doutorado de um pesquisador da Embrapa, desenvolvida na ESALQ identificou duas novas regiões no genoma do frango que contêm genes de interesse para a indústria avícola. Com o objetivo de compreender como as características de desempenho e de rendimento de carcaça de frangos de corte são controladas geneticamente, essas regiões foram identificadas a partir da associação entre a informação fenotípica (característica observada ou medida) e genotípica (mapeamento do DNA). Foram analisados 360 frangos, fornecidos pela Embrapa Suínos e Aves, selecionados para ter seus DNAs investigados por marcadores moleculares localizados nos cromossomos 1, 3 e 4, que representam 29% de todo o genoma da ave. Com dados em mãos, como medidas de desempenho e rendimento de carcaça dos frangos, os pesquisadores realizaram diversas análises utilizando conceitos de genética e estatística. Do total das 21 regiões mapeadas, foram definidas duas regiões do genoma do frango ainda não descritas na literatura, sendo uma associada ao ganho de peso e outra ao consumo de ração pelos animais. Para finalizar o estudo, resta definir quantos e quais genes são responsáveis por essas características.

 

Importância

O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de carne de frango (4,3 bilhões de aves por ano) e a ração representa 75% do custo de produção – em média, ao longo de 42 dias de criação, um frango consome 4,3kg de ração. Se, em conseqüência deste estudo, for possível diminuir um grama no consumo diário de cada ave, redundará em economia superior a 180 milhões de quilos de ração. Isto significa diminuir o custo de produção, porém também diminuirá a pressão por aumento das áreas de milho e soja. Além de mapear novas regiões dos cromossomos, o estudo deu outra importante contribuição à genômica avícola ao estudar a base da correlação genética entre as características dos animais avaliadas, ou seja, como elas se relacionam entre si, o que também poderá contribuir para o melhoramento genético dos animais. Apesar de as características de desempenho e de rendimento de carcaça apresentarem elevada correlação, em alguns casos essa correlação se deveu à ligação gênica, ou genes distintos localizados no mesmo cromossomo que controlam uma característica e, em outros casos, a genes que controlam, ao mesmo tempo, diversas características. Estudos como este fazem parte do programa de pesquisa em biotecnologia da Embrapa, com um potencial de alterar diversos paradigmas do agronegócio brasileiro.

 

Plástico verde

Décio Luiz Gazzoni

 

A partir de 2009, uma empresa brasileira deve ser a primeira no mundo a fazer plástico a partir da glicerina residual do biodiesel, substituindo o petróleo. A empresa desenvolveu tecnologia, e já registrou patente, da Bios, família de plásticos de polipropileno usado em embalagens e autopeças. Com o boom na produção de biocombustíveis no País, somente este ano haverá uma oferta extra de 105 mil toneladas de glicerina. Na produção de biodiesel, sobra um resíduo de 10% de glicerina, que pode ser usada nas indústrias de cosméticos ou de fármacos. Entretanto, a demanda desses setores não acolheria uma oferta tão elevada. Aí surgiu a oportunidade de fabricação de plástico, pois a previsão é produzir 250 mil toneladas de glicerina, considerando-se a legislação em vigor. Para cada tonelada de glicerina é possível fazer meia tonelada de propeno, o que significa uma elevada capacidade de absorção do resíduo do biodiesel.

 

 

Unidade industrial

A companhia, que terá uma unidade piloto em 2009, em Mauá (SP), planeja levar a produção em escala reduzida até 2011, quando pretende investir cerca de US$ 50 milhões na construção de uma fábrica para 100 mil tonelada ao ano de propeno verde, a matéria-prima da resinas de plástico. O enriquecimento para a transformação no polipropileno será feito nas outras unidades da empresa, distribuídas pelo país. Além da facilidade de matéria prima e de seu baixo custo, o diferencial do produto é sua característica "verde", que abre portas de mercados em países ricos. Na mesma linha, outra fonte de renda será o comércio de créditos de carbono, que em breve devem ser contabilizados pela empresa, pois a oleaginosa captura carbono da atmosfera e ele permanece no plástico até sua eliminação ou então reciclagem. O polipropileno de glicerina é 100% reciclado.

 

Mais verde

A filial brasileira da maior indústria química do Brasil e a maior petroquímica brasileira (e da América Latina), também anunciaram a produção de polietileno, outro plástico bruto tão demandado no mundo quanto o polipropileno, porém produzido a partir de álcool. Nos três casos, estima-se um sobrepreço que pode chegar a 50% no mercado internacional, devido ao uso de matéria prima renovável. O aspecto fundamental para estes avanços tecnológicos foram as pesquisas, sendo que, apenas no desenvolvimento da resina de glicerina vegetal, foram aportados R$ 2 milhões, em parceria com a FINEP e a UFRJ, que serão remuneradas através de roialties, um exemplo a ser seguido por outros empresários e institutos de pesquisa.

Aproveitando a biodiversidade

Décio Luiz Gazzoni

  Seguramente o leitor já ouviu falar que um dos patrimônios do Brasil é a sua enorme biodiversidade. A dúvida sempre é: mas como transformar este patrimônio em riqueza, bem estar, desenvolvimento, qualidade de vida? A incorporação de informações sobre biologia evolutiva nos estudos sobre biodiversidade é um caminho importante para que o avanço do conhecimento nessa área se traduza em políticas públicas de conservação e aproveitamento da biodiversidade. O simpósio "Biologia evolutiva e conservação da biodiversidade: aspectos científicos e sociais" realizado esta semana em São Paulo abordou esta temática. O principal objetivo do evento foi discutir formas inovadoras para aplicar, na solução de questões ambientais e sociais, os resultados das pesquisas em biologia evolutiva e biodiversidade. Geralmente, os inventários da biodiversidade são feitos ao acaso, mas a organização das informações e a captura de biodiversidade podem ser muito mais eficientes se utilizarmos as filogenias.  

 

Filogenia

A filogenia descreve a origem e a evolução das espécies. A idéia em voga no simpósio foi o desenvolvimento de ferramentas para navegar pela árvore da vida, utilizando o grande poder preditivo da filogenia para tornar esse conhecimento mais aplicável. O que os cientistas vislumbram, no final do ciclo, é a utilização da filogenia como base para desenvolver novos medicamentos e produtos. As empresas buscam novos medicamentos ao acaso, mas seria mais eficiente determinar quais são os nós da filogenia que incluem várias plantas aparentadas com potencial farmacológico e investigar aquele ponto específico da filogenia. Seria uma prospecção dirigida, feita com base científica, com menor custo e maior chance de sucesso.

 

Ganhos práticos.

Os cientistas buscam meios para utilizar a filogenia como base para encontrar melhores locais para a conservação da biodiversidade. Em vez de prospectar as áreas que têm número maior de espécies, é preferível escolher aquelas que tenham uma maior diversidade genética, com representantes de diferentes linhagens da árvore evolutiva. Isso é importante, porque se escolhermos apenas as áreas com grande número de espécies, é possível que estejamos pegando apenas um ramo da árvore filogenética. A vantagem para o agronegócio está no fato de que, uma vez identificada uma planta ou animal com potencial uso farmacológico ou na cosmetologia, é possível desenvolver um sistema de produção, para cultivo ou criação em larga escala, ampliando as oportunidades do negócio agrícola.

 

Bambu

Décio Luiz Gazzoni

 

Cientistas e empresários estão olhando para o bambu como uma nova oportunidade de produção de energia, fabricação de móveis e uso decorativo. Existem espécies com hábitos semelhantes a moitas, mais comportadas, e espécies selvagens que se propagam como mato, por rizomas, as quais servem muito bem em uma área selvagem mas não são uma boa idéia quando plantadas para delimitar um jardim ou quintal, porque podem invadir o terreno vizinho. Mas é exatamente esse vigor expansivo que está chamando a atenção. O bambu trabalha muito bem na retenção de dióxido de carbono e produção de oxigênio, é uma planta resistente que produz seus próprios compostos antibacterianos e pode prosperar sem pesticidas. E suas fibras porosas podem ser usadas na produção de um tecido poroso e suave como a seda. De fato, os fabricantes de tecidos do Japão e da China estão envolvidos em tamanha corrida por bambu que esse tecido recentemente desenvolvimento pode um dia competir com o algodão.

 

 

Desafios

No entanto, enquanto a demanda mundial aumenta cada vez mais, a oferta de bambu escasseia. Planta que em geral floresce apenas uma vez a cada 60 ou 120 anos e depois morre, sua propagação por meio de sementes é difícil. E cultivar bambu por enxertos de plantas existentes é notoriamente complicado. A solução encontrada pelos cientistas foi a sua multiplicação em laboratório, gerando mudas clonadas. O que complica a técnica é que o bambu possui tipos frágeis como a Fargesiae murieliae, dotada de folhagem verde ervilha que chora como a dos salgueiros, até plantas como a Phyllostachys edulis, cujas robustas hastes verde-oliva podem crescer 23 m em uma única temporada!

 

Usos

As fibras de bambu são recurso renovável para tecidos, comida, móveis e papel, além do uso ornamental. O bambu gera 35 t de madeira por hectare, ante 20 para o pinho, uma das maiores fontes de madeira para uso comercial nos Estados Unidos. Mais recentemente o seu uso energético foi aventado pelos cientistas. Devido à sua alta taxa de acumulação de biomassa, ao baixo custo de produção, e à baixa demanda de energia para seu cultivo, o bambu tem sido lembrado para produzir celulose para fabricação de etanol ou outros biocombustíveis, para uso em gaseificadores, ou simplesmente para combustão direta, gerando vapor, energia mecânica ou elétrica. Com a busca de matéria prima de alta eficiência para geração de agroenergia, pode estar surgindo uma grande oportunidade para os produtores rurais, plantando bambu para a geração de energia.

 

Vigor híbrido

Décio Luiz Gazzoni

  Há dois séculos sabemos que as plantas crescem mais e com maior vigor, devido ao vigor híbrido, ou heterose, inicialmente observado por Charles Darwin. Agora, cientistas americanos descobriram que o fenômeno se deve às mudanças nos relógios internos das plantas. Plantas híbridas, como o milho, crescem mais que os seus pais, porque muitos dos seus genes para a fotossíntese e metabolismo amido são mais ativos durante o dia. O mesmo é verdade para as plantas que são poliplóides, o que significa que eles têm dois ou mais conjuntos de cromossomos. Mais de 70% de todas as plantas floridas, incluindo importantes culturas agrícolas, como trigo, algodão, canola, cana e banana, são naturalmente poliplóides. O segredo está no aumento da expressão de genes envolvidos na fotossíntese e no metabolismo do amido de híbridos poliplóides. Os híbridos e poliplóides exibiram aumento da fotossíntese, alta quantidade de amido e maior acúmulo de clorofila em relação aos seus pais, os quais levaram ao seu crescimento maior. Os pesquisadores descobriram que estes genes foram expressos em níveis elevados durante o dia, comparativamente ao que acontecia com seus pais.  

 

Pesquisa

As descobertas ocorreram em estudos conduzidos com Arabidopsis, uma planta modelo na biotecnologia. A equipe de pesquisa descobriu uma conexão direta entre as substâncias que regulam o ritmo circadiano, o crescimento e o vigor em plantas híbridos e poliplóides. O ritmo circadiano é um ciclo de 24 horas nos processos fisiológicos, bioquímicos e comportamentais das plantas ou animais. Alguns destes reguladores, conhecido como repressores transcricionais – que restringem a atuação de alguns genes - foram fortemente reprimidos durante o dia, nos híbridos e poliplóides, resultando no aumento na fotossíntese e conseqüente acúmulo de amido.

 

Tecnologia

Uma vez descobertos os genes envolvidos e estabelecida a relação com o maior vigor, é possível desenvolver ferramentas biotecnológicas para gerar híbridos e poliplóides com maior capacidade produtiva, mais biomassa e mais nutrientes. Será possível rastrear o genoma das plantas, procurando por genes ou combinações deles, que possam maximizar o vigor híbrido. Muitos dos poliplóides, como o trigo e algodão, são conhecidos como alopoliplóides, formados a partir de duas ou mais espécies diferentes. A pesquisa mostrou que o fenômeno observado com os híbridos também pode ser induzido em poliplóides e alopoliplóides, abrindo ainda mais o arco de aproveitamento da tecnologia.

 

Subsídios agrícolas

Decio Luiz Gazzoni

O Brasil dobrou a concessão de subsídios ao setor agrícola no triênio 2005-2007, comparativamente a 2002 e 2004. É o que mostra o relatório sobre a agricultura brasileira preparado pela OCDE. Em parte, o aumento serviu para atenuar o crônico endividamento dos produtores rurais do país. Mas ainda assim o volume de ajuda é pouco significativo, considerando-se as subvenções bilionárias concedidas pelos países industrializados a seus agricultores. A agricultura brasileira cresceu rapidamente entre 2002 e 2007 e não cessa de inquietar os concorrentes. Pelos dados da OCDE, o setor representa 28% das exportações e apenas 5% das importações brasileiras, sendo responsável por 97% do saldo da balança comercial consolidada brasileira. O que assusta os países ricos é que a área total para agricultura cresceu apenas 0,4% entre 1995 e 2006, mas a produção aumentou 84%. A área de pastagens caiu 3%, para 172 milhões de hectares. No mesmo período, o número de agricultores cresceu de 4,8 milhões para 5,2 milhões, levando a uma redução no tamanho médio das propriedades de 72 para 68 hectares, sempre conforme a OCDE.  

Em estudo para examinar até que ponto a produção agrícola seria subsidiada no país, a OCDE frustrou americanos e europeus ao constatar, em 2005, que o volume da ajuda governamental representou apenas 3% do valor da produção agrícola no triênio 2002-2004 - ante 37% na União Européia e 17% nos EUA. As subvenções pularam para 6% do valor da produção entre 2005 e 2007, bem abaixo da média de 26% dos países da OCDE. O Apoio Total Estimado (TSE, em inglês) para a agricultura no Brasil passou de uma média anual R$ 7,9 bilhões entre 2002 e 2004 para R$ 14,7 bilhões entre 2005 e 2007. Representou, no triênio mais recente, 0,6% do PIB. O TSE nos países ricos fica próximo dos US$ 300 bilhões, ou 1% do PIB. Os produtos que recebem mais ajuda governamental são arroz, algodão, milho e trigo, com sua parte no total da ajuda passando de 46%, em 2005, para 61% no ano passado. O custo dos subsídios agrícolas para os consumidores brasileiros permanece estável. A transferência dos consumidores para o setor, mensurada quando estes pagam mais que os preços mundiais, foi de R$ 3,8 bilhões em 2007. A transferência a partir dos contribuintes (Tesouro) foi de R$ 9,7 bilhões. 'O Brasil fornece um nível relativamente baixo de apoio e proteção à agricultura, refletindo sua posição como exportador competitivo e com política comercial relativamente aberta', afirma a OCDE. Melhor prá nós!

 

Mais sobre subsídios

Décio Luiz Gazzoni

Na coluna da semana passada comentei sobre os subsídios que os agricultores brasileiros recebem. Leitores me pedem para detalhar para onde foram estes subsídios. Obviamente que qualquer análise depende do ponto de vista do observador e do interesse direto que ele tem no resultado final da análise. Transcrevi os dados e as observações da OCDE porque eles estão passando a nossa agricultura na peneira fina, com o objetivo de encontrar qualquer coisa que possa servir para criar barreiras comerciais aos nossos produtos. Mas, mesmo com este possível viés de análise por parte da OCDE, o relatório produzido pela organização nos é amplamente favorável, pois a conclusão final – que é o que importa – diz que 'O Brasil fornece relativamente um baixo nível de apoio e proteção à agricultura, refletindo sua posição como exportador competitivo e com política comercial relativamente aberta'.  

Para onde vão?

Entre as medidas de apoio adotadas pelo governo brasileiro, a OCDE destaca a alta do crédito subsidiado disponível para os agricultores. O financiamento pelo Sistema Nacional de Crédito Rural subiu para R$ 50 bilhões, ou 25% da produção agrícola total. Com a queda na taxa básica de juros do Banco Central, a margem de preferência para os agricultores também diminuiu. A OCDE também vê crédito subsidiado nas sucessivas rolagens das dividas do setor. Calcula que um terço da divida total de R$ 88 bilhões do setor era de produtores que tinham deixado de honrar os pagamentos do crédito agrícola. Para o órgão, os pacotes de alivio beneficiam os produtores rurais no curto prazo, mas desencorajam o desenvolvimento de um mercado de crédito que funcione corretamente. A situação brasileira não é isolada, pois a China, Índia, África do Sul e outros emergentes também estão ajudando seus agricultores endividados. Os países desenvolvidos tampouco poderão reclamar, até porque na crise financeira atual, também voltaram a dar subvenções também ao setor industrial, com impacto na concorrência no mercado global. A entidade avalia que a extensão do programa brasileiro de seguro rural, se bem sucedida, reduzirá a necessidade de intervenção do governo no longo prazo. Estima que o Brasil avance na integração de produtores pequenos e de subsistência. Mas levanta duvidas sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por causa do impacto da crise financeira. Alerta, em todo caso, que investimentos em infra-estrutura são essenciais para a agricultura brasileira continuar a crescer.

 

Cerveja anti-cancerígena

Décio Luiz Gazzoni

Se hoje fosse 1º. de abril, o leitor poderia desconfiar. Mas como é Natal, acredite que guardei a boa notícia (elas são tão raras!) como meu presente de Papai Noel àqueles que, como eu, gostam de cerveja, mas se preocupam com a saúde. A nova cerveja desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Rice, no Texas, pode não ser o caminho para conseguir o alvará da patroa porém, se cumprir o que promete, terá o aval de seu médico. Tudo começou como uma brincadeira de estudantes universitários que buscavam desculpas originais para dedicar-se ao halterocopismo. Passaram a divulgar no ambiente universitário que estavam desenvolvendo uma cerveja com capacidade de reduzir o risco de desenvolvimento de tumores malignos – algo como um antídoto para o cigarro, que promove diversos tipos de câncer. Só que a brincadeira virou cobrança e alguns dos estudantes de bioquímica, decidiram levar avante o projeto. O mote para o salto tecnológico foi um concurso universitário para idéias inovativas, envolvendo a biotecnologia.  

Resveratrol

O segredo estava em produzir uma cerveja que, efetivamente contivesse uma substância com as propriedades que eles alardeavam. Foram buscar inspiração no paradoxo francês, que explica porque os povos mediterrâneos tem uma dieta com alto teor de gorduras, principalmente manteiga e azeite de oliva, porém as taxas de acidentes cardiovasculares são muito baixas - entre outras razões porque o teor de LDL colesterol é muito baixo. Acontece que estes povos tem o hábito de alto consumo de vinho, com predileção para o tinto. A explicação da medicina aponta para a presença do resveratrol no vinho, especialmente nos tintos, o que protege o organismo dos efeitos maléficos da gordura. Os cientistas da Universidade de Rice estão trabalhando para modificar o fermento com dois conjuntos de genes, incluindo um que permitirá à levedura metabolizar açúcares e produzir um intermediário químico. O segundo grupo irá converter este intermediário para resveratrol. Em teoria isto é possível. Se a pesquisa resultar em uma cerveja com alto teor de resveratrol, deverá gerar um grande volume de negócios, pois, em 2007, os americanos consumiram 20,5 litros de cerveja per capita, mas apenas 2,5 litros de vinho tinto. Bem, só há uma má notícia, que vocês já perceberam: a cerveja ainda não está pronta, no sentido de que não é um produto comercial. Talvez no Natal de 2010 os americanos possam saudar o Papai Noel com uma cerveja mais saudável. Até lá, Feliz Natal de 2008.

 

E agora, José?

Décio Luiz Gazzoni

Em fevereiro de 2008, iniciei minha coluna em uma revista mensal, para a qual colaboro, dizendo: "...Quer me parecer que desejar Feliz Ano Novo aos produtores agrícolas e outros players do agronegócio parece pouco. Melhor já adiantar um Feliz próximos 5 anos, uma vez que, do meu ponto de observação, parece-me que, como nunca antes na História da Humanidade, o agronegócio viverá um ciclo de exuberância e de expansão como o que vamos experimentar". Mas encerrei alertando: "Existe apenas um risco para esta previsão: uma brutal recessão em escala planetária, que enxugue a liquidez do mercado, reduza a renda das famílias (em especial a previsão de renda futura) e torne os mercados mais fechados e protecionistas."  

Diz o ditado que "o diabo não é diabo porque é diabo mas sim porque é velho". Foram os meus (quase) 60 anos que fizeram com que eu antevisse, em janeiro, algo que àquele momento, ninguém imaginava como provável, que é a tremenda crise financeira que estamos atravessando, a qual empobreceu o mundo em estimados US$ 30 trilhões (redução de liquidez), ameaçando o emprego, logo a previsão de renda futura das famílias, diminuindo o consumo de produtos agrícolas e arriscando tornar os mercados mais fechados e protecionistas.

 

 

Para 2009, o comportamento dos preços agrícolas dependerá de: a) continuação do processo de inserção social, que levou cerca de 500 milhões de asiáticos e africanos a sair da linha da fome e entrar no mercado de alimentos; b) o comportamento dos estoques finais, atualmente em níveis extremamente baixos; c) as modificações no custo de produção, especialmente o preço dos fertilizantes, que disparou nos últimos dois anos; d) a evolução do custo dos fretes agrícolas, que subiu 400% em 3 anos; e) a cotação do câmbio real/dólar; f) o protecionismo dos países ricos e os seus subsídios agrícolas; g) o comportamento do clima. Em resumo, o fator especulação desaparece do cenário. Os fatores baixistas mais importantes passam a ser a recessão, o desemprego e o protecionismo dos países ricos. Os fatores altistas são os baixos estoques, a valorização do dólar e a queda do preço do petróleo. Os fatores de estabilização são os altos custos de produção, os fretes elevados, e as importações da China. E o fator imponderável será o comportamento do clima. Não há mais clima para desejar Feliz próximos 5 anos, apenas augurar que 2009 seja o melhor possível.

 

 

Biobutanol

Decio Luiz Gazzoni

O etanol, ou álcool combustível, tem seus dias contados. Ou melhor, seus anos contados. A partir da cana de açúcar é possível produzir outros biocombustíveis, com vantagens sobre o etanol. Um destes biocombustíveis é o biobutanol um álcool com quatro carbonos ( C4H8OH - o etanol tem fórmula C2H5OH). O biobutanol pode ser transportado em gasodutos existentes, é menos corrosivo e menos propenso à contaminação da água, pode ser misturado com gasolina ou utilizado isoladamente em motores de combustão interna, e possui mais energia por litro que o etanol – sua principal vantagem. O butanol possui poder calorífico de 7893 kcal/kg, cerca de 15% a mais que o etanol o que, na prática, significa poupar 12% do combustível, em relação ao etanol. Nos EUA e na Europa, a produção de biobutanol já desperta interesse comercial. Na Europa, existe uma fábrica para produção de biobutanol de beterraba. Os cientistas americanos estão desenvolvendo tecnologia de produção de biobutanol a partir de resíduos agrícolas. Principalmente, estão de olho na palha de cereais (trigo, cevada, milho) devido à sua abundância e baixo custo, além de forrageiras de elevada capacidade de produção de biomassa.  

O processo industrial

Os cientistas estão estudando espécies de bactérias do gênero Clostridium, para realizar a fermentação dos açúcares para biobutanol. Mas antes de a bactéria executar esse trabalho, a palha deve ser pré-tratada e hidrolisada. A hidrólise utiliza enzimas para separar a celulose e a hemicelulose. Isto liberta os açúcares simples de modo que a bactéria pode fermentar-los em três produtos: acetona, etanol e butanol, produzido em maior quantidade. Normalmente, os quatro passos preparatórios (tratamento prévio, hidrólise, fermentação e recuperação) são realizados separadamente e seqüencialmente. Mas, pesquisadores conseguiram juntar duas etapas em uma. Após a palha de trigo ser pré diluída com ácido sulfúrico, ela é fermentada em um biorreator contendo três diferentes enzimas e uma cultura de Clostridium beijerinckii. Desta forma, as enzimas e as bactérias atuam simultaneamente, reduzindo o custo industrial. Tão logo as enzimas hidrolisam a palha e liberam os açúcares, as bactérias iniciam a fermentação. Ao final, o etanol e a acetona são retirados, purificando o biobutanol. O rendimento industrial é de 379 litros de biobutanol por tonelada de palha. No Brasil tanto poderemos produzir o butanol do caldo, bagaço ou palha de cana, quanto de palha de cereais ou forrageiras.

 

Sorgo para solos ácidos

Décio Luiz Gazzoni

Os solos ácidos, existentes em todas as regiões do mundo, normalmente apresentam teores de alumínio que são tóxicos para as plantas cultivadas. Nesta condição de cultivo, a produtividade decresce bruscamente. No limite, as plantas mais sensíveis não conseguem desenvolver-se. Há duas soluções para o problema: ou o solo é corrigido, com o uso de calcário, ou são desenvolvidas plantas tolerantes ao alumínio tóxico, que apresentem alta produtividade em solos ácidos. Embora a calagem seja uma prática simples, significa um custo adicional para o agricultor, ao passo que o material genético resistente elimina a necessidade de calagem. Um trabalho conjunto entre a Embrapa e o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos mostrou que a tolerância ao alumínio no trigo é regulada pelo gene ALTM1 (Aluminun tolerance gene). Quando este gene é ativado, ocorre a liberação de ácido málico, o qual se liga com o alumínio, formando sais inertes e neutralizando seu efeito tóxico sobre as plantas.  

Novo gene

Os mesmos pesquisadores identificaram um gene no sorgo, que protege a planta do alumínio tóxico, de uma maneira similar à ação do ALTM1. No sorgo, o gene comanda a liberação de ácido cítrico, que age da mesma forma que o málico. A grande diferença entre o milho e o sorgo está na proteína transportadora do ácido, denominada SbMATE. Descobriu-se que, no caso do sorgo, esta proteína não está diretamente vinculada a ação do gene ALTM1. A ação desta proteína é ativada nas raízes das cultivares resistentes somente quando o alumínio tóxico está presente no solo, e expressada no primeiro centímetro da ponta das raízes. Este fato poupa energia, protege a ponta da raiz e otimiza a ação de neutralização do alumínio. Outro detalhe interessante é que a habilidade da planta de sorgo para tolerar ao alumínio tóxico aumenta com o tempo de exposição à situação de estresse. Os pesquisadores verificaram que com o aumento do tempo de exposição, havia maior liberação de ácidos orgânicos e maior produção da proteína transportadora (SbMATE). A grande inovação está no fato de que esta proteína é regulada por seu próprio gene, diferente do ALTM1, levando à identificação de um novo caminho para introdução de resistência genética ao alumínio tóxico. Tanto a Embrapa quanto o USDA, em cooperação com organismos internacionais, estão desenvolvendo novas cultivares de sorgo, incorporando este gene de tolerância ao alumínio, permitindo o seu cultivo em solos ácidos, com alta produtividade.

 

O efeito da seca

Decio Luiz Gazzoni

Parece que o desastre já está contratado: se o clima daqui para frente correr bem, a perda da produção agrícola nacional já é de 8%, por conta da seca que atingiu diversos partes do território, em especial no eixo Paraná - Rio Grande do Sul. Estamos falando de alguma coisa como 10milhões de toneladas que, a um preço médio de US$150/ton, significa menos US$1,5 bi (+-R$3,5 bi), na porteira da fazenda. Considerando que, em média, um real na porteira significa outros quatro ao longo da cadeia, a seca já nos empobreceu em R$14 bi, se as coisas ficarem como estão. Em termos políticos, significa que, ao invés de um novo recorde, estamos movendo as patas do caranguejo para 2006, posto que a nova expectativa de produção de grãos seria pouco superior a 130 milhões de toneladas. O Paraná acumula perdas de 40% no feijão e 37% no milho. Isto não deve significar aumento de preços ao consumidor brasileiro, vez que a crise financeira mundial está se encarregando de refluir o ímpeto de importação de alimentos de alguns países, devendo, apenas, manter estáveis os preços atuais. Porém, para os produtores a coisa ficará um pouco mais preta do que já está, encavalando dívidas novas sobre as antigas, o que exige muita sensibilidade dos escalões governamentais para evitar sobrecarga financeira aos produtores e, em especial, ativar, com urgência, mecanismos de comercialização da safra, para impedir que a produção colhida em janeiro-março seja vendida na bacia das almas, por falta de crédito de comercialização.  

Tecnologia

Há outro fator que pode significar uma redução adicional de produção, e que diz respeito ao plantio muito antecipado de soja, usando cultivares de ciclo curto, para viabilizar a safrinha de milho. Igualmente, a estiagem de novembro forçou o plantio das mesmas cultivares de ciclo curto fora da época ideal, reduzindo ainda mais a produtividade. A busca por cultivares de ciclo curto foi tão intensa, que relegou a segundo plano cultivares transgênicas (normalmente de ciclo médio), aumentando também o custo de produção. Os dois fatos associados ( seca e ciclo de cultivares) traz novamente à tona um assunto que tenho insistido: o desenvolvimento de cultivares ou variedades de grãos (soja, milho, trigo, arroz, feijão, etc) tolerantes à seca é uma das necessidades mais urgentes e deve ser considerada uma prioridade máxima dos institutos de pesquisa, sob pena de perenizarmos as perdas por seca, em virtude do clima caótico, por conta das mudanças climáticas globais.

 

Novo desafio

Décio Luiz Gazzoni

Há um ano tomei a decisão de aposentar-me da Embrapa. Não para vestir o pijama, mas para buscar alternativas profissionais, que não me exigissem tanta energia quanto despendi nos 35 anos de carreira na Embrapa. Julgava já haver passado por muitos reptos e que não haveria nada mais de desafiador ou instigante que pudesse superar o que já havia enfrentado. Afinal, além do Brasil, atuei em, praticamente, toda a América Latina e países do Caribe, reformulando órgãos de Sanidade Agropecuária, Pesquisa Agropecuária ou Extensão Rural e recriando Ministérios da Agricultura em bases modernas. Nos últimos anos, tenho atuado no Painel Científico Internacional de Energia Renovável, uma parceria de instituições internacionais, lideradas pelo International Council of Science que, em tradução livre, seria a Academia Internacional de Ciências.

 

Brasil

Mas o destino pregou uma peça e reservou mais um desafio, que tem tudo para ser o definitivo. O presidente Lula encomendou à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República uma análise estratégica do agronegócio brasileiro, no médio e longo prazos. Em especial, solicitou identificar onde o Governo está impedindo a expressão do potencial do agronegócio, e onde ele poderá ser um parceiro para alavancar este potencial. Além da análise, o presidente deseja propostas concretas de políticas públicas que eliminem, sempre que possível, os entraves identificados, e que permitam ao Governo auxiliar o agronegócio a realizar seu potencial. Ao receber esta determinação, o Ministro-chefe da SAE, Roberto Mangabeira Unger convidou-me para uma conversa sobre o tema. Ao final da conversa recebi o repto de desempenhar esta missão.

 

Futuro

Essa provocação não estava nos meus planos e tomou-me algum tempo de reflexão. Ao final decidi aceitar, porque entendi que este é o maior de todos os desafios que já enfrentei e será extremamente instigante poder mapear o agronegócio brasileiro do futuro, sobre os panos de fundo doméstico e internacional, identificando os gargalos e os pontos de alavancagem e propondo medidas legais para sanar os gargalos e viabilizar os apoios. Portanto, a partir desta semana – e pelos próximos dois anos - trabalharei na Presidência da República, esperando poder contribuir para que o Brasil seja, no futuro, aquilo que sempre ouvi no passado: o celeiro do mundo. A aposentadoria? Troquei um projeto pessoal por um projeto institucional, dentro de um projeto nacional. Ela terá que aguardar!

 

Até tu, Cuba?

Décio Luiz Gazzoni

Esquerdistas de diversos matizes ficarão ainda mais órfãos, a qualquer momento. O Governo de Cuba autorizará, brevemente, o primeiro plantio de milho OGM, uma verdadeira heresia até poucas semanas. Cai mais um argumento dogmático, muito utilizado pelo MST e similares, de que variedades transgênicas significam a exploração dos campesinos pelo capital sem pátria e pelas multinacionais sem coração, movidas exclusivamente a lucro. O Diretor do Instituto de Engenharia Genética e Biotecnologia do Governo de Cuba, Carlos Borroto, foi o porta voz da notícia. O primeiro plantio autorizado será de 50 ha, destinados à produção de sementes, o que permitirá cultivar, na próxima safra, 6.000ha de milho transgênico. Borroto foi taxativo ao afirmar que as duas alternativas eram: i) utilizar cultivares transgênicas para aumentar a produção e reduzir os custos; ii) depender cada vez mais de importações.  

Déficit alimentar

Aí está a chave da questão, para quem deseja entender as razões desta guinada, que está em linha com diversas mudanças de cunho nitidamente capitalista, empreendidas na ilha nos últimos dois anos. Cuba, desde a ascensão de Fidel Castro, sempre dependeu de recursos externos (dinheiro, energia, alimentos) para se manter, apesar da enorme pobreza de seu povo. Inicialmente, estes recursos eram providos pela União Soviética, o que era um grande negócio para ambas as partes. Cuba recebia bilhões de dólares anuais, para investir em alimentação, saúde, esportes e cultura. E a União Soviética pagava barato por uma enorme propaganda encravada ao sul de seu maior inimigo, os EUA. Com a derrocada da União Soviética, Cuba empobreceu muito rapidamente, pois os recursos minguaram, e o povo foi obrigado a apertar o cinto, não apenas literalmente, mas porque a comida foi muito racionada. Até que o companheiro Chávez resolveu retomar o projeto soviético e passou a injetar bilhões de dólares em Cuba. Cuba importa 60% de sua comida, incluindo soja, milho e trigo, importados dos EUA, que drenam 2 bilhões de dólares anuais doados por Chávez. Para piorar, a safra cubana deste ano foi reduzida em 30%, por diversas razões. Este fato, juntamente com a queda do preço do petróleo - que deixou o companheiro Chávez sem folga financeira para seus arroubos geo-esmoleiro-políticos - obrigou o Governo cubano a encarar a realidade e alinhar-se com 23 países grandes produtores agrícolas que, somente em 2007, incorporaram 12 milhões de hectares aos 102 milhões anteriormente cultivados com OGMs.

 

Fórum de Governadores

Décio Luiz Gazzoni

Nos dias 12 e 13 de fevereiro participei do Fórum de Governadores da Amazônia Legal (AM, AC, AP, MA, MT, PA, RO, RR, TO), realizado em Boa Vista. A pauta foi dominada por temas ligados ao agronegócio regional. O assunto mais cadente foi a Medida Provisória 458, que trata da regularização fundiária na Amazônia. Outros temas também constaram da pauta, como a recuperação de áreas degradadas, especialmente de pastagens; o apoio ao extrativismo; o aproveitamento sustentável da biodiversidade amazônica; a infra-estrutura de transportes regionais, seja transporte aéreo, hidroviário ou estradas vicinais; as oportunidades regionais no mercado de carbono; a regularização do passivo ambiental, entre outros assuntos que possuem interface com o agronegócio regional.

 

MP 458

A regularização fundiária é uma reivindicação histórica da região Amazônica. No âmbito do Plano Amazônia Sustentável (PAS), o Ministro Mangabeira Unger considerou sine qua non a regularização fundiária como base para a implementação de qualquer plano de desenvolvimento regional. O PAS não é um plano operacional, mas sim, estratégico contendo as diretrizes gerais e as recomendações para sua implementação. As ações operacionais serão planos sub-regionais, alguns já elaborados ou em processo de elaboração, como o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável para a Área de Influência da Rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), o Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável para o Arquipélago do Marajó e o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu. Com a edição da MP, fica aberto o caminho para a titulação expedita e posse legal de terras na Amazônia, permitindo ordenar o crescimento sustentável do agronegócio, resolvendo o tema do passivo ambiental.

 

Áreas degradadas

Sob este pano de fundo se situa o projeto de recuperação de áreas degradadas, que só avançará quando for clarificada a situação da posse da terra agrícola. Trata-se de um projeto prioritário da Secretaria de Assuntos Estratégicos, com o duplo objetivo de eliminar a pressão por desmatamento da floresta e atender a demanda por maior produção de alimentos no país. As áreas degradadas, via de regra, se constituem de terras na fronteira agrícola, normalmente áreas públicas griladas ou de posse contestada, que serviu à agropecuária predatória e itinerante. Em um esforço integrado com os Ministérios da Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Agropecuário, pretende-se incorporar estas áreas à produção agrícola, em bases sustentáveis, já no médio prazo.

 

Código Florestal

Décio Luiz Gazzoni

  A pauta do dia, em Brasília, é a reforma do Código Florestal. Nos interessa discutir as atribuições legais impostas aos produtores rurais. A lei atual estabelece a manutenção da reserva legal (RL) e das áreas de preservação permanente (APP). da propriedade rural. Na Amazônia Legal a RL varia de 35% (cerrado) a 80% (bioma amazônico). No restante do país a RL deve ocupar 20% da propriedade. Estas exigências legais têm preocupado os produtores, especialmente a partir do final do século passado, quando a Justiça determinou a averbação da RL em cartório. O aumento da fiscalização, a recente regulamentação das leis de crimes ambientais e a popularização do uso de ferramentas de georreferenciamento resultaram em pressões para modificar o Código Florestal, que já possui 45 anos e se encontra defasado da realidade ambiental e econômica brasileira.  

 

Fora da Amazônia

Uma das razões da reforma é solucionar o passivo ambiental acumulado há décadas. Em especial no Sul, Sudeste e Centro-Oeste não há como atender às exigências atuais, sem causar sérios problemas econômicos e sociais. Uma das propostas em voga é compensar o passivo da RL fora da propriedade. Alternativamente, propõe-se incorporar as APPs, como matas ciliares, dentro da RL. A questão central é a dificuldade de recuperar APPs de morro que há anos foram incorporadas à agricultura ou pecuária. A compensação de RL fora da propriedade, somente faz sentido se ocorrer em áreas marginais, de baixo valor, e, ainda assim, se houver incentivo governamental. Como existem diferentes situações, em diferentes estados, está difícil encontrar uma solução para esta região.

 

Amazônia

De acordo com a legislação em vigor, usar terras na Amazônia para fins agropecuários é muito complicado. Em parte devido há exigência de 80% de RL. Adicionalmente, porque são inúmeras as unidades de conservação implantadas. Discutindo este tema na Amazônia verifica-se que, devido à obrigação de proteção de 80% da propriedade, os produtores são transformados em prestadores de serviços ambientais sem contrapartidas financeiras. Assim, a única renda de um produtor deve sair dos 20% que podem ser dedicados à produção. Como politicamente é impossível reduzir a RL abaixo de 80%, a solução proposta é o pagamento dos serviços ambientais pela sociedade brasileira. A falta de regularização ambiental impede o produtor de receber crédito agrícola e poderá bombardear o programa de recuperação de áreas degradadas, que está sendo lançado este ano.

 

Carga tributária

Décio Luiz Gazzoni

  Isto não interessa apenas ao setor do agronegócio, mas à sociedade em geral. A pressão tributária em relação ao PIB do Brasil bateu novo recorde em 2008, atingindo 36,54%. O valor foi estabelecido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, considerando os números extra-oficiais da arrecadação tributária, que atingiu R$ 1,056 trilhão para um PIB estimado em R$ 2,890 trilhões. Em relação a 2007, houve um aumento de 1%, sendo de 0,52% para os tributos federais, 0,35% para os estaduais e 0,13% para os municipais. O crescimento da pressão tributária é contínuo, desde 2004, que, em 2003, era de 32,54%. Ou seja, nos últimos 4 anos a carga de impostos aumentou 4% - ou, visto de outra forma, a renda da população diminuiu 4%! Com isto o Brasil se consolida como parte do seleto grupo dos países de mais alta tributação do mundo, na honrosa companhia de Noruega, Suécia, Bélgica e Dinamarca.  

 

Serviços

A diferença entre o Brasil e os demais países de alta taxação é que lá os tributos retornam em serviços de educação e saúde de primeira linha e gratuitos. O transporte público é rápido, limpo e eficiente. Aqui, o presidente do IBPT afirmou que "o governo avança cada vez mais na riqueza nacional, sem que isso revele efetivamente um aumento substancial da qualidade do serviço público", conforme publicou a Folha de São Paulo. Ou seja, pagamos impostos e também pagamos, novamente, pela educação, saúde, segurança e transporte privado, vez que os serviços governamentais não nos atendem. Sem contar que, nas mãos do Governo, recursos financeiros geram muito menos empregos que na iniciativa privada.

 

Sinal de mudança

A capacidade de pagamento de tributos, por parte da sociedade, está se esgotando. Tanto que, para 2009, o IBPT prevê redução na arrecadação tributária. Segundo ele, no plano municipal já se nota a redução da arrecadação do IPTU, porque, nos tempos de crescimento se mantinham os tributos em dia e ainda se pagava parte dos tributos em atraso. Com as incertezas do mercado e a dificuldade no crédito, "o contribuinte pensa que é melhor segurar o dinheiro e deixar o tributo para depois, pois sempre vem uma anistia. Pode parecer difícil depois de tantos anos de aumento da carga tributária, mas, em 2009 pode haver uma leve redução na arrecadação, pelas dificuldades econômicas dos contribuintes, pessoas físicas ou jurídicas. Poderíamos aproveitar este momento de reversão para uma profunda reflexão sobre a urgente necessidade de uma radical tributária em nosso país.

 

Energia Renovável

Décio Luiz Gazzoni

Escrevo da Cidade do México, onde participo de dois eventos: da reunião anual do International Council of Science, ao qual pertenço, e da Conferencia Regional da Unesco, agência da ONU para a educação, a ciência e a cultura. Fui convidado para apresentar uma Conferencia sobre propostas de prioridades de pesquisa, desenvolvimento e inovação em energia renovável, no futuro próximo, no âmbito das Américas. Parto da premissa de que, por conta do esgotamento das fontes fósseis, da geopolítica do petróleo e gás e das mudanças climáticas globais causadas por emissões de gases de efeito estufa – em grande parte decorrente da utilização de fontes fósseis de energia – será inevitável uma escalada na participação de fontes de energia renovável na matriz energética mundial e, obviamente, de cada país em particular. Com orgulho, destaco que o Brasil possui condições ímpares (oferta de área agricultável, clima adequado, tecnologia adequada, cadeias organizadas, experiência setorial, grande mercado interno) para, progressivamente, proceder à substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis, de forma agressiva, além de atuar pró-ativamente na formatação de um grande mercado internacional de biocombustíveis, tornando-se o líder deste mercado.

 

Sol e vento

Porém nem só de agroenergia viverão os povos da América, pois outras fontes serão importantes. A hidroeletricidade, que vive momentos de glória com as mega-usinas, sofrerá uma mudança de paradigma e passará a depender de pequenas centrais hidroelétricas. Em parte, porque o impacto ambiental das grandes hidroelétricas que ainda podem ser construídas já é considerado inaceitável. E porque este potencial está longe dos centros de consumo, incorrendo em altos custos de transmissão e perdas de carga no transporte. Nossos países, por estarem precipuamente na faixa tropical, dispõem de muita radiação solar, que pode ser aproveitada para gerar energia elétrica ou térmica. Também dispomos de condições favoráveis para construir fazendas eólicas, gerando energia elétrica a partir das turbinas movidas pelo vento. Sem contar o potencial geotérmico, da energia das marés ou das ondas. Impossível relatar neste espaço o conjunto de prioridades de pesquisa que elenquei na Conferência - que necessita de pesados investimentos - mas tenha certeza o leitor que a proposta apresentada é muito bem fundamentada e aponta para a construção de um futuro pós 2050 em que acredito que viraremos o jogo, consumindo muito mais energia renovável que fóssil.

Gripe aviária

Décio Luiz Gazzoni

Surtos sazonais de gripe humana matam, anualmente, 250 mil pessoas em todo o mundo. As vacinas existentes o produzem anticorpos que protegem apenas contra a linhagem infectante no momento. Cientistas americanos produziram anticorpos capazes de proteger camundongos de doses letais de várias linhagens do vírus da gripe, incluindo a gripe aviária, abrindo excelentes perspectivas para prevenir pandemias ou surtos sazonais de gripe. Os cientistas mudaram seu alvo que, rotineiramente, busca receptores na superfície infectante do vírus, sujeita a mutações rápidas e freqüentes, o que impede o desenvolvimento de uma vacina eficaz e universal. Os vírus da gripe apresentam diversas linhagens, variáveis com a proteína encontrada em sua superfície hemaglutinina (H) e neuraminidase (N)). A hemaglutinina atua como conector do vírus na célula infectada e auxilia a introduzir o material genético que faz com que a célula produza novos vírus, cuja saída da célula é mediada pela neuraminidase. Agora fica fácil entender porque os vírus são classificados de acordo com essas proteínas, como H5N1 (da gripe aviária) ou H1N1 (da gripe espanhola).  

Riscos

Em média, a cada trinta anos, tem surgido uma pandemia séria de gripe. Normalmente, trata-se de um mutante, com maior capacidade infecciosa. Até o momento era impossível produzir vacinas em larga escala e estocá-las para prevenir uma pandemia. Com o novo método, a vacina tem como alvo proteínas de uma região abaixo da superfície do vírus. A hemaglutinina na superfície viral possui 16 variantes identificados, o que exigiria um anticorpo específico para cada variante. Entretanto, as proteínas na região sub-superficial são estáveis, o que permite identificar anticorpos monoclonais (proteínas derivadas de uma mesma linhagem celular) capazes de apresentar uma imunização mais ampla. Por exemplo, o anticorpo F10 (um dos desenvolvidos pela nova técnica), imunizou os camundongos contra 8 dos 16 tipos de hemaglutinina. Quando estes anticorpos se ligam às proteínas sub-superficiais, eles impedem que o vírus mude de forma e consiga se fundir na célula. Desta forma, com apenas dois ou três anticorpos, seria possível, em teoria produzir vacinas eficazes contra todas as linhagens de gripe. Além do avanço evidente no tratamento das formas comuns de gripe humana, a técnica cria fundadas esperanças de evitar pandemia de gripe aviária, seguramente o problema sanitária que mais tem preocupado as autoridades e os produtores de todo o mundo.

 

O preço do etanol

Décio Luiz Gazzoni

Entre a usina e o consumidor, o preço do etanol combustível mais do que dobra. Segunda feira, 23 de março, na porta da usina, o litro do álcool hidratado custava R$ 0,63. Ontem, nos postos de combustível de Londrina, o mesmo litro valia até R$1,65 (em média, R$1,55)! Ocorre que o litro do álcool que estava na usina na segunda e o que foi vendido ontem no posto, é o mesmo. Em dois dias o preço aumentou até R$1,02, ou 166%! O posto pagou por este litro em torno de R$1,20, de acordo com o site da ANP, ou seja, o sobrepreço do posto foi de R$0,43, ou 69% do preço de venda na porta da usina. Ocorre que, para chegar ao preço de R$0,63 na usina, agricultores trabalharam de 12-18 meses, gastaram fortunas para plantar, manejar e colher a cana, correram todos os riscos de clima, pragas, queda do preço da cana, pagaram juros altos, etc. O usineiro investiu dezenas de milhões de reais em construções, máquinas, equipamentos, mão de obra, estocagem, pagou juros altos, etc. Já o posto roda o seu estoque em 3-4 dias. Verifica-se um forte desequilíbrio na remuneração dos diferentes agentes da cadeia, ou seja, quem investe mais e corre mais riscos recebe a menor remuneração, o oposto do que deveria acontecer em um mercado perfeito.   O fato não necessariamente se repete em todos os municípios do Brasil, pois, ainda recentemente, abasteci meu carro, no interior de São Paulo, por R$1,09 e recebi informação de preços ainda mais baixos. No Brasil, o uso do etanol gerou economia de US$ 234 bilhões desde 1975. Ao abastecer o veículo com etanol, um volume expressivo de petróleo deixou de ser importado, auxiliando no superávit das nossas contas externas. Este ano, estima-se que mais de 1,5 milhão de trabalhadores retirarão o sustento familiar da cadeia do etanol. Estes valores poderiam ser ainda maiores se fossem praticados preços remuneratórios para a venda ao varejo, porém sem exorbitância. Com preços mais baixos, aumentaria o mercado de etanol, demandando maior produção de cana, gerando mais empregos, movimentando a economia do interior, auxiliando nosso desenvolvimento. E, vendendo volume maior, mesmo a menor preço, o lucro do posto de combustível seria igual ou maior. Todos ganharíamos. Há 3 anos, quando o Governador Alckmin reduziu à metade a alíquota do ICMS sobre o etanol, em menos de 6 meses a arrecadação voltou ao patamar anterior e depois subiu ainda mais, como resultado do volume de venda maior, apesar do preço menor. Além de inteligente, foi uma atitude patriótica do governador.

 

Biocombustíveis na UE

Décio Luiz Gazzoni

No dia 12 de janeiro passado, o Conselho da União Européia votou as regras para o uso de fontes renováveis de energia e, no dia 17, as mesmas foram aprovadas pelo parlamento. Com as novas regras, abre-se a perspectiva de que o etanol brasileiro possa ocupar parte do mercado regional. Uma diretiva da UE não tem efeito direto nos países que a compõem, devendo ser aprovada, individualmente, em cada país. Isto deve demandar todo o ano de 2009, devendo entrar em vigor, efetivamente, a partir de 2010. Na realidade, no dia 12 foi votado todo um pacote que envolve diversas medidas destinadas a mitigar as mudanças climáticas globais, no qual se insere o fomento ao uso de biocombustíveis. A preocupação das autoridades do bloco, tanto do Conselho, quanto do Parlamento Europeu, é o atendimento dos compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa, previstos no Protocolo de Kyoto. O uso dos biocombustíveis é apenas um dos capítulos da diretiva sobre energias renováveis, cuja meta é de que até 2020, de toda a energia consumida na região, 20% sejam provenientes de fontes renováveis. Desse total, o setor de transportes terá de colaborar com 10%, onde se inserem os biocombustíveis, que hoje já contam com um aporte razoável tanto de etanol quanto de biodiesel.  

Concorrência

É importante lembrar que os biocombustíveis não são a única opção e nem seu uso será obrigatório após a definição da lei. No entanto, no curto prazo, não existe alternativa ao uso do etanol e do biodiesel. Por exemplo, o uso de carros elétricos, é uma opção para o futuro, apesar de que, no transporte coletivo, a eletricidade é muito usada. Entretanto, o fato de usar eletricidade não resolve o problema, pois ela necessita ser gerada a partir de fontes renováveis, como hidroelétricas ou termoelétricas de biomassa. O potencial hidroelétrico da Europa está em vias de esgotamento, e a operação de termoelétricas a biomassa depende de florestas frias, de longo tempo de maturação. Assim, o espaço de mercado que pode ser ocupado por biodiesel e por etanol é respeitável. Por questões de custo, de escala e organização da cadeia, o maior beneficiado seria, em tese, o etanol brasileiro. Apesar da tarifa de 0,19 centavos de euro por litro de etanol, mais alta do que a cobrada nos Estados Unidos, as exportações brasileiras para a UE somaram 1,6 bilhão/litros até outubro de 2008, e as perspectivas são excelentes para multiplicar este valor em até dez vezes, ao longo da próxima década.

 

Proposta de agenda

Décio Luiz Gazzoni

O Canal Rural, em parceria com a Sociedade Rural do Paraná, transmitiu ao vivo, para todo o Brasil, o Fórum Canal Rural, com imagens geradas no recinto da ExpoLondrina. No dia 7 passado, o tema foi Política Agrícola e Novo Crédito Rural, do qual tive a honra de participar. Coube-me elencar algumas propostas preliminares, que constam da agenda de discussão de estratégias de longo prazo para o agronegócio brasileiro, no âmbito da SAE/PR. O fator subjacente é o aumento da demanda de produtos agropecuários, nos próximos anos40 anos, quando mais 3 bilhões de pessoas serão convidadas a sentar-se à mesa, e um bilhão de pessoas que hoje estão na linha da fome, serão incorporadas ao mercado. Portanto, nosso desafio será alimentar mais 4 bilhões de pessoas, com o máximo de eficiência e o menor impacto ambiental. O Brasil é parte fundamental desta solução, pelas suas vantagens comparativas – as quais necessitam ser transformadas em vantagens competitivas, através de políticas públicas adequadas.

 

A estratégia

Na base do processo está a tecnologia avançada e adequada, o que implica em investimentos elevados e constantes em instituições científicas e tecnológicas capazes de responder aos desafios. A engenharia financeira, fundada em crédito adequado, a juros e prazos compatíveis, sistemas inovadores de comercialização e seguro renda, é um dos temas em desenvolvimento no Governo Federal. Paralelamente, busca-se estimular o incremento da produtividade agrícola, para reduzir a pressão de expansão da fronteira agrícola, em especial em direção à Amazônia. Como corolário deste processo, o Governo estuda fórmulas de incentivar a recuperação de áreas degradadas, com o recurso da integração lavoura-pecuária e de sistemas agro-florestais. A adequação da infra-estrutura e da logística é um dos maiores desafios para garantir a competitividade nos próximos anos. As exigências dos mercados internacionais precisam ser levadas em consideração, tanto no tocante ao seu perfil (mais proteínas na mesa, mais flores nos vasos, mais fitoterápicos nas farmácias), como nas exigências de qualidade e inocuidade, o que impõe uma estrutura de Defesa Agropecuária capaz de enfrentar o desafio. Como nem só de pão vive o Homem, atenção está sendo dada ao avanço da agroenergia, em termos de biocombustíveis ou de biomassa para geração de eletricidade. O Fórum teve o mérito de potencializar esta discussão, fundamental para a elaboração de uma agenda estratégica de longo prazo para o agronegócio brasileiro.

 

Perspectivas dos biocombustíveis

Décio Luiz Gazzoni

A convite do Sindicato Rural de Londrina apresentei, no dia 11/4, uma palestra na ExpoLondrina, analisando as perspectivas dos biocombustíveis para a próxima década. Deixei claro que sou muito otimista com as perspectivas de crescimento do mercado de etanol e apenas otimista com o biodiesel. No caso do etanol, o mercado interno será o grande vetor que permitirá chegarmos ao final da próxima década produzindo, no mínimo, 60 bilhões de litros, podendo ultrapassar os 75 bilhões. Tudo depende de algumas conjunções de fatores. Do ponto de vista da substituição da gasolina por etanol, o céu é de brigadeiro e a proporção de novos veículos flex-fuel licenciados no Brasil deverá ser de, virtualmente, 100% em 2020. Como a tendência do preço do petróleo é prosseguir com aumentos acentuados, acima da inflação do período, o etanol deverá ganhar cada vez mais competitividade. O tamanho deste mercado interno somente será limitado por elevada carga tributária e por manipulação de preços por parte dos distribuidores e varejistas. Além deste portentoso mercado, deve-se considerar as possibilidades de a) exportação de etanol; b) uso do etanol em motores de ciclo diesel; e c) etanol como matéria prima da indústria de química fina.  

Biodiesel

Desconheço qualquer planta cultivada que tenha maior potencial de acumular energia que a cana-de-açúcar. Por esta razão, conseguimos produzir etanol a custos altamente competitivos. Já a substituição de petrodiesel por biodiesel enfrenta o problema do alto custo dos óleos vegetais – matéria prima para o biodiesel – e o baixo rendimento de óleo das principais oleaginosas cultivadas no Brasil. Com exceção do dendê, que pode produzir 5 t/ha de óleo, as demais oleaginosas variam entre 0,3 e 2t/ha de óleo. Se examinarmos a série histórica dos preços dos óleos vegetais, vamos verificar que, no mercado internacional, o preço do petróleo é sempre inferior ao preço dos óleos vegetais – mesmo na loucura dos US$147/barril do ano passado. Portanto, a política pública de substituição do petrodiesel por biodiesel vai enfrentar problemas na década de 20, se nos propusermos a substituir, por exemplo, 10% do diesel consumido no país. Neste caso, vislumbro que a excelente iniciativa deste governo terá que ser complementada, no futuro, por outras medidas que associem a redução da poluição ambiental com custos menores. Para mim, o ovo de Colombo é o próprio etanol ou outros biocombustíveis derivados da cana, que possuem enorme potencial futuro de substituir o petrodiesel.

Formigas tagarelas

Décio Luiz Gazzoni

Pobres de nós, humanos, que pensávamos que o dom da fala era exclusividade nossa, com algumas pequenas incursões entre os papagaios – mais presente em piadas do que na vida real. Aos poucos os cientistas estão descobrindo que a comunicação por sons não é um privilégio nosso, mas pode ser encontrada entre outros animais. O grande segredo para as descobertas está nas novas ferramentas científicas. Por exemplo, avanços na tecnologia de áudio permitiram aos cientistas descobrirem que as formigas costumam "falar" umas com as outras em seus ninhos e formigueiros, e como isso é feito.

 

Falando pela barriga!

O estudo da comunicação das formigas mostrou que os insetos também interagem usando sons, mas apenas recentemente cientistas descobriram que esse "vocabulário" tinha um significado muito maior. A comunicação é efetuada por uma estrutura que lembra uma tábua de lavar – aquelas ranhuradas, usadas pelas lavadeiras de beira de rio – que está presente no abdômen das formigas. O som é produzido quando a "tábua" é esfregada. A descoberta foi feita no âmbito de uma pesquisa desenvolvida pela Universidade de Oxford, na Inglaterra, voltada para o estudo do comportamento dos insetos. O estudo foi publicado na Science, e a decodificação da comunicação só foi possível com o uso de microfones e alto-falantes em miniatura, de alta sensibilidade. As formigas-rainhas, através da fricção de seus abdomens, dão ordens aos "trabalhadores" dos formigueiros. A descoberta mais importante é que, dentro da colônia de formigas, diferentes sons emitidos podem provocar diferentes reações. Isto porque as formigas podem produzir sons variados, alterando o ritmo com o qual se esfrega.

 

Parasitas

O estudo também mostrou que a preguiça e o aproveitamento do trabalho alheio não é exclusivo dos humanos. Para espanto dos investigadores, eles descobriram que outros insetos podem imitar as formigas e torná-las escravas. Por exemplo, uma espécie de borboleta azul, que mantém uma relação parasitária com as formigas, tira proveito da comunicação sonora. As lagartas das borboletas são carregadas pelas formigas até os ninhos e, quando chegam lá, pedem comida fazendo ruídos com o corpo, sendo, então, alimentadas pelas formigas trabalhadoras. Tudo isto porque a lagarta "aprendeu" a imitar o som dos comandos da rainha do formigueiro! O que resta agora, para nós humanos, é utilizar o vocabulário sonoro das formigas para desenvolver novos métodos de controle destes insetos.

 

Boas novas 1

Décio Luiz Gazzoni

O leitor deve estar com o saco cheio de más notícias, seja da crise financeira ou da seca que atormentou parte da área agrícola. Vamos saltar por cima dos problemas conjunturais e focar na safra de boas notícias de tecnologias que estarão disponíveis para as próximas safras agrícolas. São diversas boas novas, mostrando que há luz forte no fim do túnel. Fiquei contente em verificar que o sonho do arroz dourado continua vivo. Tão vivo, que pesquisadores do Instituto de Pesquisa do Arroz das Filipinas já estão testando no campo uma variedade de arroz geneticamente modificado, que contém altas concentrações de provitamina A (o arroz dourado), e que também possui resistência a duas doenças economicamente importantes em áreas tropicais, o tungro, causado por um vírus, e a murcha bacteriana, causada por Xanthomonas oryzae. O estudo está sendo parcialmente financiado pela Fundação Bill e Mellinda Gates. Lembrando que o arroz dourado apresenta altas concentrações de pró-vitamina A, favorecendo o aumento dos níveis dessa vitamina no organismo humano. A ausência de provitamina A pode ter conseqüências graves sobre a saúde, como deficiência no sistema imunológico e no crescimento corporal e, em casos graves, levar à cegueira.  

Tolerância à seca

O segundo estudo que me chamou a atenção foi o da Dra. Nenita Desamero, do mesmo Instituto. Ela explorou a variação somaclonal do arroz para desenvolver linhagens tolerantes à seca. A variação somaclonal é um termo que se usa para as diferenças observadas em plantas obtidas a partir de cultura de tecidos. No caso, a cientista efetuou a cultura de tecidos a partir de anteras, inflorescência e sementes de arroz. Modificações genéticas foram introduzidas nas culturas in vitro, buscando resistência à seca, obtendo 9 linhas elite, com diferentes graus de tolerância à seca. Nos ensaios realizados, as linhas produziram entre 4.428 e 5.767 kg/ha, um aumento entre 13 e 48% sobre a testemunha, que produziu 3.906 kg/ha. Detalhe importante: com o uso da biotecnologia, foi possível reduzir de 12 para 6 safras agrícolas o tempo necessário para o desenvolvimento das novas variedades. A boa notícia não é só para os arrozeiros, mas para qualquer produtor de grãos, vez que, na minha visão, a prioridade primeira, em termos de desenvolvimento de tecnologia para os próximos anos, é a tolerância à seca, pois as mudanças climáticas globais conduzirão a veranicos cada vez mais intensas e mais freqüentes, nas principais regiões agrícolas.

Boas Novas 2

Décio Luiz Gazzoni

Completando a coluna da semana passada, a primeira boa nova vem dos EUA, onde o órgão encarregado de atestar a segurança dos alimentos (FDA) está analisando um novo híbrido de milho tolerante à seca. O material genético foi desenvolvido pela Monsanto, e os testes de campo conduzidos em diversas regiões dos EUA comprovaram que o novo produto permite um acréscimo de 6% a 10% de produtividade, sob diferentes intensidades de veranicos, comparado com as variedades convencinais. O híbrido deverá ser comercializado nos EUA com a denominação SmartStax, a partir de 2010, ainda sem previsão de sua chegada ao Brasil. Além da tolerância à seca, este híbrido também apresenta uma complexa combinação de genes, para resistência a diversos insetos pragas. Em outra linha de investigação, pesquisadores das Universidades de Delaware, Dakota do Sul e Arizona identificaram um novo mecanismo que ajuda a proteger a cultura contra vírus causadores de mutações e contra os "genes saltadores" (transposons). Na Universidade de Delaware, os cientistas descobriram um gene, presente na planta modelo Arabidopsis, que produz uma enzima com a habilidade de proteger a integridade do código genético. Na Universidade do Arizona os cientistas se debruçaram sobre o genoma do milho e encontraram um gene similar, com o mesmo efeito. Ao final do estudo, foi possível identificar o gene que permite evitar mutações não desejadas no milho. Caso ele não esteja presente em determinados germoplasmas comerciais, pode ser introduzido por técnicas biotecnológicas.  

Bananas

Pragas de frutíferas, além de causarem prejuízos econômicos, estão entre as principais pragas quarentenárias dos diferentes países importadores. A presença de determinada praga em um país, pode fechar o seu mercado exportador. Por exemplo, a sigatoka negra é uma das mais sérias ameaças à produção de banana no Brasil e em outros países. Até o momento não existe um método de controle eficaz para a doença, que exige erradicação das plantas afetadas. Em Uganda estão sendo testadas variedades OGMs resistentes à sygatoka (Mycosphaerella fijiensis) e murcha bacteriana (Xanthomonas campestris). Na Austrália, o Prof. James Dale, da Universidade de Queensland, produziu germoplasma modificado que resiste ao Mal do Panamá, uma enfermidade devastadora para o cultivo da banana. No futuro, o uso destes materiais genéticos não apenas aumentará a rentabilidade dos cultivos, como servirá de apoio à ampliação do mercado internacional, pela redução das barreiras sanitárias.

Produtividade agrícola

Décio Luiz Gazzoni

O crescimento da população mundial, que aumentará mais de 3 bilhões de pessoas, nos próximos 40 anos – além da inclusão social de quase 1 milhão de famintos - exige uma ampliação dramática da produção de alimentos. A pressão pela proteção ambiental, associada aos efeitos negativos das Mudanças Climáticas Globais, impõem um aumento acelerado da produtividade, em contraposição à expansão de área. Considere-se o agravante de que a agricultura será cada vez mais pressionada para produzir - além de alimentos - energia, plantas ornamentais, plantas medicinais, insumos para a indústria química, madeira, entre outros. A celeridade e a intensidade exigidas do processo não permitem uma atitude de laissez faire, deixando ao sabor das pressões de mercado as mudanças necessárias, tornando-se imperiosas políticas públicas que impulsionem o agronegócio no rumo correto.  

Produzir com sustentabilidade

Projetando-se o longo prazo (2050), estima-se que haverá necessidade de expandir a produção mundial de alimentos em mais de 60% porém, dificilmente, será possível incorporar, especificamente para produção de alimentos, mais de 20% da área atual (cerca de 300 milhões de hectares), considerando que, paralelamente, também haverá pressão para aumento da área para outros produtos agrícolas. Neste caso, haverá necessidade de ganhos de produtividade superiores a 33%, o que exige ações imediatas para evitar as conseqüências alternativas, que seriam a oferta de alimentos inferior à demanda ou os impactos ambientais indesejáveis do avanço da fronteira agrícola. O Brasil, pelas suas vantagens comparativas e pela expectativa de que venha a ser o grande provedor de alimentos do mundo, deverá elevar sua produtividade muito acima da estimativa de 33%, para compensar ganhos menores em áreas onde a produtividade já é muito alta ou onde esse incremento será menor.

 

Produtividade de soja

É com este pano de fundo que o CESB, Comitê Estratégico Soja Brasil– do qual me orgulho de ser sócio fundador –e que é composto por profissionais de diferentes áreas enlaçados pelo objetivo comum de incentivar a expansão da produtividade da soja no Brasil, lançou o seu programa no dia 20 de maio, em Goiânia, durante o Congresso Brasileiro de Soja,. O programa tem como meta final auxiliar o sojicultor brasileiro a atingir a produtividade média de 4.000 kg/ha. As ações que compõem o programa estão disponíveis no site do CESB (www.cesbrasil.org) para consulta e para adesão de todos os produtores interessados.

 

O desafio da produtividade

Décio Luiz Gazzoni

A população mundial é estimada em 6.864.607.631 de pessoas (20/5/09). Em 2030, a população deverá atingir 8,7 bilhões de pessoas e quase 10 bilhões em 2050. A taxa atual de crescimento da população mundial é de 1,19% a.a. Entretanto, o maior crescimento populacional está ocorrendo nos países pobres e mais afetados pela fome, pois nos países ricos a população se encontra estabilizada ou com crescimento negativo. A ONU estima que, em 2008, cerca de 963 milhões de pessoas (11% da população do planeta) sofrem sérias restrições alimentares, estando esta população especialmente concentrada em países pobres. A sociedade global não mais aceita esta iniqüidade e exige soluções já no médio prazo. Postos estes elementos, deve-se pensar em formas de oferta de produtos agrícolas para atender as duas principais vertentes da demanda alimentar (crescimento populacional e inserção social), que devem ser consentâneas com os requisitos de qualidade e inocuidade, sobre uma base dinâmica de mudança de hábitos alimentares, rumo à maior demanda de proteínas animais, frutas e hortaliças, e também de outros produtos da agropecuária.  

Produção sustentável

De acordo com a FAO a agropecuária ocupa 1,5 bilhão de hectares, 70% dos quais devotados à pecuária. Embora os estudos da FAO indiquem haver disponibilidade de terra arável para expansão equivalente à que está sendo cultivada, diversas restrições devem ser colocadas, como: a) as terras mais férteis, de topografia mais adequada e melhor localizadas, já foram ocupadas; b) porção considerável da área de expansão é considerada arável apenas mediante irrigação; c) grande parte da área de expansão encontra-se na África, com severas restrições para sua incorporação em larga escala ao sistema produtivo, nos próximos 30 anos; d) a sociedade mundial pressiona por políticas ambientalistas cada vez mais rígidas, o que deve se intensificar em função dos impactos das Mudanças Climáticas Globais. Na sociedade primitiva, extrativista, baseada na caça e coleta, eram necessários 20-100 ha para alimentar uma pessoa, enquanto nos primórdios da agricultura (corte e queima) esta demanda foi reduzida em 90%. Os primeiros agricultores que utilizaram várzeas necessitavam entre 0,5-1,5 ha para alimentar um indivíduo. Atualmente, são necessários 0,22 ha para alimentar cada uma das 6,7 bilhões de pessoas, e, nas áreas de mais alta tecnologia é possível alimentar uma pessoa com apenas 0,1 ha. Esta é a meta que devemos perseguir: produtividade com sustentabilidade!

 

Alta produtividade

Décio Luiz Gazzoni

No dia 20 de maio, durante o V Congresso Brasileiro de Soja, realizado em Goiânia, foi lançado, oficialmente, o Comitê Estratégico Soja Brasil (CESB), uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), cujo objetivo estatutário é pugnar pelo incremento sustentável da produtividade de soja no Brasil. Tratando-se de um ente estratégico, o CESB não se desimcumbirá, diretamente, de funções executivas, restringindo-se à formulação intelectual das propostas estratégicas para atingir este objetivo. A execução das propostas caberá aos parceiros, como Universidades, Empresas de Pesquisa, Empresas de Assistência Técnica, Cooperativas, Associações, Sindicatos, etc. A cerimônia de lançamento foi prestigiada por mais de duas centenas de lideranças rurais, tendo sido a conferencia do evento proferida pelo ex-Ministro Dr. Roberto Rodrigues.  

Concurso de Produtividade

Na oportunidade, foi lançado o Concurso Nacional de Máxima Produtividade de Soja, destinado a destacar aqueles agricultores que atingirem alta produtividade, com rentabilidade e sustentabilidade, servindo de exemplo aos demais sojicultores para que o Brasil incremente, continuamente, a produtividade de soja. Nesta ocasião, foram premiados 4 sojicultores que se destacaram pela elevada produtividade na safra 08/09. São eles: Marcos Rogério da Costa (Itapeva-SP), com 4.849kg/ha; Otávio Vieira de Melo (Itaporã-MS), com 4.880kg/ha; Anacleto Brunetta (Rondonópolis-MT), com 4.894kg/ha; e Guilherme Ohl (Primavera do Leste-MT), com 4.909kg/ha. Estes agricultores não receberam qualquer orientação diferenciada ou assistência técnica especial - simplesmente utilizaram as tecnologias disponíveis. Estes rendimentos são 82-84% superiores à média brasileira da safra 08/09, que foi de 2.661kg/ha, de acordo com a CONAB. Um pequeno exercício, para provocar a imaginação do leitor: Se a média brasileira fosse igual à produtividade do Sr. Ohl, ao invés de 57 milhões de toneladas, teríamos produzido 106 milhões de toneladas, na mesma área. Ou, fazendo a conta inversa, necessitaríamos de apenas 11,7 ao invés de 21,6 milhões de hectares, para produzir a mesma quantidade soja. Com isto, pouparíamos 10 milhões de hectares, que poderiam ser destinados a outros usos, ou à rotação de culturas. Com esta provocação, quero deixar claro que o futuro passa, necessariamente, por ganhos ambiciosos de produtividade, para garantir a nossa condição de líder de mercado, com alta rentabilidade financeira e respeito ao meio ambiente.

 

Arroz e feijão mais nutritivos

Décio Luiz Gazzoni

Há tempos a Embrapa saltou de patamar e está introduzindo nas suas variedades características que vão além dos requisitos agronômicos, como alta produtividade e baixo custo. A III Reunião Anual de Biofortificação, realizada semana passada em Sergipe, traz exemplos concretos destes avanços. Por exemplo, a Embrapa Arroz e Feijão está desenvolvendo duas cultivares de arroz e duas de feijão com teores mais altos de ferro e zinco, a fim de reduzir a incidência da anemia. De bônus, o agricultor leva maior tolerância à seca nas cultivares de feijão. Os pesquisadores identificaram estes materiais genéticos no banco de germoplasma da Embrapa, que reúne 11 mil materiais de arroz e 14 mil de feijão. Duas variedades tradicionais de arroz coletadas no Maranhão (Zebu Ligeiro e Chatão Branco) e duas de feijão (BRS Agreste (mulatinho) e BRS Pontal (carioca) foram identificadas como apropriadas para o programa de biofortificação. As variedades de arroz estão em processo de avaliação em propriedades agricultores familiares nos municípios maranhenses de Miranda do Norte, Vargem Grande, Chapadinha e Brejo. A BRS Agreste e BRS Pontal estão sendo testadas junto a produtores rurais de Sergipe e Pernambuco.

 

Altos teores

O objetivo dos pesquisadores do programa de melhoramento genético da Embrapa Arroz e Feijão é gerar cultivares com, aproximadamente, o dobro do teor de ferro e de zinco das cultivares atuais, associando a biofortificação com características agronômicas, culinárias e industriais desejáveis. Em 100 g de arroz, encontra-se 1,3 mg de ferro e 1 mg de zinco. No feijão, o teor médio é de 7 mg de ferro e 3 mg de zinco. Entretanto, as necessidades diárias, para uma pessoa adulta, são de cerca de 12 mg de ferro e 10 mg de zinco. Portanto, se considerarmos que, para grande parte da população brasileira, a dobradinha arroz e feijão representa parcela ponderável da alimentação, o desafio é aumentar os teores dos micronutrientes, para beneficiar as populações que não tem acesso a outra fonte dos mesmos. No caso do feijão, os experimentos estão sendo conduzidos para associar a tolerância à seca, permitindo que a planta suporte períodos de estiagem no decorrer da safra, principalmente, na região semiárida do Nordeste, sem que haja perdas significativas na produtividade. Projetando esta linha de pesquisa para o médio prazo, e lançando mão de técnicas de biotecnologia, é possível imaginar que alimentos cada vez mais nutritivos e saborosos estarão saindo da cornucópia da Embrapa.

 

Soluções verdes

Décio Luiz Gazzoni

Em março passado foi realizado em São Paulo, o congresso e na feira de inovações tecnológicas Ecogerma 2009. O evento tem o objetivo de discutir novas oportunidades no mercado de serviços e de produtos sustentáveis, promovido pela Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha. Foram congregadas 200 empresas, órgãos governamentais e institutos de pesquisa expositores, com os cerca de 20 mil visitantes por dia no evento. Uma das idéias força do evento é que as inovações na área de sustentabilidade podem ser uma saída eficiente para alavancar a economia em períodos de crise. A Alemanha é o maior exportador de tecnologias ambientais em caráter global. O mercado de tecnologias sustentáveis no Brasil, que engloba basicamente três grandes áreas – energias renováveis, gestão ambiental e eficiência energética –, movimenta aproximadamente US$ 17 bilhões anuais, valor semelhante ao faturamento, por exemplo, das empresas do setor elétrico. Trata-se de um setor em franca ascensão, cujas estimativas apontam para um crescimento de 5% a 7% ao ano até 2020 – taxa bem superior à expectativa de crescimento da própria economia nacional –, podendo chegar a pelo menos US$ 22 bilhões anuais.   História

Com mais de 43% de sua matriz energética considerada "limpa", principalmente por conta da geração de hidreletricidade e da produção de biocombustíveis e de energia elétrica de cana, o Brasil atualmente é líder no segmento de energias renováveis, seguido pela Índia, que abriga matriz energética limpa de 31%, China (8%), Itália (7%), França e Alemanha – ambas com 6% –, Estados Unidos (5%), Rússia (4%) e Japão (3%). Estimativas indicam que o setor de biocombustíveis no país poderá chegar a 30% da matriz energética nacional até 2030. Para efeito de comparação, os Estados Unidos têm 1,3% e a União Européia apenas 0,7% de sua matriz energética representada pelos biocombustíveis no transporte rodoviário. O estudo aponta quatro segmentos como os mais propícios para a geração de tecnologias sustentáveis no país. O primeiro é o setor das energias renováveis alternativas, sobretudo pelo uso da biomassa, energia eólica e exploração de pequenos rios e bacias hidrográficas. O segundo é a introdução de práticas mais eficientes de gestão de resíduos sólidos urbanos e industriais, incluindo a melhor separação do lixo para sua reciclagem e o reaproveitamento térmico dos materiais. Outro grande desafio para o Brasil está no setor de água e saneamento, principalmente a redução de perdas. Por fim, o quarto segmento corresponde ao aumento da eficiência energética, em especial com a construção dos chamados "prédios verdes", que trazem sistemas inovadores de aquecimento e refrigeração, por exemplo, e que utilizem materiais ecoeficientes. Um importante resultado observado em estudo realizado com empresas brasileiras foi que 46% investiram mais de 1% do faturamento em tecnologias sustentáveis. Desse total, 27% investiram até 3% e 14% investiram mais de 5% em soluções sustentáveis, entre as quais melhorias na gestão da água e na gestão de resíduos sólidos, redução de emissões atmosféricas, preservação ambiental e créditos de carbono. Pela importância de sua participação, o agronegócio deverá representar a maior parcela de negócios verdes, no futuro próximo.

 

Plano Safra

Décio Luiz Gazzoni

Foi muito reveladora a cerimônia de lançamento do Plano Safra, na SRP. O Presidente da República, em seu discurso, falou tudo o que queríamos ouvir, e, confesso, um pouco mais. Claro ficou que ele tem um diagnóstico preciso da agropecuária brasileira, no enfoque correto, e sabe exatamente o que fazer. De minha parte, fico contente em ver que os projetos que estamos propondo, através da Secretaria de Planejamento Estratégico da Presidência, estão chegando ao Chefe da Nação. Foi interessante ouvir do presidente a preocupação com o endividamento dos agricultores e ter clareza das suas causas, que foram o descasamento entre ativos e passivos, os desastres climáticos e a volatilidade de preços. Foi bom ouvir a explicação que "agricultor que desmatou não é bandido", porque esta era a regra há 40 anos. Que não há como enquadrar na legislação atual os pequenos agricultores que, há mais de um século usam encostas de morro para plantar frutas ou criar vacas. Muita clareza na questão da agroenergia, em especial da importância do etanol para o mercado interno e para a geopolítica diplomática, no contexto da Reunião de Copenhagem, que definirá os compromissos globais pós-Kyoto. Ouvi a preocupação do Presidente com a legislação trabalhista no campo, que precisa ser modernizada. Foi ótimo ouvir que precisamos melhorar o seguro agrícola, criando o Fundo de Catástrofes e aumentando o teto de cobertura. Também gostei de ouvir que a nossa idéia sobre Seguro Renda chegou ao Presidente: além do clima, precisamos nos proteger das oscilações de mercado. Foi gratificante ouvir da boca do Presidente, reverberando o que já haviam falado o Ministro Stephanes e a Ministra Dilma, que a grande saída para o Brasil abocanhar o mercado internacional está na dobradinha alta produtividade da agropecuária e um sistema de Defesa Agropecuária de Primeiro Mundo. É o que viemos pregando há muito tempo, como parte da sustentabilidade econômica e ambiental. Senhor Presidente, o diagnóstico e o enfoque estão no rumo certo. A questão é fazer o que precisa ser feito.

 

Preço do álcool

Voltando da Rural, na Av. Tiradentes, foi gratificante ver um posto vendendo álcool a R$0,99. Olhei os demais e o maior preço era R$1,06, longe dos R$1,45 de 20 dias atrás. Parabéns ao prefeito, que chamou a atenção para o assaque à economia popular, aos procuradores e ao Judiciário. Preço mais baixo significa mais vendas, mais cana no campo, mais empregos, mais dinheiro circulando na economia, mais arrecadação tributária, logo mais escolas, postos de saúde, etc.

 

Diário de viagem

Décio Luiz Gazzoni

Semana passada viajei pelo meio oeste dos EUA. A agricultura americana passa por profundas mudanças, devido à insuficiente rentabilidade. Há uma fuga em massa dos jovens do campo, as meninas não casam com jovens agricultores, porque a vida é muito dura. Sobraram dois tipos de agricultores: os que têm fonte de renda fixa no meio urbano, sendo agricultor de noites e finais de semana; e os que arrendam a terra de proprietários que não podem ou não se dispõem a permanecer no campo. Está ocorrendo uma reforma agrária às avessas, desaparecendo os agricultores de pequenas e médias propriedades dedicados à agricultura de grãos.   Outros aspectos chamaram minha atenção: a) praticamente não há emprego na área rural. Propriedades abaixo de 1.000 ha são conduzidas pela família, com extenuantes jornadas de trabalho no plantio e na colheita; b) os agricultores são tão conservadores lá quanto aqui, há muita resiliência em adotar novas tecnologias; c) há deficiência de canais abrangentes de transferência de tecnologia; d) o produtor desconhece as ferramentas de bolsa, perdendo boas oportunidades de otimizar sua comercialização; e) os agricultores reconhecem a importância do check off – taxa compulsória paga pelos agricultores para custear pesquisa e desenvolvimento – para garantir sua competitividade; e, f) não há obrigatoriedade de reserva legal. Os americanos ficaram incrédulos ao relatarmos que, no Brasil, os produtores devem destinar à proteção ambiental de 20-30% da propriedade (no Sul e Sudeste) a mais de 80% (na Amazônia). Interessante observar que praticamente todas as ONGs ambientais que atuam no Brasil são financiadas pelos Governos e sociedade dos países ricos, exigindo o cumprimento da nossa legislação, quando eles são omissos em seus países.   No futuro próximo, os, produtores de milho e soja norte-americanos serão mais nossos parceiros que competidores, em virtude de um mercado francamente comprador e pela impossibilidade de crescimento de área nos EUA. Abrir novos mercados e fomentar novos usos significará manter a rentabilidade, em qualquer latitude. E, para nós, brasileiros, um alerta importantíssimo: impossível aumentar a oferta de soja em 8% a.a. sem que a produtividade cresça acima de 2% a.a. Isto representaria um desastre ambiental e inúmeras barreiras comerciais. Precisamos implementar, imediatamente, políticas públicas e atitudes claras e agressivas para aumentar a produtividade de milho e soja, a fim de capturarmos o enorme potencial que o mercado internacional destes grãos nos oferece.

 

Garantindo a renda

Décio Luiz Gazzoni

Entra ano, sai ano e a história se repete: o sojicultor vive uma constante incerteza quanto ao mercado internacional. À volatilidade de preços alia-se o alto custo de produção e a deficiência na gestão. Um dos principais problemas que observo é a obsessão de alguns produtores em adivinhar o momento do pico do preço da soja – em um ou outro ano alguém pode até acertar. A melhor estratégia é vender na alta (modulada pelos preços da Bolsa de Chicago), garantindo um preço médio elevado. Ou, metaforicamente, ganhar o jogo por 2 x 0 e não tentar aplicar sempre uma goleada! Por exemplo, na safra 08/09 o preço da soja na CBOT oscilou entre US$8,00 e US$14,00/bushel. Acertou quem vendeu na alta, próximo do pico. Quem esperou que rompesse os US$14,00 eventualmente acabou vendendo a US$8,00. No momento, a soja rompeu os US$12,00 e com tendência de alta. É o momento de planejar a venda.   Mercado

No momento, a situação é altamente favorável devido à forte quebra nas safras do Brasil e da Argentina, o atraso do plantio nos EUA, a manutenção da forte demanda chinesa no curto prazo, os prêmios positivos à soja brasileira, tudo associado à entressafra no hemisfério norte. Mesmo com o presente recuo na cotação do dólar, a combinação desses fatores abre boa margem sobre os custos de produção. O momento é adequado para fixar boa parte da safra 09/10 e liquidar estoques remanescentes da safra 08/09. A atitude mais sensata é, ao invés de perseguir o pico de preços, aproveitar a alta do momento, elaborando uma estratégia de busca de preços médios remuneradores. Para tanto, a venda deve ser parcelada, analisando o comportamento e a evolução dos fatores expostos, e de outros fatores que interferem nas cotações do mercado. Lembrando que a comercialização é a etapa final do processo de produção. Para alcançar alta rentabilidade com a cultura, o produtor deve ter cumprido sua lição de casa, usando as melhores técnicas agrícolas e gerindo sua propriedade de forma empresarial, com elevado senso profissional. O segredo do sucesso passa por três etapas: a) saber comprar (insumos, máquinas e implementos), preferencialmente associado a outros produtores; b) saber produzir, utilizando a melhor tecnologia para as suas condições; e c) saber vender, maximizando a cotação média da comercialização. A gestão é parte fundamental da rentabilidade, e, no ato da comercialização, o uso do portfólio de ferramentas de mercado é essencial para assegurar a rentabilidade.

 

Energia heterodoxa

Décio Luiz Gazzoni

Hamsters podem ajudar a enfrentar a crise energética mundial? Acho que não, mas esta pesquisa pode ajudar a gerar energia na propriedade rural. Tudo começou com um grupo de cientistas do Instituto de Tecnologia da Geórgia (EUA), que conseguiu produzir eletricidade a partir do bater dos dedos. Os hamsters de laboratório, aos quais foram acoplados minúsculos geradores de eletricidade, estão participando no desenvolvimento de novas formas de energia renovável, mantendo seu comportamento de andar pela gaiola. A tese central é que, por meio da nanotecnologia, é possível converter mesmo energia biomecânica irregular em eletricidade. O estudo foi publicado na revista Nano Letters e demonstra que nanogeradores – que vêm sendo desenvolvidos por Wang e equipe desde 2005 – podem ser alimentados por movimentos mecânicos irregulares, como a vibração de cordas vocais ou a oscilação de uma bandeira ao vento, além do bater dos dedos ou... da corrida de um hamster! Segundo os autores do estudo, obter energia de baixa frequência representa uma importante conquista, justamente por conta de a energia biomecânica ser variável, diferentemente dos movimentos regulares usados atualmente para a geração de eletricidade em larga escala. Imagine o leitor quantas oportunidades de gerar energia no dia a dia, a partir de quaisquer movimentos irregulares, que inclui até o pisotear de galinhas e vacas ou trotear de cavalos.

 

Técnica

A energia do nanogerador é produzida por meio do efeito piezoelétrico, um fenômeno de acordo com o qual certos materiais – como fios de óxido de zinco – produzem cargas elétricas quando são dobrados e depois relaxados. Os fios usados no estudo têm entre 100 e 800 nanômetros (bilionésimo de metro) em diâmetro e entre 100 e 500 micrômetros (milionésimo de metro) de comprimento. Para construir os geradores, os cientistas encapsularam fios individuais de óxido de zinco em um polímero flexível. Os fios foram colocados com contatos elétricos em cada ponta e com uma barreira em um dos lados para controlar a corrente elétrica. Em seguida, ligaram um dos geradores na junta de um dedo indicador e combinaram quatro em uma jaqueta que foi vestida por hamsters. A corrida do pequeno roedor e o movimento do dedo flexionaram o substrato no qual os nanofios foram encapsulados, produzindo minúsculas quantidades de uma corrente elétrica alternada. O importante é que o conceito foi demonstrado, agora é aguardar sua transformação em utilidades práticas.

 

Serviços ambientais

Décio Luiz Gazzoni

Recentemente estive nos EUA. Foi muito difícil explicar aos agricultores norte-americanos que, aqui no Brasil, um produtor pode ter 100ha na Amazônia, mas a ele seria permitido cultivar apenas 10-15ha, dependendo se passa ou não um rio pela propriedade. Para os americanos, proteger a Natureza, é obrigação de todos, a ser executada pelos Governos, com dinheiro dos impostos. É inadmissível que um produtor agrícola tenha que dedicar 80-90% de seu patrimônio para um bem coletivo, às suas expensas. Como estamos em tempo de mudanças rápidas, uma idéia que ganha força na Europa é transmutar os subsídios agrícolas europeus em pagamentos por serviços ambientais. Ou seja, muda-se tudo para que nada mude. O agricultor continuaria recebendo o mesmo valor, só que não mais a título de subsídio, porém porque a sua propriedade presta algum tipo de serviço ambiental. O que Maria ganha com isso? Ocorre que, desta forma, ninguém mais poderá contestar as transferências de renda para os agricultores europeus porque, tecnicamente, elas deixaram de ser subsídios. Uma jogada de mestre. Porém, a idéia não é de todo ruim, ou seja, bens coletivos devem ser custeados coletivamente. E, no fundo, esta é a idéia em gestação na Presidência da República, que deve encaminhar Projeto de Lei ao Congresso que institui o pagamento por serviços ambientais no Brasil. O projeto deve ser aprovado sem maiores dificuldades, já que conta com o apoio expressivo das bancadas ambientalistas e ruralistas.

 

Agricultura e ambiente

O Pagamento por Serviços Ambientais foi um dos pontos de consenso entre os dois segmentos, normalmente antagônicos, que são os deputados das comissões de Meio Ambiente, de Agricultura, da Amazônia e do Desenvolvimento Urbano. Este consenso veio na esteira de outra discussão acirrada, que foi a proposta de Zoneamento Agroecológico da Cana, que está na mesa do presidente Lula para ser assinada nos próximos dias, e que também foi acordada depois um longo e aprofundado debate encabeçado pelos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura. Tem mais, as duas áreas são xipófagas nos processos de elaboração e discussão dos Zoneamentos Ecológico Econômicos, que cada estado deve conduzir, para compatibilizar as vocações econômicas de seus territórios com as necessidades de preservação ambiental. Se for aprovada proposta de pagamento de serviços ambientais, a agricultura brasileira entrará em um novo patamar, com um tratamento muito mais justo do que vinha recebendo até o momento.

 

Estímulo ao emprego rural

Décio Luiz Gazzoni

 

As relações trabalhistas no Brasil são fortemente regulamentadas, incluindo desde artigos da Constituição Federal até Normas Regulamentadoras e Instruções Normativas, passando pela Consolidação das Leis do Trabalho, cujo texto original remonta a 1943, além dos balizamentos das Convenções Internacionais da OIT. O emaranhado legislativo e o alto custo marginal da mão de obra, imposta por esta legislação, geram distorções no meio rural, em que o desemprego é apenas uma das facetas. Também existe um volume relativamente grande de autuações devido ao descumprimento de preceitos legais, que vão desde pequenos detalhes burocráticos a denúncias sérias de trabalho forçado ou semi-escravo.  

As peculiaridades do campo

Para resolver adequadamente esta situação, é necessário entender a conformação estrutural ou as nuances conjunturais do emprego rural que, em muitos aspectos se diferencia do emprego urbano. O emprego na área rural exige um perfil diferente de empregado e uma jornada de trabalho diferenciada, em função dos ciclos biológicos das diferentes cadeias do agronegócio. Por exemplo, a jornada de trabalho necessita ser conciliada com as peculiaridades da atividade rural; a extensão do intervalo para almoço, para além das 2 horas estabelecidas na legislação, teria como conseqüência a diminuição da penosidade do trabalho; as operações de plantio, semeadura ou colheita dependem da conjunção entre período cronológico ótimo e condições de clima exigem jornadas diferenciadas. Atingido o momento ótimo de semeadura de determinado cultivo, após a primeira chuva é necessário concentrar a operação de semeadura, antes que a umidade do solo decresça ou que o período ótimo se encerre. Atingido o ponto de colheita, é necessário colher a produção agrícola antes que chuva, seca ou pragas reduzam a produtividade ou a qualidade da colheita. As operações de controle de pragas necessitam ser efetuadas no momento exato, sob pena de tornarem-se inúteis, ocasionando perdas palpáveis na produção e na qualidade de produtos agrícolas.

 

As mudanças

Elaboramos uma proposta de mudanças na Legislação Trabalhista, adaptada ao ambiente rural. Esta proposta estará sendo discutida amanhã, aqui em Londrina, buscando o seu aprimoramento com a contribuição de advogados trabalhistas e lideranças setoriais. Esta já é a reta final antes de submeter a proposta à consideração do Presidente da República.

 

Tecnologia de ponta

Décio Luiz Gazzoni

Produtores de soja e de feijão sabem quanto dinheiro poupam, a cada ano, dispensando a adubação nitrogenada, inoculando as sementes com bactérias fixadoras de nitrogênio do ar. Além de ser a mais cara, também é a que demanda mais energia e que mais proporciona a emissão de gases de efeito estufa, porque o N aplicado via adubação favorece a decomposição do carbono orgânico do solo. A Embrapa havia desenvolvido processos para fixar nitrogênio na cana-de-açúcar. Agora, os produtores de milho e de trigo também podem ampliar a produtividade e reduzir a utilização de fertilizantes químicos, usando bactérias promotoras de crescimento. Utilizando bactérias selecionadas pela Embrapa Soja e pela UFPR, uma empresa brasileira já disponibilizou esse produto aos produtores de milho e arroz. Em breve, outra estará disponibilizando inoculantes para milho e trigo. Dois grandes cientistas e amigos meus, o Dr. Rubens José Campo e a Dra. Mariângela Hungria, trabalharam com afinco para tornar esta tecnologia uma realidade. Os ensaios de campo mostraram incrementos médios de 25% a 30% no rendimento do milho e de 8% a 11% no trigo, com o uso da nova tecnologia. A adoção da tecnologia na cultura do milho pode economizar US$ 1 bilhão por safra, considerando uma área cultivada de 13 milhões de hectares, com rendimento médio de 3,2 t/ha.  

A tecnologia.

Foram 10 anos de pesquisa de uma equipe de cientistas baseados no Paraná, que envolveram desde a seleção de estirpes da bactéria Azospirillum brasilense - que promove crescimento em milho e trigo - até o desenvolvimento comercial do produto. A bactéria melhora a absorção N e de outros nutrientes que promovem o crescimento das plantas que, . em contato com a bactéria, aumenta a produção de diversos hormônios vegetais, resultando em maior crescimento das raízes e, conseqüentemente, em maior absorção de água e nutrientes. A inoculação é feita com a aplicação do produto sólido (como turfa) ou líquido nas sementes. Por conter microrganismos vivos é fundamental que os produtores não exponham o produto à luz solar, a altas temperaturas e que a aplicação não seja feita juntamente com agrotóxicos, como já é recomendado para a soja . Até o momento, seis estirpes de Azospirillum foram registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para a produção de inoculantes comerciais, pelas empresas interessadas em produzir inoculantes. O produto já está sendo comercializado a R$ 10 dose/hectare por uma empresa, que tem capacidade para produzir 300 mil doses por mês.

 

 

Agricultura e energia

Décio Luiz Gazzoni

Amanhã apresento uma palestra na II Bienal da Agricultura, que se realiza em Cuiabá, abordando o tema Alternativas Energéticas Sustentáveis para o Brasil. O espaço da coluna é exíguo, porém posso resumir minha fala. O problema central é que, nos próximos 40 anos, o mundo necessitará dobrar a oferta de energia. Países em desenvolvimento – como o Brasil – precisarão quase triplicar a oferta, para não sobrestar seu crescimento. O desafio associado é que esta oferta não poderá basear-se em fontes fósseis (petróleo, carvão e gás), altamente poluidoras e finitas. A época das mega-hidroelétricas (Itaipu, Tucuruí, etc.) entra em ocaso com os empreendimentos do Rio Madeira, e dificilmente teremos novos mega projetos a partir de 2020, pelo esgotamento do potencial hídrico e pelos enormes impactos ambientais – que a sociedade não mais aceita. Nos resta a energia renovável. Olhando o futuro distante – lá por 2100 – a conversão direta de energia solar nos abastecerá de energia. Só que, até resolvermos os problemas de custo, eficiência e armazenagem de energia elétrica gerada via fotovoltaica ou eólica, precisamos continuar crescendo.É aí que entra a agricultura.

 

Biocombustíveis e bioeletricidade

Pelos estudos que efetuei, até 2030 teremos uma frota de veículos leves de 70 milhões de carros. A partir de 2015 o uso de gasolina nestes veículos será marginal e, a partir de 2025, praticamente não haverá demanda de gasolina. O seu espaço será ocupado, inicialmente, por etanol e, na década de 20, por gasolina vegetal, produzida por fermentação de biomassa, provavelmente da própria cana-de-açúcar. A substituição do diesel seguirá uma rota diferente, decrescendo apenas a partir do fim da próxima década, sendo substituído por biodiesel, etanol e diesel vegetal. Isto implica expandir a área de cana para produção de biocombustíveis, que atingirá 14 milhões de ha, em 2030. A área de oleaginosas, após um pico de 6 milhões de ha, em 2016, decrescerá para 2 milhões de ha, principalmente de dendê. Para gerar eletricidade, teremos duas grandes vertentes. A principal será a co-geração nas usinas de cana, que absorverá grande parte da demanda incremental de eletricidade, até 2030. A segunda será composta por termoelétricas de biomassa, principalmente de madeira de florestas cultivadas. Para tanto, estimamos que cultivaremos mais de 4 milhões de ha com florestas, especialmente nas áreas marginais para a agricultura e de pastagens degradadas. Ou seja, excelentes e grandes negócios à vista!

 

Biocombustíveis e poluição atmosférica

Décio Luiz Gazzoni

Considero este tema de extrema importância pois, posto que os biocombustíveis podem causar determinados impactos ambientais. O tema precisa ser convenientemente elucidado, dimensionado e, em especial, comparando o impacto ambiental dos biocombustíveis com fontes fósseis de energia. O ciclo de vida dos biocombustíveis abrange desde o preparo de solo para o cultivo da matéria prima até o seu uso final. Em qualquer ponto da cadeia de produção, pode haver emissões de poluentes que afetem a qualidade do ar. Entende-se como poluentes as substâncias químicas liberadas ao longo da cadeia, que não constituem objetivo finalístico da produção de biocombustíveis, e que possam afetar a saúde pública ou o ambiente. Os poluentes sofrem uma série de reações químicas complexas assim que são emitidos na atmosfera. Estas reações dependem do ambiente em que são emitidos, podendo diferir de uma cidade para um ambiente rural.

 

Impactos

Os poluentes atmosféricos liberados durante a produção e utilização de biocombustíveis têm, geralmente, tempo de vida relativamente curto, e não são transportados a longas distâncias. O seu impacto é limitado principalmente ao plano local (cerca de 10 km) ou escalas regionais (ordem de 100-1.000 km). Em contraste com as emissões de gases de efeito estufa (GEE), os impactos dos poluentes atmosféricos tendem a ser de natureza regional. Como resultado, em teoria, as plantas de biocombustíveis localizadas próximas às cidades são susceptíveis de gerarem impactos mais acentuados na saúde pública do que aquelas localizadas em áreas rurais. O impacto da poluição do ar é mais facilmente compreendido através da análise individual das fontes de emissão, dos poluentes e de seus impactos. Deve-se considerar, em particular, os cinco poluentes emitidos por combustíveis, enumerados pela Environmental Protection Agency (EPA): material particulado, dióxido de enxofre, óxidos de nitrogênio, monóxido de carbono e ozônio. Além destes, são liberados os carbonos orgânicos voláteis (um importante precursor de ozônio) e outros perigosos poluentes atmosféricos. Entendemos que, com o aumento do uso de biocombustíveis, estudos devem ser realizados para determinar com precisão as emissões de poluentes durante todo o ciclo de vida dos biocombustíveis, inclusive para desenvolver tecnologias que eliminem ou minimizem estas emissões. Caso contrário, parcela ponderável dos benefícios ambientais dos biocombustíveis poderia ser ofuscada por emissões de poluentes atmosféricos, com impacto sobre a saúde pública.

 

Agenda agrícola

Décio Luiz Gazzoni

Amanhã, o Ministro Daniel Vargas, da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e o Ministro Stephanes, do MAPA, lançam, em Londrina, a discussão da Agenda Estratégica da Agricultura. É um portfólio de projetos que estamos elaborando, para capturar oportunidades para o agronegócio brasileiro. Impossível discorrer sobre todos os projetos, portanto destaco os que mais me entusiasmam. O primeiro aborda o "seguro renda", que objetiva reduzir a volatilidade da renda agrícola. A proposta tem três pilares: um trabalho de popularização dos mecanismos de bolsa para comercialização agrícola, subvenção à corretagem e linhas de crédito para operação no mercado futuro. O segundo é um programa de florestas plantadas, para atender a demanda das indústrias de papel, de carvão vegetal, de madeira serrada e de agroenergia. Na década de 20, este setor movimentará R$50 bi/ano, e será implantado em áreas marginais e degradadas.

 

Outro projeto cria um fundo para apoiar ações de redução de emissões, que custearia o pagamento de serviços ambientais, a prospecção e aproveitamento da biodiversidade, a conversão para agricultura orgânica, a certificação de produtos agrícolas e a Pesquisa Agropecuária. Outra proposta cria o Selo Verde, conferido a agricultores que incrementem, continuamente, sua produtividade, de forma sustentável. Os benefícios seriam adicionais de crédito, taxas de juros menores e maior subvenção do seguro agrícola. Uma das "jóias da coroa", da qual mais me orgulho, é a propositura da "Bolsa Extensionista", que contemplará, anualmente, 5.000 recém egressos de cursos ligados às Ciências Agrárias, que receberiam uma bolsa do Governo Federal, para prestarem serviço de assistência técnica junto a cooperativas, Ematers ou outros órgãos de assistência. Outra proposta aponta para a modernização da Defesa Agropecuária, para atender a expectativa de garantir a segurança dos alimentos, do ambiente produtivo e ser o passaporte dos produtos agrícolas no mercado internacional.

Fuel Trend Conference

Décio Luiz Gazzoni

Esta semana estou participando da World Refining Fuels Conference, um evento realizado anualmente, que prospecta as tendências de médio e longo prazo no setor de combustíveis. Até meados da década, este era um evento voltado exclusivamente para o setor de petróleo. A partir de 2005, os biocombustíveis ganharam peso, espaço e atenção cada vez maior do público. Não apenas porque é uma grande promessa de futuro, mas porque se trata de um setor dinâmico. Enquanto a cadeia de petróleo está madura e consolidada, sem novidades tecnológicas à vista, os biocombustíveis representam um cluster embrionário, cuja maior característica é justamente sua dinâmica e as perspectivas de evolução futura. Há dois anos, quando participei pela primeira vez do evento, demonstrei que o campo de petróleo de Tupi (o único mapeado no pré-sal), com seus 9 bilhões de barris, pode, tranquilamente, ser substituído por pouco mais de 2 milhões de hectares de cana. Vantagens do biocombustível: polui menos, emprega mais e, ao final de 20 anos, o poço de petróleo secou, mas a terra continuará produzindo por muitas décadas ou séculos. No ano passado, me foi anteposto o desafio de demonstrar o sofisma do conflito entre produção de alimentos e de energia. Acho que os números foram convincentes, porque não se tocou mais no assunto.  

Biodiesel

Para este ano me foi colocado o repto de apontar a melhor matéria prima para o biodiesel. Este é um terreno fértil para demonstrar a dinâmica dos biocombustíveis. O óleo de soja, que hoje domina o mercado, tem limites intransponíveis. Imaginando que possamos chegar a 10% de substituição do petrodiesel, até 2030, necessitaremos investir em culturas perenes, onde pontifica o dendê e aparecem como esperanças o pinhão manso e a macaúba, com as microalgas correndo por fora, com grandes chances. Porém, mirando pós 2020, entendo que o mercado de diesel será dominado por biocombustíveis derivados de cana. No início o etanol, que já está aí, no mercado, com tecnologias prontas para seu uso em motores diesel. Na sequencia, um conjunto denominado "diesel vegetal", que será obtido por fermentação dos açúcares da cana. Além de mais baratos que os óleos vegetais, terão a grande vantagem da redução de emissões. Sem dúvida, esta será uma vantagem competitiva quase imbatível, nos próximos anos. Estudos mostraram que, hoje, a cadeia do etanol reduz as emissões (comparativamente à gasolina), em 89%. Mas, na década de 20, reduzirá em 219%. Impossível? Me aguarde até a próxima quinta.

 

Poupança de emissões

Décio Luiz Gazzoni

Terminei a coluna da semana passada afirmando que estudos mostraram que, hoje, a cadeia do etanol reduz as emissões (comparativamente à gasolina), em 89%. Mas, na década de 20, reduzirá em 219%. A idéia foi deixar o leitor com a pulga atrás da orelha. Afinal, como é possível reduzir emissões acima de 100%? Se as emissões do etanol chegassem a zero, teríamos 100% de redução, certo? Verdadeiro, com um porém: as emissões evitadas. Com a produção de bioeletricidade, com os resíduos da cana, é possível diminuir a atual expansão acelerada de termoelétricas a gás e a petróleo. Logo, além de evitar as emissões da gasolina dos automóveis, também são evitadas as emissões das termoelétricas.   Vejamos os números – e são muitos. Atualmente, no ciclo completo de produção do etanol, são emitidos 8.135kg de CO2/1000 litros, ao passo que, através da fotossíntese, são absorvidos 7.875kg. Ou seja, as emissões líquidas são de 260kg de CO2, contra 2.280kg/1000 litros de gasolina. Em uma usina padrão, além da bioeletricidade usada na usina, ocorre uma exportação de 50MW para a rede interligada. Com o avanço da colheita mecânica, a palha, antes queimada na lavoura, passa a gerar mais bioeletricidade exportada. Cálculos rápidos mostram que, usando 50% da palha, gera-se 89MW excedentes e, usando 100% da palha, 112,1 MW excedentes/safra. Aliás, em 2020, a maior receita do setor sucro-alcooleiro virá do etanol, a segunda da bioeletricidade e o açúcar, que por 500 anos foi a receita única, será a terceira.   Além de produzir mais bioeletricidade, na próxima década serão implementadas novas tecnologias agronômicas (fixação simbiótica de nitrogênio, uso intensivo de adubação orgânica com resíduos da cana, ganhos em mecanização, etc.), tecnologias de transporte (uso de etanol, biodiesel e diesel vegetal nas frotas que transportam cana, açúcar e álcool), ganhos industriais (processamento e fermentação mais eficiente, turbinas geradoras de bioeletricidade mais eficientes), captura de CO2 para fins industriais (eliminando a queima do carvão para produzir gás de refrigerantes ou bicarbonato), produção de diesel vegetal (com melhor aproveitamento energético na transformação), entre outros avanços ainda não previstos. Com isto, a gasolina continuará emitindo 2.280 kg de CO2, porém o etanol emitirá menos de 200kg e a maior produção de bioeletricidade, associada a outras tecnologias, reduzirá, progressivamente, emissões em outros setores da economia, chegando à redução estimada de 219%, no final da década.

 

A safra agrícola

Décio Luiz Gazzoni

O IBGE liberou, no final de agosto, a sexta estimativa da safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas para 2009, que devem ser os números definitivos. O levantamento indica produção de 133,3 milhões de toneladas, uma quebra de 8,7% em relação ao ano anterior, cuja safra de grãos ultrapassou 146 milhões de toneladas. A aérea cultivada na última safra foi de 47,2 milhões de hectares. Quando comparada a 2008, verifica-se uma redução de 83.946 hectares. No caso da cultura do milho, o decréscimo na área, que superou a 4%, foi em grande parte devido ao desestímulo de preços, fortemente influenciado pelo estoque de passagem do final de 2008. Este estoque foi quase 120% superior ao do final de 2007, conforme resultados divulgados pela pesquisa de estoques. Em conseqüência, havia baixos preços praticados na época do plantio, o que afastou os agricultores da cultura do milho. As três principais culturas de grãos do Brasil (soja, milho e arroz), que respondem por 81,5% da área plantada, apresentaram, em relação ao ano anterior, uma variação de +2,1%, -4,3% e +1,4%, respectivamente. No tocante à colheita, apenas o arroz registrou variação positiva de 4,3%. Já para a soja e o milho a previsão é de retração da produção em 5,1% e 15,7%, respectivamente.  

Detalhes

A produção de cereais, leguminosas e oleaginosas em 2009, teve a seguinte distribuição geográfica: Sul, 53,2 milhões de toneladas (-13,3%); Centro-Oeste, 47,4 milhões de toneladas (-6,7%); Sudeste, 16,9 milhões de toneladas (-3,9%); Nordeste, 12,1 milhões de toneladas (-2,8%) e Norte, 3,7 milhões de toneladas (-1,7%). O Mato Grosso consolida-se como maior produtor nacional de grãos, superando em 1,5 % Paraná. As produtividades obtidas nesta safra estão entre as mais baixas da década, revertendo uma tendência de ganhos de produtividade. Atribui-se o fato ao clima inadequado e ao alto custo dos fertilizantes, que desincentivou o seu uso. O único crescimento palpável de produtividade ocorreu na 3ª. safra de feijão (+4%), o que é irrisório do ponto de vista da contribuição para a produção global do país. A maior redução ocorreu no milho safrinha, com perda de 7%. Esta redução foi parcialmente compensada por um aumento de produtividade de 1,2% na safra normal, no entanto insuficiente para evitar que a produtividade global de milho sofresse uma queda de 1,6%. A produtividade de soja manteve-se estável, levemente superior a 2,6 t/ha. Esperemos que, para 2010, São Pedro e o mercado joguem a favor do agricultor.

Rompendo os limites

Décio Luiz Gazzoni

Ao longo da História, a Natureza, em seu processo evolutivo, elevou a produtividade das plantas. A partir do século XIX, com a descoberta das leis da genética, os cientistas aceleraram o processo natural. Entretanto, os ganhos de produtividade foram devidos à incorporação ou à otimização da combinação de genes de produtividade, deixando intocada a sua base fisiológica. Ou seja, a eficiência fotossintética das plantas é praticamente a mesma, ao longo dos últimos séculos. Dependendo da sua rota metabólica, as plantas conseguem transformar em alimento apenas 1% a 1,5% da radiação solar que interceptam. Plantas com a rota C4, mais eficientes, apresentam os valores mais elevados.  

Um pequeno ganho, passando os limites para 1,5 a 2%, significariam elevar em um terço a produtividade agrícola, poupando mais de 100 milhões de hectares, que seriam demandados nos próximos anos. O maior desafio é incorporar alta produtividade às plantas, através da compreensão em detalhe dos processos metabólicos da fotossíntese. Isto significa utilizar engenharia de precisão, em que várias enzimas destas rotas metabólicas são modificadas geneticamente para que sua eficiência seja ampliada. Uma destas enzimas é a rubisco, principal enzima do ciclo de Calvin, que se compõe de reações bioquímicas que fixam o carbono atmosférico. Descobrir quais modificações genéticas devem ser feitas e qual a melhor combinação entre diferentes possibilidades de enzimas GM é a chave para o avanço.

  Apesar da complexidade dos processos biológicos, percebe-se um crescimento constante dos grupos de pesquisa envolvidos com o tema. O Instituto Internacional de Pesquisa de Arroz (IRRI – Filipinas), esforça-se para produzir um arroz C4. Nos próximos 3 anos investirá US$ 1,5 milhão para demonstrar a viabilidade de aumentar a produtividade em 50% e reduzir a demanda de água na mesma proporção. E não é apenas a academia que investe: A Monsanto e a BASF firmaram em 2006 um acordo de €1,2 bilhão para o desenvolvimento, até 2011, de plantas geneticamente modificadas, tolerantes a estresses abióticos. Os resultados desta parceria já são evidentes. Plantas de arroz GM com produtividades 30% a 50% superiores estão sendo testadas no Brasil com autorização da CTNBio. Além dela, outras empresas que investem em melhoramento genético despertam para esta nova realidade, que beneficiará não apenas o produtor, mas a sociedade como um todo, em especial os mais pobres, que mais necessitam de alimentos a baixo custo.

 

Abelhas x câncer

Décio Luiz Gazzoni

Há dois anos escrevi uma coluna sobre uma cerveja que contém substâncias anticancerígenas. Agora, matando a saudade dos meus tempos de entomologista, vejo aqui na Europa que picadura de abelha pode curar câncer. A história é um pouco mais complexa, mas começou com a descoberta de uma toxina injetada por picada de abelha – a melitina. A melitina é um peptídeo, que possui uma atração fatal por membranas celulares. Fatal para as células pois, ao ligar-se com as membranas, mata a célula atingida. Em concentrações altas, a melitina destrói tanto células isoladas (microrganismos), como as que compõem tecidos, o que suscitou a idéia de usá-la contra células neoplásicas. A inovação consiste em um método que usa a melitina para matar exclusivamente células cancerosas.   Para isto, foi usada a nanotecnologia: os cientistas encapsularam a melitina em nanopartículas, que podem navegar pelo organismo, razão pela qual foram apelidadas de nanoabelhas. A idéia é que as nanoabelhas circulem pelo sangue e, ao encontrar uma célula cancerosa, "piquem" a mesma, introduzindo a melitina. Esta provoca "furos" na membrana, no ponto de sua ligação, matando a célula. Se a melitina fosse injetada no sangue, sem nanoencapsulamento, os glóbulos vermelhos e outras células sadias seriam destruídas. Assim, além da melitina, os cientistas adicionaram uma substância química atraída pelos vasos sanguíneos em crescimento em volta dos tumores. Desta forma, as nanoabelhas foram guiadas para células de lesões pré-cancerosas, que estavam aumentando rapidamente seu fornecimento de sangue.   Os primeiros testes foram efetuados em ratos com tumores malignos. Resultado: a melitina eliminou as células cancerosas - sem afetar as sadias - fazendo com que os tumores regredissem ou parassem de crescer. Nos testes, foram usados ratos com dois tipos de tumores cancerosos, um derivado de câncer de mama humano e outro de melanoma. Foram efetuadas cinco injeções das nanopartículas com melitina. Os tumores de câncer de mama diminuíram 25% e os de melanoma diminuíram 88%, comparados aos tumores de ratos sem tratamento. A explicação para a seletividade se deve à maior vascularização dos tumores, por vezes com vazamentos de fluídos, o que atrai e retém a melitina. Outra boa notícia: os tumores malignos podem se adaptar e desenvolver resistência a muitos anticancerígenos, que têm como alvo o DNA das células, mas é difícil para as células encontrar uma forma de driblar o mecanismo que a melitina usa para matá-las.

 

E a vaca foi... sequenciada

Décio Luiz Gazzoni

Mais de 300 cientistas internacionais, liderados pelo Centro de Sequenciamento do Genoma Humano do Baylor College of Medicine e pelo USDA, sequenciaram o genoma de Bos taurus, o gado bovino europeu. O Brasil participou do estudo com pesquisadores da Embrapa, da UNESP e da USP. O artigo foi publicado na revista Science, que também traz um mapeamento da diversidade genética encontrada entre 20 raças distintas, conduzido por outro grupo de pesquisa. As informações obtidas com estes estudos impulsionarão as pesquisas voltadas para o aumento da qualidade da carne e do leite dos bovinos. Será possível efetuar a seleção de animais produtores, com uso de marcadores genéticos que permitirão avaliar, a partir de um exame nos primeiros meses de vida do animal, características como ganho de peso, produção de leite, maciez da carne e resistência a doenças.   Além de facilitar o melhoramento genético, esta metodologia abrevia o tempo e reduz o custo do trabalho de seleção dos melhores reprodutores. Com as informações e a metodologia atual são necessários, no mínimo, quatro anos para conclusão e demandam gastos para sustento de todos os animais e de suas crias. Os dados revelados pelo sequenciamento permitem constatar o impacto da seleção de animais. As informações concluem que rearranjos no DNA estão relacionados aos genes envolvidos nos processos de imunidade, lactação, metabolismo e digestão. Essas mudanças poderiam ajudar a explicar a capacidade dos bovinos em converter, de forma eficiente, alimento de baixa qualidade como o capim, em produtos de energia densa como carne e leite.   O sequenciamento foi iniciado há seis anos, aproveitando a infraestrutura implantada para o projeto Genoma Humano. O genoma bovino é constituído por, no mínimo, 22 mil genes. As informações foram obtidas a partir do sequenciamento de uma fêmea taurina, da raça Hereford, chamada L1 Dominette. Os resultados mostraram que, comparativamente aos genomas de outros mamíferos - como o rato e o camundongo - o genoma bovino é o que mais se assemelha ao humano. Os estudos sugerem que os bovinos e outros ruminantes divergiram de um ancestral comum ao dos seres humanos, há cerca de 95 milhões de anos. Bovinos e humanos continuam a compartilhar um elevado grau de conservação na organização das arquiteturas dos cromossomos. Essa proximidade pode auxiliar em pesquisas de doenças humanas, com desenvolvimento de modelos em bovinos, mostrando a amplitude dos benefícios sociais da biotecnologia.

 

Assentamentos e renda

Décio Luiz Gazzoni

Sempre afirmei que a parte mais fácil, simples e barata da reforma agrária é doar um lote de terra a alguém. Difícil é garantir que o assentado extraia, deste lote, renda digna para si e para a sua família, de forma sustentável, melhorando continuamente de vida. Agora o Ibope coloca números neste meu sentimento. Segundo pesquisa do Instituto, 37% dos assentados têm renda familiar de um salário mínimo (SM); 35% têm renda de 1 a 2 SM; e só 26% recebem mais de 2 SM. Em média, cada família assentada tem 4,3 membros, ou seja, dois terços dos assentados vivem em situação de extrema pobreza (de 0,25 a 0,5 SM por pessoa). Logo, a posse da terra não gera, automaticamente, renda. Para tanto são necessários investimentos na organização do produtor, em tecnologia, assistência técnica, crédito, logística, infra-estrutura e apoio à comercialização para gerar renda para o agricultor. Isto tudo se o assentado tem vocação agrícola, o que, muitas vezes, não é o caso. Dos assentados, 75% não têm acesso ao crédito rural do governo (falta documentação da propriedade ou comprovação da produção como garantia para financiamento, ou o assentado está inadimplente).  

Mais problemas

A pesquisa mostra que só 39% dos assentados são os primeiros beneficiários da reforma agrária e 46% compraram a terra de outra pessoa, apontando para venda irregular de lotes – por lei a terra só pode ser vendida depois de 10 anos e se for um assentamento consolidado, ou seja, com toda a infraestrutura necessária já implantada. A média das áreas dos assentados é de 29 hectares, 53% têm entre 5 e 20 ha e 15% têm das mais de 50 ha. A área destinada à produção é, em média, de 18,3 hectares. Importante: 63% dos assentados produzem no lote, mas 37% não produzem nada na sua propriedade! Dos que plantam, 28% produzem o suficiente para a família e o restante da produção é comercializada; 25% produzem o mínimo para alimentar a família e 11% não conseguem sequer alimentar a família! De acordo com a pesquisa, 21% são analfabetos (a média brasileira é de 9%). A maioria dos assentados (47%) tem até a 4º série do ensino fundamental e 12% têm o ensino médio ou superior. E, suprema vergonha, o trabalho infantil atinge 19% das crianças, sendo que, nos assentamentos do Pará,esse índice chega a 30%! Isto tudo em pleno século XXI. Em vez de destruir propriedades agrícolas, melhor não fariam  o MST e similares se exigissem uma mudança radical na reforma agrária, tirando o foco da mera distribuição de terra, que gera a perenização da miséria?

 

Um olhar para o futuro

Décio Luiz Gazzoni

Na semana passada fomos convidados para abordar o tema "Um cenário para a agricultura mundial", para o Conselho de Administração da Jacto. A empresa surgiu há 60 anos, em Pompéia (SP), obra de um imigrante japonês, Shunji Nishimura. Inicialmente dedicada a pulverizadores costais, hoje fabrica não apenas pulverizadores de larga escala, como colhedoras de café e de laranja, parte para novos ramos, fora da área agrícola, e possui parques fabris no exterior. Ciente de que a empresa chegou ao ponto em que cresce ou desaparece (absorvida ou destruída por concorrentes), o Conselho de Administração recomendou criar um departamento de planejamento estratégico, para antecipar as oportunidades e ameaças futuras, no bojo do agronegócio mundial. Esta foi a motivação do convite para nossa preleção. Foi uma excelente oportunidade para exercitar uma visão de curto (10 anos), médio (30 anos) e longo prazos (50 anos) do agronegócio mundial.   Baseamos nossa análise em projeções considerando o decálogo: 1)crescimento da população mundial; 2)esperança de vida; 3)crescimento econômico; 4)taxa de inflação; 5)renda per cápita; 6)políticas de inclusão social; 7)mudanças climáticas globais; 8)políticas de apoio à energia renovável; 9)adesão voluntária ao uso de energia renovável; 10)mudanças de hábitos alimentares. Os próximos anos serão de grande crescimento econômico e aumento da renda per cápita. Apesar da desaceleração do crescimento populacional, aumenta a esperança de vida e cresce a inserção social, conjugada com mudanças de hábitos alimentares. Cresce também a demanda por biocombustíveis e bioeletricidade. Assim, aumenta a demanda de todos os produtos agrícolas: grãos, carnes, madeira, fibras, flores, biocombustíveis e insumo para a indústria química. Neste cenário de aumento de demanda, importa muito saber quem poderá atendê-la, de forma sustentável. É onde se destaca o Brasil, o grande protagonista do agronegócio do sec XXI. Cumpre a nós realizar esta vocação – e é justamente o que a Jacto se propõe, como uma das empresas líderes do setor privado do agronegócio.  

Adeus

Foi a última vez que vi Dario Hiromoto, Engo. Agro., membro do Conselho de Administração da Jacto e Superintendente da Fundação Mato Grosso. Dario faleceu dia 23, vítima de afogamento enquanto pescava no Mato Grosso. Morreu fazendo uma das duas coisas que mais gostava: a outra era lidar com o agronegócio. Perdi um amigo e um colega que tinha um futuro espetacular por realizar. Que Deus o tenha.

 

 

Petróleo ou energia limpa?

Décio Luiz Gazzoni

De 20 a 23 de outubro passado realizou-se, em Gramado (RS), o XXVI Congresso Brasileiro de Agronomia. Na palestra que apresentamos, nos foi colocado o desafio de contrapor o uso de petróleo e energia renovável (biocombustíveis e bioeletricidade). Foi uma excelente oportunidade para analisar as vantagens e desvantagens de extrair petróleo do pré-sal ou produzir a mesma quantidade de energia de biomassa. Desenvolvemos um modelo matemático que assumiu como premissas que existem 90 bilhões de barris de petróleo no pré-sal (estimativa mais otimista) e que, em 2020 seriam extraídos 2 milhões de barris/dia, incrementados em 3% ao ano (estimativa do aumento anual da demanda de energia no Brasil). Para a biomassa, consideramos lavouras de cana ou dendê e cana (50:50), produzindo biocombustíveis (sucedâneos de gasolina e diesel) e bioeletricidade, na mesma quantidade obtida com o petróleo.

  Produzir energia limpa, de biomassa, é um grande negócio, por qualquer ângulo que se examine. Em primeiro lugar, as reservas de petróleo durariam 51 anos, até secar o poço. Já, no solo onde se produz biomassa, continuaríamos a praticar agricultura por séculos e séculos. Do ângulo econômico, tanto o valor obtido quanto a arrecadação de impostos, com uma ou outra fonte, são similares. Já do ponto de vista negocial, estaríamos em linha com o que a sociedade mundial persegue, que é energia limpa, com menor impacto ambiental. Este é um dos aspectos favoráveis da agroenergia: durante os 50 anos, evitaríamos a emissão de 43 bilhões de toneladas de gás carbônico. É exatamente o que a Humanidade busca! Imagine o leitor quanto vale esta economia de gases de efeito estufa, nas rodadas internacionais de negociação sobre o clima.  

 Sob o prisma social, teríamos inúmeras vantagens: a) geraríamos 152 vezes mais empregos com agroenergia que na cadeia do petróleo; b)a riqueza gerada não estaria concentrada na mão de uma ou duas empresas, porém de centenas de milhares de agricultores, micro, pequenas e médias empresas e trabalhadores autônomos, espalhados por todo o Brasil; c) diminuiríamos a poluição dos centros urbanos, com menos dano à saúde de quem respira o ar emporcalhado com a queima de gasolina ou diesel; d) aumentaríamos a esperança de vida dos cidadãos que vivem nos centros urbanos, hoje altamente poluídos. Entendo que a sociedade brasileira deveria refletir, com muita seriedade, se deseja extrair energia suja do pré-sal ou energia limpa dos campos. Eu não tenho dúvida do melhor caminho a seguir!

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